Despachámo-nos não tão cedo quanto tínhamos previsto. Eu já me sentia desidratada. Quando cheguei ao carro fartei-me de beber água.
Viemos buscar o cão a casa.
Coitado. Quando vamos a qualquer lado e ele não pode ir, nem precisamos de dizer nada. Percebe logo que vai ficar sozinho. Deita-se, muito infeliz, o ar mais desconsolado que se pode imaginar. Nós dizemos: 'Os donos vêm já. O cãozinho [em vez de cãozinho dizemos o nome dele e, se for eu a dizer, digo no diminutivo] fica a tomar conta da casa.'. Finge que não ouve.
E, quando chegamos, custa a aparecer. Chamo, chamo, digo palavrinhas fofas: 'Está aí um cãochino...? Onde está o meu cãochino mais fofo...?'. E ele nada.
Por fim aparece, encolhido, quase rente ao chão, como se viesse a medo, como se tivesse estado de castigo e ainda não estivesse certo de que a punição já tenha sido levantada.
Tenho que ir ao pé dele, fazer-lhe festas, falar em tom de festa: 'Mais lindo! Tomou muito bem conta da casa! Muito bem. Vamos ter com o dono? Dono! Dono!'.
Nessa altura ele percebe que não há crise e arrebita e, mal eu começo a chamar o dono, já ele vai aos saltos ter com o dono, todo contente. Depois volta atrás e vem também dar saltos à minha volta.
E, portanto, viemos buscá-lo. A seguir, cansados, fomos os três passear para a praia. Uma ventania e um ar fresco que só visto. Mas antes isso do que uma caloraça. O cãochino mais fofo todo contente, a dar ao rabo, feliz da vida.
Comprámos sushi, claro. Quando uma pessoa está cansada não há nada mais apropriado do que comer um belo prato de salada e umas fresquíssimas e belas peças de sushi.
Mas, claro, a seguir, ao poisar aqui no sofá, aterrei.
Quando acordei estavam a comentar a estupidez do Trump que até disse, num daqueles seus comícios surreais, que é mais bonito que a Kamala.
Os narcisistas são assim: têm que estar no centro de tudo e todos os elogios têm que ser para eles. Portanto, tendo ouvido comentar que a Kamala é bem parecida, o broncalhão diz que é mais bem parecido do que ela.
'I am a better looking person than Kamala,' quips Donald Trump at Pennsylvania campaign rally
Acho que tem que haver workshops para as pessoas normais aprenderem a lidar com narcisistas, desmontá-los em público, tirar-lhes a autoconfiança que lhes permite dizer e fazer tudo certos de que não vai passar-se nada.
Agora, enquanto escrevo, resolvi fazer zapping. E vim parar a um programa fantástico na Sic Radical, o Naked Attaction, em italiano. A apresentadora é parecidíssima com uma amiga minha. Incrível.
E o mais extraordinário é que levantaram um bocado a divisória que tapa uns cinco ou seis homens nus. Claro que olhei logo para os respectivos genitais. Para onde é que havia de olhar? Um deles impressionou-me grandemente. De outro também não desgostei. Pois quando a apresentadora perguntou à rapariga, a participante que os vai escolher, o que mais tinha chamado a sua atenção, vai ela e fala-lhe nos pés de dois deles, nas coxas de outro, se estão ou não depilados, na tatuagem de outro. Fiquei parva. Então quando notoriamente a única coisa que há ali a despertar a atenção é o formato, a dimensão, a cor e, no conjunto, a personalidade do pénis e dos testículos dos homens, há alguém que se põe a falar de tudo o que não interessa...? Fiquei sem perceber se a dita participante é sonsa ou se não bate bem da bola.
Haviam de pôr o Trump num programa destes, nu no meio deles. Deve ter uma pilinha mini-mini-minúscula, absurda, sem ponta por onde se pegue. E haviam de pôr uma concorrente desbocada, que desatasse a rir, que dissesse que nunca tinha visto uma pila tão incompetente, tão penosa de ver, tão dispensável, tão caricata. E antes de correr com ele havia de se pôr a olhar, a gozar, a dizer que, em comparação com os outros, nem se percebia como ali tinha sido admitido. A ver se o narcisista psicopata não se sentiria posto em causa e sem vontade de voltar a aparecer em público....
Mas agora que o programa avançou, vejo que a concorrente deixou para o fim dois nus que eu teria eliminado às primeiras.
Portanto, capaz de a prova da comparação de pilas não ser boa para pôr o Trump a nu. É que há gente para tudo. Isto prova porque é que tanta gente que apoia o Trump. O que para uns é uma porcaria para outros é uma virtude.
Muito loura, uns olhos muito azuis que a maquilhagem tornava maiores e que pouco piscavam, uma voz estranhamente grave (aliás, forjadamente grave), uma toilette a la Steve Jobs (quase sempre de gola alta preta), um sorriso charmoso, uma conversa convincente (para quem queria deixar-se convencer), uma audácia mascarada de assertividade, uma opacidade mascarada de transparência, um à-vontade perante potenciais investidores e representantes do poder político, um descaramentos que não desarmava -- tudo ingredientes que fizeram de Elizabeth Holmes um caso sério no mundo dos negócios emergentes e muito promissores.
Em especial os homens mais velhos babavam-se perante a jovem e formosa fundadora e gestora daquela fantástica empresa que se anunciava como the next big thing. Era uma nova Apple que estava a nascer. Uma tecnologia inovadora que revolucionava o mundo das análises de sangue e que renderia milhões e milhões.
E, perante a inexistência de evidências, apenas levados pela lábia da juvenil e sorridente loura de olhos de boneca e voz grossa, os investidores abriram os cordões à bolsa e o dinheiro começou a entrar. Num instante. a Theranos valia brutalidades. Ninguém queria ficar para trás.
Na minha vida profissional já testemunhei um caso idêntico embora, obviamente a uma mais modesta escala: uma mão cheia de nada a ser apresentada como um tiro certeiro num mercado em brutal expansão. Quem mantivesse a cabeça a funcionar facilmente percebia que só um maluco investiria um cêntimo numa coisa que até podia ser mas que, de facto, não era nada. Quando a máquina da mentira é posta em marcha dificilmente pára.
Só pára se alguém, totalmente descomprometido com o projecto, à bruta e de forma pública e irrefutável, a parar. Caso contrário, os enganados não querem aparecer como uns patos e vão ficar calados, os que apadrinharam não vão querer parecer uns otários e ficam caladinhos, os que lá trabalham não querem perder o emprego e nem um pio, os mais próximos não querem dar uma facada nas costas e fazem de conta que não sabem de nada. Todos, de uma maneira ou de outra, se tornam coniventes, todos encobrem o inexistente unicórnio.
