De manhã, ao espreitar os mails ou as mensagens, nem sei, vi anúncios relacionados com a black friday. Não tinha percebido que era esta sexta-feira. Pensei, então, que poderíamos aproveitar para fazermos já algumas compras de Natal e aproveitávamos e almoçávamos no centro comercial.
A receptividade do meu marido foi nula. Fomos fazer a nossa caminhada com o nosso fofo dog e nem falei mais nisso.
Uma pessoa, depois de ter andado décadas no stress do trânsito, das reuniões, dos almoços a correr e das compras feitas nos poucos espaços livres, quando se apanha à larga, já não consegue pensar em ir meter-se em confusões.
Ir para o meio da cidade, ir para centros comerciais, andar em lugares em que não se consegue estacionar à primeira, parece-nos pesadelo do qual fugimos a sete pés. Mas, por outro lado, em algum momento teremos que fazer compras. E precisava de ir ao supermercado...
Quando estávamos a chegar a casa da caminhada, o meu marido, com ar decepcionado e quase resignado, disse: 'Mas não é para andares a correr todas as lojas, não estou para lá passar a tarde.'
Consolei-o: 'Nem pensar. Almoçamos e depois é rápido.'
O meu marido ainda receou que estivesse muita gente por ser black friday. Descansei-o: 'É dia de semana. Durante o dia deve haver pouca gente às compras.'
Pois, pois... Dramático.
Para começar, voltas e voltas para arranjar lugar para o carro. Por pouco, eu própria não sugeri que nos fossemos embora.
Por fim, depois de termos conseguido descobrir um lugar apertadíssimo, lá fomos.
Começámos por ir para o restaurante. O almoço foi bom.
Mas a seguir foi para esquecer. Gente, gente, gente.
Várias coisas que comprei não tiveram nada a ver com a black friday. Às tantas nem me lembrava disso. Quando me viu com umas blusas para os miúdos na mão, o meu marido alertou: 'Reparaste que isso está sem desconto? Não é por nada, mas não quiseste vir para aproveitar os descontos?'. Nem tinha dado por isso. Ambientes com milhares de coisas e muita gente deixam-me à beira da exaustão, sem oxigénio no cérebro. Vieram aquelas blusas na mesma, já não conseguia ir outra vez à procura de blusas bonitas e com os tamanhos certos.
Na loja seguinte, a mesma coisa. O que eu gostava, estava sem descontos. Mas, mesmo assim, dar com os tamanhos certos foi uma chatice. Depois, os miúdos estão a crescer, preciso de ver as coisas desembaladas para ver o tamanho. O meu marido já a ficar desesperado, volta e meia a vir ao pé de mim dizer que não tinha paciência. E eu, a vê-lo a andar por ali às voltas, impaciente, ainda mais desorientada fico.
Na livraria, uma barafunda de livros, de tretas, de descontos, e muita gente. Queria encontrar qualquer coisa e não descobria nada. Primeiro que encontrasse algum livreiro para me ajudar foi um castigo. Depois não era uma livreira, era uma funcionária que pouco sabia de livros. Andava também às aranhas por ali, de escaparate em escaparate, à procura. De vez em quando, aparecia o meu marido a perguntar porque é que eu não me despachava. Com isto tudo parece que figo cegueta, não assimilo o que vejo. Para além de que fico sem capacidade para procurar, folhear, discernir. Obtusa até à quinta casa, é assim que me sinto.
No supermercado, outro desatino. Queria encontrar brinquedos e não via nada do que queria nem encontrava nenhum empregado que me ajudasse. E, por fim, perdi várias vezes o meu marido. Na caixa, daquelas self service, outro desatino. A cada dois ou três artigos, aparecia a mensagem para chamar um empregado e não havia nenhum empregado disponível. O meu marido fumegava e eu já só queria que ele não resolvesse desistir, deixando ali tudo, a couve, as bananas, o pão, o entrecosto.
No meio disto, gastei um dinheirão, não percebi que tivesse usufruído nem um cêntimo da porcaria da black friday.
Quando chegámos a casa já era de noite. O cão, coitadinho, estava encolhido, creio que pensou que o tínhamos abandonado.
Falta-me ainda comprar mil coisas mas não sei quando estaremos recuperados desta tareia para uma segunda investida. O meu marido diz que para a próxima não vai, que vá eu sozinha, que não tem paciência para estar horas à minha espera. Diz isto, apesar de saber que eu é que estou à espera (de empregados, da minha vez, de pagar). Por um lado, sozinha, liberta-me do stress de vê-lo a andar às voltas, num desespero. Mas, por outro, depois não tenho ajuda com os sacos.
Em suma: detesto cada vez mais fazer compras. E a black friday é para quem gosta de barafundas. Não é para mim.