No caso de Elizabeth Holmes o caso é mais grave pois não apenas enganou os investidores como se esteve nas tintas para a saúde das pessoas cujo sangue era analisado naquelas máquinas da treta que vendia como se fossem revolucionárias e fiáveis. Resultados errados que levavam a medicação inadequada podendo pôr a vida dos doentes em risco enquanto o sucesso da empresa era incensado e recompensado -- dois mundos antagónicos que existiam sob gestão da sua CEO que continuava a apresentar-se em conferências, entrevistas e encontros com altas figuras da política e do mundo dos negócios. Sempre segura, combativa e sorridente.
Agora, cerca de três anos depois de ter sido publicamente desmascarada, apresenta-se a julgamento menos maquilhada, já sem a farda a la Steve Jobs, toda ela num estudado low profile, responsavelmente grávida -- e sorridente como se não fosse nada com ela. Já não se mostra como a grande empreendedora mas como a inocente que os outros querem derrubar e que está ali disponível para contar como foi manipulada, enganada.
Como qualquer psicopata, não assume a responsabilidade pela gravidade dos seus actos. É capaz de invocar desculpas, fazer-se de vítima e, de olhar tranquilo e ingénuo, continuar a apresentar-se como bem intencionada.
Descrita por quem sabe como uma narcisista, tudo nela evidencia os traços psicológicos de gente assim. Em maior ou menor grau os narcisistas têm sempre qualquer coisa de psicopata, de sociopata, de tóxico, de perigoso. No caso de Elizabeth Holmes estar-se-á perante um expoente máximo mas não nos enganemos: de gente assim a única coisa a fazer é guardar distância pois desde que começam numa de ser cativantes até à fase em que se fazem de vítimas, nunca assumem responsabilidade pelo mal que espalham à sua volta. Esvaziam animicamente os que os rodeiam e que, tantas vezes, ingenuamente tentam ajudá-los.
O vídeo abaixo mostra bem toda esta história. Poderia ser ficção: a ascensão e queda de uma extraordinária lunática. Mas não é ficção: é verdade. A lunática, Elizabeth Holmes, é bem real.
Elizabeth Holmes exposed: the $9 billion medical ‘miracle’ that never existed
Elizabeth Holmes promised the world a medical revolution. At 19, she claimed to have invented a miniaturised machine that with a single drop of blood could map a person’s health quickly, reliably and cheaply. She boasted that her technology meant serious diseases like cancer would be prevented before they happened. And it was not only a “wow” moment for patients. High-profile investors rushed to pour a fortune into Holmes’ company, Theranos, and she became Silicon Valley’s first self-made female billionaire. But as Tara Brown reports, her invention was an invention – it simply didn’t work. Elizabeth Holmes is no visionary. She’s a cruel fraudster who has put people’s lives at risk, and because of that, now faces 20 years in jail.
Optimista que sou, sempre avessa a cair no desânimo, sem paciência para curtir fossas ou alimentar cadeias de maledicência e/ou moralismos, volta e meia parece que não posso deixar de cair na real e, até, quase na derrota: é quando não posso deixar de reconhecer que há um lado muito estúpido, muito incompreensível, muito tacanho, muito babaca, muito bronco no género humano. Ou, pelo menos, em parte do género humano. Não sei se é coisa genética, se é cultural, se é o raio que a parta. Mas que há gentinha que parece que não evoluiu, ou melhor, que dá ideia que melhor fora se não tivesse evoluído, que mais valia que continuassem a saltar de galho em galho e a catarem-se uns aos outros, lá isso há.
Dir-se-ia que ninguém de bom senso -- e nem falo já em inteligência, falo apenas em senso comum -- votaria num narcisista. Aliás, mesmo que não fosse no campo da política, dir-se-ia que ninguém de bom senso haveria de querer um narcisista por perto. Um narcisista é, por natureza, alguém tóxico que se alimenta de relações que, sendo na aparência relações fofinhas, são, na realidade um exercício de anulação do outro, um exercício de subtil e persistente manipulação emocional, levando os outros a quererem protegê-lo do mundo dos maus, a quererem que ele se mantenha por perto para que, sentindo-se acompanhado, não amue ou não se torne agressivo. Ora se isto é assim com todos os narcisistas, imagine-se um narcisista exacerbado e poderoso. Aí o perigo não é apenas para os pobres coitados que lhe são próximos e que incautamente se deixaram enredar, aí é bem pior, aí é um perigo para um país e, sendo o país os Estados Unidos, um perigo para o mundo.
Acresce que, no caso vertente, o psicopata não apenas manipula, amedronta e seduz os broncos e os mais frágeis (seja economicamente, seja sociologicamente, seja -- o que é mais frequente -- emocionalmente débeis) como é ele próprio um bronco. Mas, egocêntrico, basófias e descarado como é, nem quer saber de ser bronco. Acha que está acima de tudo e de todos. É nojento.
Volto a dizer: não estou politicamente informada para poder jurar a pés juntos que a malta do Lincoln Project é toda republicana, um grupo de republicanos bem intencionados e envergonhados por terem eleito um republicano que é um traste que envergonha os trastes. Supostamente sim. Agora que fazem vídeos muito bem feitos isso parece-me irrefutável.
Estes dois aqui abaixo, bem recentes, mostram como é possível ser-se absolutamente explícito na mensagem política, um mostrando o narciso troglodita que está à frente dos destinos do país e que importa apear, outro mostrando um americano exemplar a explicar como é que, tendo Trump falhado em toda a linha e todos os dias, importa correr com ele.
Acho que a populistas, narcisistas ou estúpidos em geral devemos generosamente dedicar o nosso melhor desprezo. Não palco mas, pura e simplesmente, desprezo. Total desprezo. Ignorá-los. Mostrar-lhes que estão num patamar muito abaixo, que, apesar de se acharem os maiores, não passam da ralé. Melhor: da ralé da ralé. Contudo, esta minha reacção não é consensual. Vejo que há quem lhes veja virtudes, quem encontre razões para os desculpabilizar ou, mesmo não vendo virtudes, quem ache que deve dar-se uma hipótese ou que acredite que o mundo é que conspira contra eles não reconhecendo o seu valor e a sua verdade.
Como sou muito anciã, guardo memória do destino de muita gente deste género -- e o destino é, regra geral, o esgoto. Não há populista, narcisista ou estupor encartado que fique para a história por bons motivos. Geralmente nem sequer constam. O tempo encarrega-se de mostrar a sua irrelevância, apagando-os. E, se calha subsistir o seu rasto, é para dar nota do ranço com que empestaram aquilo em que tocaram.
Não percebo, pois, reportando-me agora à política, a razão do destaque que a comunicação social dá ao trauliteiro gabarolas do Chega tal como nunca percebi a atenção que, antes de ser eleito, foi dada ao Trump, esse demente alarve-mor.
Parece que é mesmo verdade aquela teoria de que para cada parvalhão existe sempre alguém ainda mais parvalhão que o apoia.
Portanto, é sempre com satisfação que vejo formas inteligentes de derrubar a cagança dos egocêntricos doentios.
O Lincoln Project tem divulgado, em cima do acontecimento, uns vídeos que me parecem bastante eficazes na mensagem, tendo, sobretudo, em vista o público a que se destinam: os republicanos boçais que ainda apoiam aquela alimária cor-de-laranja.
O tema melhor vem no fim. A queda de um mito com centenas de anos. A novidade das novidades. A explicação para muita coisa.
Mas, primeiro, com vossa licencinha, o do costume.
Receio que me achem uma maçadora, que achem que estar a incidir nesta coisa é uma seca -- ou seja, que não estejam nem aí para esta conversa.
Afinal o narcisista cor-de-laranja está longe daqui, do nosso pequeno rectângulo. Só que o mundo é mais do que o nosso próprio umbigo. O bater de asas de uma borboleta no alto de uma montanha no cu de judas pode desencadear uma tempestade numa qualquer terra do outro lado do mundo, um navio abandonado há anos no meio do mar pode matar centenas e ferir milhares e destruir uma cidade e um anormal ao comando de um país gigante, com a possibilidade de carregar num certo botão, pode fazer com que o mundo acabe indo pelos ares. Ninguém, em qualquer lugar do mundo, pode estar sossegado enquanto houver narcisistas em lugar de poder, em especial à frente dos destinos de coisas relevantes como, por exemplo, à frente de um país.
Pior ainda quando o animal está numa trajectória de esbodegamento progressivo. De dia para dia a gente vê-o mais embestalhado, mais esbongalhado. Não diz coisa com coisa, não consegue alinhavar raciocínio que faça sentido. As palavras saem-lhe esparvalhadas. Da boquinha (que mais parece o ânus de uma velhinha) saem-lhe babaquices, os olhinhos orlados de branco estremelicam, tudo nele já não faz sentido, já não passa de conversa de narcisista esbobalhado e fora de prazo.
Narcisista nunca acaba bem. Toda a vida a viver em função da atenção que querem dos outros, chegam a uma altura em que já ninguém tem saco para aturar babaca e eles, sem receberem flu-flus e gaitinhas como prova de atenção a toda a hora, caem na aflição, ficam com medo, ficam agressivos, inventam desculpa para tudo, fazem-se de vítimas, trazem conversinha de quando eram pequenos e carentes, procuram a peninha alheia, manipulam as emoções dos outros, tentam convencer que os outros são todos maus, tudo é fake new, tudo é gente má, chegam a dizer que ninguém gosta deles, kalimerizinhos da treta, pequenos bugs sem préstimo. É nessa fase que está o orange donald. Deteriorado, o cérebro reduzido a dois neurónios coxos, o animal demonstra todos os dias o paupérrimo estado a que já chegou -- e só os ceguinhos é que não vêem o perigo que uma besta destas é para os outros, seja lá, nos States, seja em qualquer parte do mundo
Já ninguém consegue sequer fingir que o leva a sério. Já ninguém consegue manter um mínimo de respeito. É exposto ao ridículo por onde passa. Uma coisa patética. Que ele não vai acabar bem é mais do que óbvio. Pior é se faz estrago antes que alguém o impeça de fazer mal a sério.
Esta entrevista é uma coisa do além. Ninguém consegue já ajudar esta alimária a cabar o mandato com dignidade, já ultrapassou essa linha, já está a caminho de acabar a fuçar as próprias fezes.
Trump's Mind-Numbing Interview with Axios
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Bem. Tirando isto nada mais tenho a acrescentar a não ser que, para meu espanto, no meio do há ou não há vacina e há ou não há pirataria informática para sacar a fórmula mágica, aparece o que menos se espera. Do nada, sabe-se que caíu mais um mito urbano. E se este era cabeludo. A gente pensa que sabe uma coisa e, de repente, vê abalar os nossos alicerces.
Julgava eu, eu e todo o mundo, que o espermatozóide, esse bichinho cabeçudo, se desloca nadando, a dar ao rabinho, serpenteando, serpenteando, uns ficando pelo caminho e outros às cabeçadas a ver se conseguem penetrar na arca do tesouro.
Pois, afinal, não. Não serpenteiam coisa nenhuma. Andam é feitos bichas malucas armadas em saca-rolhas, a dar guinadas quais baratas tontas. Claro está que, com tanta palhaçada, se um conseguir entrar já é sorte.
Está, pois, tudo explicado.
Os homens são o lado assimétrico, imperfeito e inconsequente do género humano. Não atinam mesmo. Até nisto.
Spinners, not swimmers: how sperm fooled scientists for 350 years
É certo que não voto lá e embora, em média, 19% dos meus Leitores acedam a este blog a partir dos States, sei que a minha influência política é nula. Mas tanto se me dá. As minhas entranhas revolvem-se sempre que uma cavalgadura está em posição de fazer mal aos outros, em especial quando o faz a indefesos, quando o faz a quem não lhe fez mal nenhum, quando o faz deixando profundas marcas. Já aconteceu com Passos Coelho e a sua desgraçada entourage que durante anos me tirou do sério por fazer burrices atrás de burrices, cavando ainda mais fundo o fosso da crise, já aconteceu com Cavaco, essa fétida e ressabiada criatura que, depois de ter passado o país a patacos quando foi primeiro-ministro, exerceu política de forma mesquinha e vingativa quando foi Presidente da República, já aconteceu com Carlos Costa, esse perfeito nulo que, impavidamente, deixou que o sistema financeiro abrisse brechas insanáveis e que um incompetente como Passos Coelho cavasse um buraco ainda mais fundo ao acabar com o BES em vez de o nacionalizar. Mas também já me aconteceu com Steve Bannon, essa cobra venenosa que espalha ranço por onde passa e que faz de tudo para acabar com a democracia, seja onde for. Tal como falava desse outro palhaço repuxado que dava pelo nome de Berlusconi ou, mais recentemente, desse populista descarado e e perigoso que dá pelo nome de Matteo Salvini. Quando a pele me fica com brotoeja perante uma qualquer besta quadrada ou quando farejo bicho traiçoeiro e perigoso, toda eu me eriço, rosno e só não mordo porque estou longe deles.
Posso, pois, ter a noção de que as minhas investidas são de eficácia nula mas, ainda assim, não me inibo. De facto, é mais forte que eu. É como quando tinha a minha boxer, essa meiga cãzinha que adoçou a nossa existência, e que, mal farejava gato ou cavalo, virava fera, toda ela se eriçava, se transfigurava, perdia a tramontana e só não os estraçalhava se não pudesse. Assim, eu. Se, ao vivo, estou perante alguma alimária do género, ainda que de efeitos mais inofensivos por actuar em escala mais reduzida, eu não consigo conter-me. Sei, no mais íntimo de mim, que de criaturas assim nunca vem nada de bom e que, portanto, delas só devemos querer uma coisa: distância. E, antes que façam mais mal, eu, de forma sobretudo involuntária, quase animal, reajo, tento afastá-los, tento que se afastem, tento evitar que façam pior. É que, ainda por cima, animais deste calibre aparecem geralmente como simpáticos, quiçá até inseguros, tadinhos, uns incompreendidos, uns injustiçados, quiçá até a precisarem de colo. E, portanto, há sempre quem caia na sua esparrela, quem os apoie, quem os defenda contra tudo e contra todos. Sempre assim foi. Não há animais destes que não tenham a sua corte, o seu club de fãs, os que votam neles, os que os seguem. Os mais pobres e indefesos em França tratam Marine le Pen como se ela fosse uma mãezinha protectora. Os mais cruéis ditadores tiveram amantes, devotos, fiéis seguidores. Uma lástima.
Depois de ontem aqui ter falado no Luto na América, hoje partilho outro vídeo, desta vez divulgado pela organização VoteVets e que também tem como móbil o conseguir que Trump leve uma corrida em osso. E eu vou acender uma velinha para que todos os que querem isso tenham sorte.
VoteVets.org is the only political advocacy organization headed by veterans of the wars in Iraq and Afghanistan, to benefit other veterans of those wars in their campaigns for public office. VoteVets.org also hold public officials accountable for the words they say and actions they take that adversely affect troops and veterans.
Por estranho que possa parecer, nas últimas eleições muitos americanos votaram em Trump. Pode dizer-se que muitas pessoas não se reviam em Hillary Clinton. Campanhas mediáticas perversas, muita instrumentalização ao serviço de russos e da ala mais maligna dos republicanos conseguiram abalar a sua credibilidade. Hillary foi arrasada, denegrida, ultrajada -- quase sempre injustamente. Mulheres assertivas são frequentemente vítimas de machistas, prepotentes, marialvas de pacotilha. Homens com pénis pequenino e testículos ainda menores temem mulheres corajosas e afirmativas. É dos livros e a história prova-o. Quem quis iludir-se, acreditou que Hillary tinha defeitos que não acabavam e que Trump iria voltar a fazer a América grande outra vez. Perante um palhaço cor de laranja com melena feita de barbas de milho, a olho nu um narcisista, insuportável e imprestável como todos os narcisistas são, tóxico como todos os narcisistas são, incompetente, ignorante e impreparado, muitos americanos preferiram ignorar o que já era evidente e elegeram-no.
Desde o primeiro dia e, certamente até ao último, Trump não tem feito outra coisa senão confirmar os piores prognósticos: cobarde, fraco, inseguro, irresponsável, influenciável, doentiamente vulnerável à opinião que sobre ele é formulada, Trump vive em função da sua própria imagem e do reflexo dela na opinião pública.
Poderá dizer-se: so what? é um narcisista e, em maior ou menor grau, não há narcisisita que não seja assim. Parecendo serem uma simpatia, aos poucos minam a confiança de quem os cerca, descartam-se de quem não os bajula, insultam e lançam suspeitas sobre aqueles que se afastam dele. É certo: todos são assim. Mas este não é um zé cueca qualquer que, quanto muito, suga a alma dos poucos que o aguentam: este é o Presidente dos Estados Unidos. Está à frente do destino de milhões de pessoas e tem poder para tomar decisões que influenciam todo o mundo. E esse é o grande perigo, um risco grande demais para poder ser assumido.
Trump tem que ser apeado. Não é só que a sua toxicidade já esteja a corroê-lo a ele próprio, nem é só que a sua irresponsabilidade esteja a matar americanos aos milhares nem é só que a sua psicopatia esteja a arruinar a economia americana. É isso tudo junto acrescido do perigo de que continue a fazê-lo e a fazê-lo de forma cada vez mais descontrolada.
Não conheço suficientemente o Lincoln Project para aqui, de caras, me atravessar por eles. Supostamente são republicanos que zelam pela democracia e que, neste momento, se polarizam em torno de um grande objectivo: apear Trump. Se é isso, cá estou para, na medida da minha insignificante influência, daqui os apoiar.
THE LINCOLN PROJECT
DEDICATED AMERICANS
PROTECTING DEMOCRACY
The Lincoln Project is holding accountable those who would violate their oaths to the Constitution and would put others before Americans.
A série de vídeos que têm visto a produzir e divulgar são de antologia e uma lição de comunicação em política. Neste caso, de comunicação negativa -- mas quantas vezes é necessário fazê-lo?
Seleccionei alguns para os quais encarecidamente peço a vossa atenção.
Luto na América
Votaremos
Nacionalista geográfico
Como tudo começou
Fauci
Vários outros vídeos existem e, se tudo correr de feição, muitos mais existirão. E acredito que ajudarão a conseguir aquilo a que se propõem - afastar Trump da Casa Branca. A bem dos americanos. E a bem dos humanos.
Numa das festas de aquários em que estes dias têm sido férteis, um dos presentes, pessoa de esquerda, anti-Trump convicto, dizia com ar pesaroso que tinha achado o gesto de Nancy Pelosi lamentável. Falava e abanava a cabeça, demonstrando quão profundamente aquele rasgar de discurso o tinha chocado. 'Não se faz', dizia ele.
Na sexta à noite, decidi ver o Governo Sombra enquanto aqui escrevia, por um lado por falta de melhor alternativa e, por outro, para confirmar a minha impressão de que não valia a pena. Convencida que ia espreitar durante um pouco e depois bye-bye, acabei por ir ficando, sobretudo pela surpresa da assertividade de Pedro Mexia contra a estupidez natural do João Miguel Tavares. E a dada altura vi a mesma expressão e a mesma censura nas palavras de Mexia, assumido homem de direita, que tinha visto dias antes numa pessoa que se situa no quadrante político oposto. Aliás, todos ali, no Governo Sombra, mostraram achar condenável aquele pausado rasgar de discurso.
Pois eu, lamento a dissonância, achei muito bem. Aliás acho que muita paciência anda toda a gente a ter com aquele biltre. E não vale a pena virem com lições de etiqueta, when they go low, we go high, e coisas do género. Querer agir com animais de baixa craveira como quando se age com gente respeitável é um erro. Trump merece ser desprezado publicamente, merece ser desrespeitado sem rebuço. Só sofrendo humilhações públicas ele abanará. Gente doentiamente narcisisista teme ser gozada, teme a chacota, teme ser objecto de acintoso desdém. Vêem-se a si próprios como os maiores e é essa a imagem que querem passar para os outros. Por isso, serem confrontados com a evidência de que são tratados como os basbaques e os palhaços que são mina-lhes os alicerces. Por isso, é justamente o que Nancy Pelosi fez que deve ser feito. Negar-lhe o aperto de mão, gozar na casa dele, mas gozar à cara podre, rasgar o discurso como lixo da pior espécie , à vista de toda a gente, virar-lhe as costas, não lhe prestar qualquer atenção enquanto fala -- é isso que o maior número de pessoas deve fazer, por todo o lado, a qualquer hora. E não será esperar muito tempo até que vejamos como se afogará na sua raiva, como mostrará aos tolos que ainda o apoiam o parvalhão que é.
O tema da violência doméstica perturba-me. Custa-me aceitar que uma pessoa que, como qualquer outra, tem direito a receber afecto, a receber atenção, a receber a retribuição do apoio que dá ao outro, se veja, afinal, sujeita a receber as migalhas que esse outro entenda por bem dedicar-lhe, sujeita a ter que fechar os olhos à frequente desatenção para que ele não se aborreça não vá a situação ainda piorar, sujeita a ter que disfarçar a ansiedade para que os outros não se apercebam e não se apiedem, sujeita a ter que ceder cada vez mais para poder receber alguma coisa em troca, sujeita a ter que fingir que é muito o pouco que recebe para não ter que aceitar a ideia de que está a ser vítima de uma relação falhada ou, pior, vítima de violência psicológica por parte, tantas vezes, de um narcisista.
Toda a gente tem direito à felicidade mas nem sempre ela vem quando se quer.
Muitas vezes parece anunciar-se de forma promissora, ao princípio parece mesmo que há reciprocidade, que há generosidade, que há genuíno afecto. E, na ânsia de querer que perdure e que seja verdadeiro esse sentimento, a pessoa força-se à cegueira. Constrói uma narrativa na qual é feliz, na qual é amada como num conto de fadas. E mesmo quando percebe que o conto não é de fadas e que aquilo não é amor, força-se a aguentar. A ceder. A esperar que aquilo que parecia promissor volte. Força-se a encontrar explicações que desculpem o desafecto, talvez problemas dele em criança, talvez problemas familiares. Como se isso desculpasse o comportamento, como se isso justificasse o desamor, como se isso fosse razão para aceitar ser vítima, para aceitar desperdiçar a sua própria vida.
Tal como aconteceu com Rosie Duffield, não estou a falar da violência evidente, da violência tradicional com agressões físicas, empurrões, hematomas disfarçados. Não. Falo de uma violência oculta, disfarçada, de uma violência que frequentemente se disfarça de carinho. Fraco e efémero disfarce.
Falo, sim, das pessoas que, tal como Rosie, sofrem em silêncio o desamor, a solidão, a angústia. Falo das que se envergonham temendo ser vistas como falhadas. Das que aceitam que o outro viva em sua casa quase impondo regras e comportamentos, como se a casa fosse também dele, e se esforçam por achar que isso é normal. Das que nada dizem a quem as trata com desafecto, das que teimam em não perceber que o que parece um gesto de atenção do outro é, afinal, quase sempre um disfarce para receber, ele próprio, atenção. Das que teimam em acreditar que é amor o que é apenas uma palavra oca. Das que tudo fazem para acreditar em juras como se não intuíssem que de nada valem. Das que se forçam a parecer felizes quando recebem telefonemas como se os telefonemas não fossem senão um pretexto para os narcisistas falarem deles próprios. Das que quase abdicam das suas relações, dos seus gostos, na tentativa de que, aderindo aos gostos do outro, possam receber dele algumas migalhas. Das que, frágeis, frágeis, temem ficar ainda mais sozinhas se a relação terminar e, por isso, acabam por nem perceber como é patético o seu apego a quem não as sabe amar, a quem não as merece.
Há algum tempo recebi um mail de uma Leitora que me contou o seu caso pessoal. Era também assim. Contou-me como depois de, durante anos, ter fechado os olhos aos sinais de alerta, depois de se recusar a ouvir os avisos de familiares e amigos, depois de se ter forçado a sentir-se enamorada e a viver um romance de amor que era mais imaginário do que real, percebeu que estava a ficar vazia, exausta, sem amor próprio, infeliz. Contou-me como conseguiu coragem para o expulsar da sua vida. Quando li o seu mail interroguei-me: porque aceitou ela aquilo? Não era óbvio que era uma relação que não era saudável? Porque persistiu? Perguntei-lhe. E ela explicou-me. Não conto aqui pois obviamente respeito escrupulosamente o sigilo perante situações expostas por quem tanto confia em mim. Mas percebi como foi difícil esse processo. Percebi e fiquei com muita pena porque é, na verdade, muito triste a situação de quem passa por uma situação assim. E é preciso coragem para sair dela.
E o conselho é sempre o mesmo: não esconder, falar, pedir ajuda, libertar-se, virar a página, recomeçar.
E esta é também a história que, de forma muito sentida, a deputada Rosie Duffield, deputada trabalhista, contou esta quarta-feira no parlamento britânico. Acabou o seu discurso muito emocionada tal como emocionados ficaram todos quantos a ouviram, incluindo John Bercow. Tal como eu.
Quando procurei fotografias dela para aqui colocar, reparei que aparece quase sempre a rir, a sorrir. Parece tranquila e feliz. Sabemos agora como tentava encobrir o que lhe ia na alma. Ao vê-la agora com a voz trémula, com a boca seca, à beira das lágrimas, melhor ainda percebemos o que ela se deve ter esforçado para conter e disfarçar a tristeza que a minava por dentro. E é isto que, geralmente, acontece. E isso faz com que a ferida seja ainda mais funda.
Que esta forma de abuso seja melhor contemplada na lei, na lei de todos os países, para que os abusadores, mormente os narcisistas que sabem muito bem disfarçar, é muito importante. Tal como é da maior relevância que estes casos, geralmente silenciados, sejam falados publicamente para que toda a sociedade os rejeite liminarmente e para que as vítimas saibam o que fazer, ganhem coragem, lutem pela sua felicidade e afastem de si todos os que não sabem retribuir o afecto que recebem e corroem o amor próprio e a estabilidade emocional das suas vítimas.
O que abaixo verão passou-se há muito pouco tempo pelo que ainda não deve haver nenhum vídeo legendado. Eu, pelo menos, não o encontrei. Contudo, pela força das palavras e porque penso que muitos de vós perceberão o que diz, aqui vos deixo o vídeo com o testemunho emocionado de Rosie Duffield.
Peço a vossa atenção. Por favor, vejam e ouçam uma e outra vez. É importante perceber os sinais para que quem passa por isto reconheça os riscos e para os que não passam estejam despertos para poderem ajudar quem precisa.
Que Rosie, tão, tão corajosa, encontre agora a sua felicidade é o que desejo. Ela e todas as pessoas que passam pelo que ela passou.
As lágrimas amargas de Rosie Duffield e o seu doloroso e corajoso testemunho
Não são apenas as mulheres que são vítimas. Há-as também narcisistas, agressivas, hipócritas e manipuladoras. Contudo, as estatísticas ou os casos conhecidos parecem indiciar que os casos de violência doméstica (seja ela física ou psicológica) têm muito mais frequentemente as mulheres como vítimas.
Hoje estava para falar de assuntos da campanha ou para partilhar um vídeo divertido. Contudo, depois deste testemunho, acho que não devo poluir o vídeo que acabaram de ver com parvoíces.
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Um dia feliz a todos e um abraço afectuoso a quem sinta como suas as lágrimas de Rosie Duffield.
Há não muito tempo o The Guardian contava How self-love got out of controlinterrogando-se sobre se o narcisismo seria o novo normal.
Vi uma conferência na qual a oradora revelava o crescente aumento do número de narcisistas na sociedade [Managing A Narcissist: Ann Barnes]. As razões serão muitas, desde o enfraquecimento da disciplina parental, passando pelo crescente isolamento pessoal até ao uso cada vez mais intensivo das redes sociais que acarreta uma permanente necessidade de aprovação e reconhecimento.
Referia ela um estudo levado a cabo ao longo de trinta anos junto de estudantes. No início, nos anos 80, cerca de 30% da população estudada era narcisística e 70% empática. Cerca de 30 anos depois, em tempos já recentes, o que se verificou foi exactamente o oposto, apenas 30 % revelavam traços gerais de empatia. E isto é tanto mais preocupante quanto, a manter-se esta tendência, daqui por uns anos viveremos tempos complicados, com uma população cada vez mais narcisísica e menos empática. O que se tem visto a nível sindical já o demonstra bem: classes profissionais que exigem tratamento de excepção, custe o que custar junto de quem for, seja sacrificando doentes, seja prejudicando um país inteiro. Cada um acha-se com direito a tratamento privilegiado porque se acha o mais imprescindível, o mais importante de todos -- ou isso ou porque, simplesmente, se está nas tintas para os outros.
Segundo aprendi, estima-se que 1% da população seja composto por narcisistas psicóticos. São casos geralmente graves -- e nem vou deter-me na frieza com que alguns narcisistas criminosos agem, achando-se com direito a tudo fazerem sem quererem saber do mal que causam.
Depois há o grupo dos narcisistas extremos, cerca de 6 a 10% da população que, não sendo patológicos, são tóxicos, extramente tóxicos. A oradora compara-os a uma hera venenosa e diz que devem ser deixados sozinhos e 'untouched'. São também um perigo porque dissimulam a sua personalidade e manipulam os sentimentos e a mente dos que lhes estão próximos.
Há depois os outros, a maioria, os que são sobretudo uns maçadores, uns chatos, uns auto-centrados, com dificuldade numa boa integração, sempre propensos um clima de conflitualidade, a intrigas, uns passa-culpas, ou, então, uns eternos adolescentes, com aspirações pessoais que se sobrepõem geralmente às da equipa em que deveriam sentir-se inseridos. Em ambiente profissional ainda se conseguirá fazer alguma coisa deste grande grupo de narcisistas moderados mas não é do melhor que se pode ter como colega de trabalho ou como amigo.
O problema sério reside, pois, no 1% de narcisistas pscicopatas e nos 6 a 10% de narcisistas tóxicos,
E se a nível pessoal, lidar com um narcisista pode desgastar e, mesmo, anular a personalidade de quem lhe está mais próximo (e, talvez por isso, os especialistas se refiram a essas pessoas como 'vítimas de abuso narcisista'), a nível social é um factor de corrosão que pode pôr em risco os fundamentos da democracia.
Tem-se visto o que tem sido não apenas a nível sindical mas também a nível político em que narcisistas doentios têm manipulado emocionalmente os eleitores, conseguindo fazer-se eleger e, uma vez lá, tem sido o fartote que se tem visto um pouco por todo o lado (Trump, Bolsonaro, Boris, Salvini, etc). Dizem e fazem o que lhes dá na gana porque se acham os maiores, com direito a tudo -- e que se lixem os que não gostam deles, que se lixe o país, que se lixe o mundo.
Pessoas narcísicas encontram terreno fértil junto de pessoas carentes, pessoas que sentem sempre necessidade de apoio, que acreditam que, com eles, se sentirão mais seguras, melhor acompanhadas.
Segundo li, os narcisístas são muitas vezes suportados por codependentes, pessoas que, justamente, temem ser rejeitadas e que fazem de tudo para se sentirem amadas, protegidas, apoiadas, acompanhadas.
Não sou especialista pelo que o que vou dizer é mera conjectura mas talvez seja essa a razão para que exactamente os sectores mais vulneráveis da sociedade sejam os que mais apoiam os narcisistas, acreditando em tudo o que dizem, votando neles, defendendo-os, até com violência, contra todas as evidências.
O vídeo que abaixo partilho é muito interessante e, apesar de ter a duração de dezassete minutos, vê-se de bom gosto. Foca muito as relações interpessoais e a forma de actuarem das pessoas com estas características. Não são apenas os especialistas na área que têm a palavra: são também as vítimas e é também um exemplar dessa espécie com a qual a sociedade tem sido condescendente ao ponto de os ver multiplicar-se na maior impunidade, alastrando como uma erva daninha.
Narcissistic Abuse: An Unspoken Reality
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E queiram aceitar o meu convite e ver como o fantástico Randy Rainbow lida com o mais estuporado narcisista da actualidade, o Cheeto Christ Stupid-Czar
Em dia de computador sem carregador e à beira de se apagar, limito-me a partilhar os vídeos e respectivas legendas que o amigo algoritmo do YouTube me mostrou hoje e que, na sequência do post de ontem e da surpresa que foi para mim o facto de que que muitas vezes as pessoas que sofrem de ataques de pânico ou de ansiedade são vítimas de uma relação com uma pessoa narcisista, me fez pensar que talvez seja útil partilhar esta informação.
Estive a ler sobre o assunto e a ouvir especialistas na matéria e, de facto, quando se está fora das situações, não é fácil perceber as dificuldades por que passam os que estão dentro delas (muitas vezes nem se dando conta disso ou não querendo percebê-lo ou assumi-lo). Não posso fazer uma selecção dos textos ou escrever, por mim, uma síntese do que li sob pena disto se apagar e ficar a meio, sem post que possa apresentar. Por isso, tenho que abreviar e ficar-me pelo que abaixo verão.
A Dr. Ramani Durvasula, tal como ontem o referi, tem inúmeros vídeos sobre ansiedade, depressão, sobre os efeitos devastadores de conviver de perto com uma pessoa narcisista e, sendo uma boa comunicadora, são vídeos que se vêem com muito interesse.
Tal como ontem referi, o conselho dela e dos outros psicoterapeutas cujos vídeos ou textos vi e li são sempre claros: um narcisista é tóxico e não muda e, se uma pessoa quiser manter a sua sanidade mental, deve afastar-se o quanto antes.
Caso contrário. viverá uma vida frustrada, combatendo crises de ansiedade e, mesmo, de identidade. Mas, tal como ontem referi, há que avaliar bem os riscos. Diz ela, num dos vídeos, que há algumas razões que quem se sujeita a viver com um narcisista, apresenta: dependência económica, não querer separar a família quando há filhos, ou medo de se ficar só. Mas, tudo isso deve ser sopesado pois a vida em conjunto com um narcisista será sempre uma vida incompleta, suportando situações que causarão feridas psicológicas profundas nos que lhes estão perto. Daí o conselho: afastar-se dos narcisistas enquanto é tempo.
Como perceber que se está numa relação com um narcisista?
Narcisismo e ansiedade
Narcissism and anxiety go hand in hand. The narcissist, by design, uses fear, intimidation and stress to kept you confused and bewildered. The effect of this causes a tremendous amount of stress, anxiety, depression and even anger. When you are under this much anxiety it can manifest as eating problems, sleeping issues, nightmares, insomnia, and trouble concentrating. Even when you are complete and out the residual effects of narcissistic abuse can continue and in some situations it can get and/or feel worse because your body knows *now* it can “handle” the pent up emotions. The other issue around this time is how nearly anything can trigger you and cause a backslide. You have to recognize what is going on - identify it - so that you can calm yourself down process what you are going through. Unfortunately this is a slow process and you have to give yourself time to heal.
Narcissism and its discontentes
Narcissism has not only become a normalized social condition, it is increasingly being incentivized. The framework of narcissism with the central pillars of lack of empathy, entitlement, grandiosity, superficiality, anger, rage, arrogance, and shallow emotion is a manifestation of pathological insecurity – an insecurity that is experienced at both the individual and societal level. The paradox is that we value these patterns – and venerate them through social media, mainstream media, and consumerism, they represent a fast-track to financial and professional success. These traits are endemic in political, corporate, academic, and media leaders. There are few lives which are not personally touched by narcissists – be it your spouse, partner, parent, child, colleague, boss, friend, sibling, or neighbor. Whether societally or individually, the toxic wave of narcissism, entitlement, and pathological insecurity is harming us all. The enticements of charm, charisma, confidence, and success can draw us in or blind us to the damaging truths of narcissism. The invalidation inherent in these relationships infects those are in them with self-doubt, despair, confusion, anxiety, depression and the chronic feeling of being “not enough,” all of which make it so difficult to step away and set boundaries. The illusion of hope and the fantasy of redemption can result in years of second chances for narcissists, and despondency when change never comes. It’s time for a wake-up call. Health and wellness campaigns preach avoidance of unhealthy foods, sedentary lifestyles, tobacco, drugs, alcohol, but rarely preach avoidance of unhealthy or toxic people. Yet the health benefits of removing toxic people from a life may have a far greater benefit to both physical and psychological health than going to the gym. We need to learn to be better gatekeepers for our minds, bodies, and souls. Instead of habituating to the global shift of validating narcissism and other toxic patterns, it’s time to understand it and take our lives back. Dr. Ramani Durvasula is a licensed clinical psychologist in private practice in Santa Monica and Sherman Oaks, CA and Professor of Psychology at California State University, Los Angeles, where she was named Outstanding Professor in 2012. She is also a Visiting Professor at the University of Johannesbur
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E tenham um dia feliz
[Pelo menos consegui chegar até aqui mas com vários avisos de que a bateria está no limite]
O mundo tem pasmado com as atitudes narcisísticas de Trump e com o perigo que comportam.
Segundo Trump, tudo o que se relaciona com ele é fantástico, tudo o que faz é do melhor que o mundo já viu, todas as pessoas gostam dele, todas as pessoas querem lidar com ele porque ele é o maior. É o centro do mundo, o rei dos judeus, o escolhido, o descendente de deus na terra -- e isto não é anedota, é mesmo verdade. Em contrapartida, se alguém o contraria, ele zanga-se, amua, irrita-se, despede liminarmente e, de seguida, exerce a malediência activa nas redes sociais. Não sabe lidar com o sentimento de rejeição.
O Dr. Lance Dodes, um reputado psiquiatra americano, professor em Harvard e membro de conceituados organismos que se dedicam ao estudo das disfunções psicológicas e à psicanálise, traça o retrato de Trump. É muito interessante o que ele diz e convido-vos a verem o vídeo que abaixo partilho. Como todos os narcisisistas, Trump adora-se. E, quem estuda a sua personalidade, idenfica-o como vazio, egoísta, manipulador, alguém a quem tudo serve para se auto-promover.
Kim Jong-un é outro que tal. Porque pode e porque a cultura coreana o propicia, ele estimula o culto exacerbado da sua própria personalidade, fazendo com que os outros o aplaudam e o mostrem que o amam. Em contrapartida, ofende-se e rejeita, por vezes até à morte, aqueles que não se curvam perante ele.
Como qualquer narcisista, Trump tem sempre a palavra amor na boca. Ele ama os americanos, ele quer fazer a América grande outra vez. Os narcisistas dizem que amam os outros, sabem convencer os outros que não haverá quem melhor os proteja, os acarinhe, os ame, sabem ser simpáticos. Contudo, todos os estudos comprovam que, na realidade, querem apenas que os outros se sintam amados para retribuirem esse amor. O foco deles, mesmo quando simulam o contrário, é sentirem-se alvo de atenção, merecedores de agradecimento e admiração.
Para um narcisista, qualquer ocasião é boa para falarem de si próprios: dos seus feitos -- e, mesmo que sejam feitos insignificantes, eles relatam-nos como se fossem feitos extraordinários --, das sua recordações, das sua opiniões que, em regra, são vagas, primárias, irrelevantes mas que apresentam de forma exultante como se fosse importante que toda a gente as conheça. Perante qualquer situação, arranjam maneira de auto-referenciarem o tema e, se possível, de se autovalorizarem. Por exemplo, mesmo que estejam a ouvir um assunto pela primeira vez, imediatamente começam a explicar o que acabaram de ouvir a quem está junto a si, como se os outros fossem intelectualmente inferiores e precisassem das suas explicações.
Acompanham com curiosidade quase ansiosa o que se diz nas redes sociais querendo perceber como se posicionam, que novidades há ou se alguém falou de si. Poucos ou nenhuns livros lêem e são, na verdade, geralmente incultos, limitando-se a dissertar, com eloquência e simulando erudição, o que vão apanhando nas redes sociais. E estão sempre presentes, twitando, postando se for o caso, enviando mensagens ou telefonando, telefonando, telefonando. E gostam de falar em voz alta para que todos percebam como é importante e como são importantes os assuntos de que se ocupa. Estão sempre ligados. Aparentemente estão a mostrar a sua atenção junto dos outros: de facto, estão apenas a garantir que a atenção dos outros está virada sobre si.
Com o tempo, não conseguem esconder que não sentem apreço pelos amigos dos que lhe são próximos, levando a que estes apenas convivam sobretudo com o seu próprio círculo, um círculo que aparentemente o endeusa, o que serve para exibir o quanto é apreciado.
São, pois, quase incapazes de se relacionar com os amigos dos outros, especialmente se esses amigos dos outros forem indiferentes ao seu 'brilho'. Se necessário for, forjarão compromissos ou doenças para se esquivarem ao relacionamento com eles. A questão é que não têm paciência para estar num espaço em que não são o centro das atenções. Não conseguem mostrar interesse pelos outros a menos que consigam reverter a conversa a seu favor. Se isso não é possível, então, o que é que lá vão fazer? Por isso, não vão. Ou, se forem, arranjarão maneira de se pôrem de lado. O mundo dos outros não lhes interessa.
Mas, de facto, tendem também a vitimizar-se: qualquer pessoa que os contrarie fá-los sentir miseráveis e veêm esses ingratos como gente perversa que quer o seu mal, que quer deliberadmente menorizá-los -- procurando, de seguida, a solidariedade e compaixão dos que lhe estão próximos, para que fique claro que o problema está nos maus, não neles.
E irritam-se, por vezes com agressividade: não toleram ser interrompidos, não gostam de ser contrariados, não gostam que não lhes condescedam todo o espaço e atenção a que se acham com direito. Quando confrontados, desculpar-se-ão com o stress, com o nervosismo pela incompreensão alheia, ficarão ainda sentidos por não terem compreendido as suas reacções agressivas..
É dos livros que gente assim é tóxica e, por vezes, perigosa.
O vazio que os habita, a forma persistente como o disfarçam, a atenção que exigem e o pouco que, de facto, oferecem em troca, esvazia os outros. Os narcisistas sentem-se com direito a tudo: a serem tratados como especiais, a terem quem os sirva, a terem quem os ouça, a terem quem os acompanhe, a terem quem os console, compreenda em tudo, os apaparique -- isto apesar de eles pouco ou nada darem em troca. E, se os outros não o fazem, então, voltam a vitimizar-se ou a amuar ou, se têm poder para isso, a reagirem violentamente, afastando quem não os venerou. Contudo, se receiam que os outros percebam o que são, logo disfarçam e, em novo passe de mágica, voltam a ser atenciosos, amorosos, prestáveis. E mais um novo ciclo se abrirá, num percurso cada vez mais desgastante.
A Dr. Ramani Durvasula é uma conhecida psicóloga clínica, especializada em narcisismo, e que tem feito carreira também como comunicadora nesta área. Há inúmeros vídeos com conferências e entrevistas onde explica o que é um narcisista, o mal que faz aos outros.
Um narcisista não conversa no sentido em que não quer saber dos outros, não procura as opiniões dos outros, não tem paciência ou curiosidade para os ouvir, ele quer apenas que o ouçam a ele. Um narcisista não tem empatia. É uma das suas características: ignora os sentimentos dos outros. Pode fingir que sim mas logo se percebe que não está nem aí. Pior: um narcisista não muda, nunca muda. Pode iludir temporariamente quem convive com ele, pode até criar a ilusão de ser pessoa para desenvolver sólidas amizades ou interessantes casos amorosos, mas, ao fim de algum tempo, percebe-se que apenas duram enquanto lhe são úteis ou enquanto lhe prestam toda a atenção que requer. Ao fim de algum tempo, a sua doentia personalidade fica evidente.
E o melhor é as pessoas afastarem-se antes que seja tarde demais, antes que fiquem com o seu amor próprio e a sua própria consistência psicológica abalada.
Get away, get out -- é o conselho que os especialistas dão a quem convive com um narcisista. Afastar-se dele antes que seja tarde demais. Contudo, o afastamento pode não ser coisa simples e alguns cuidados deverão ser acautelados (ver How do you break up with a narcissist?)
Tenho lidado de perto com algumas pessoas assim.
Trabalhei directamente com um. Em qualquer circunstância, fosse numa reunião ou num almoço, mesmo que o motivo do encontro fosse outro, ele monopolizava a conversa junto dos que o rodeavam e falava sem parar: relatava os seus feitos, desfiava memórias, opinava sober tudo, sem querer saber do que os outros pensavam. Esgotava quem lidava de perto com ele. Quando eu saía de perto dele vinha anestesiada, esvaziada. Muitas vezes pensei que não aguentaria muito mais, muitas vezes pensei que devia apresentar a demissão.
Infelizmente, não foi o único que conheci de perto.
Gente assim, geralmente começa por cativar mas, ao fim de algum tempo, já começa por surpreender, depois desiludir, depois por cansar e, se as pessoas não se afastam a tempo, acabam por corroer a personalidade e a estabilidade emocional de quem os rodeia.
Dizem os experts que, quando a nível pessoal, os narcisistas geralmente começam por se mostrar encantadores, sabem ser sedutores, sabem fazer com que o outro se sinta especial, fazem com que o outro sinta que, finalmente, encontrou quem o trata bem e quem reconhece o seu valor. Ou seja, ardilosamente, fazem com que a 'vítima' se sinta em dívida pelo suporte que encontraram nele.
Mas é uma questão de tempo. Aos poucos, vão anulando os outros. Se isto se passa a nível amoroso, destroem qualquer relacionamento e a única solução possível para quem lhe saíu um narcisista na rifa, é rifarem-no o mais rapidamente possível.
Em ambiente profissional é também muito mau A única solução possível para quem não tenha fortuna pessoal ou outro emprego na forja, é aguentar, encontrar resiliência, e esperar: um narcisista invariavelmente, com o tempo, cansa-se de onde está (porque chega a um ponto em que os outros lhe viram costas e eles só vivem rodeados de quem os admire, indo, pois, reiniciar o seu exercício de sedução para outra freguesia) e, portanto, mais tarde ou mais cedo, as pessoas que, profissionalmente, tiveram que se sujeitar a suportar a sua existência acabam por se ver livres deles.
Agora, ainda mais grave, muito, muito mais grave (porque muito mais extenso o âmbito dos danos que causam), é quando um psicopata destes está à frente de um país. Aí, a única solução é pensar com a cabeça, é avaliar bem a razoabilidade do que fazem e dizem, é denunciar as suas fanfarronadas, ou, se inócuas. é ignorá-los e, na primeira ocasião, correr com eles. Se não puserem pé em ramo verde que seja motivo para serem legalemente corridos, então que, nas eleições, o ajuste de contas seja feito.
Mas vejam, por favor, os interessantes vídeos que hoje o YouTube tinha para mim, talvez por eu ter estado a ler sobre o comportamento do Trump naquilo da Gronelândia e na forma absurda como lida com o Irão, com a China e, de facto, com tudo:
Psychiatrist On ‘The Essential Emptiness Of President Donald Trump’
| The Last Word | MSNBC
Dr. Lance Dodes, one of the first mental health professionals who questioned Donald Trump's stability, discusses with Lawrence O'Donnell how Trump has devolved since the beginning of his presidency.
E para perceber a diferença entre um parvo, um simples parvo, e um narcisista doentio de quem se deve evitar estar por perto:
Jerk or Narcissist: What's the Difference? | Dr. Ramani Durvasula
We all have those difficult people in our lives. But did you know that the boss who never has a nice word to say, or the family member who always puts you down could actually be a narcissist ? Learn what red flags to watch out for in this video.