Era bom que só houvesse pessoas boas, generosas. Era bom que só houvesse justiça à superfície da terra. Era bom que houvesse trabalho para todos e que todos quisessem trabalhar, era bom que não houvesse pobreza, nem doença, nem roubos, nem abandono escolar. Era bom que houvesse equilíbrio entre o que se quer comprar e o que há para vender para que os preços fossem justos e equilibrados. Era bom que nascessem tantas crianças que compensassem o acréscimo de esperança de vida das pessoas. Tudo isso seria maravilhoso e já nem falo de outras coisas que também seriam boas (como, por exemplo, que só houvesse pessoas educadas, respeitadoras, inteligentes, etc).
E era bom que em cada canto estivessem, entre canteiros floridos visitados por borboletas e pássaros multicores, pessoas que, discretamente, tocassem, ao violino, suaves melodias. E que dos céus caíssem confettis brilhantes, coloridos, prlim, pim, pim, tudo na maior harmonia, paz e amor.
Mas um mundo idílico assim não há, nem nunca houve.
Gerir recursos finitos, gerir imperfeições, gerir expectativas, gerir sensibilidades, gerir imprevistos, gerir o impacto de influências externas, tudo isso é, de facto, a difícil atribuição de quem anda nesta vida. Seja qual for o papel de cada um na sociedade, ninguém pode fugir a isso, seja a nível doméstico, social, profissional, político.
Podemos também olhar apenas para dentro de nós próprios e ignorar os problemas ou, então, dizer que, se os há, sejam de que natureza forem, os outros que os resolvam, ou que o Estado que os resolva.
E o Estado seria constituído por batalhões de assalariados, governados por forças políticas, pagos com os impostos dos ‘outros’ que dariam resposta a todo o tipo de necessidades. Desde logo as usuais, educação, saúde, segurança pública, etc, mas também as outras necessidades. Quais?
Por exemplo: se há pessoas que, por uso de drogas ou por alcoolismo ou outros desnortes das vida, caem na rua, haveria funcionários públicos para lhes levar cobertores à noite, distribuir comida quente (de notar que, em grande percentagem dos casos, os sem-abrigo não querem abandonar a rua); se há crianças que se têm que tratar hospitalarmente por períodos prolongados longe da sua residência e a família não tem recursos, então haveria residências do Estado, geridas por funcionários públicos para acolher e dar apoio às famílias; se há pessoas hospitalizadas longe de casa e que não recebem visitas, haveria uma legião de funcionários públicos para visitar doentes sós; se, nas zonas carenciadas, há muitas adolescentes grávidas que são abandonadas pela família, ter-se-iam residências do Estado, em que zelosos funcionários públicos apoiariam, dariam carinho e formação às futuras meninas-mães e acolheriam depois do nascimento, as recém-mamãs com os seus bebés, garantido-lhes a subsistência e o apoio emocional.
Talvez isso fosse possível… mas seria muito complicado. Às tantas tudo seria estatal e não haveria impostos suficientes para acudir a tanta solicitação (já para não falar na ineficiência, pois quem é que geriria todos essa imensa legião de funcionários públicos? Directores-gerais, dependentes de secretários de estado escolhidos de entre o partido do poder….? […e onde é que eu já vi isto….?]).
No mundo imperfeito que temos – em que, infelizmente, temos crianças com cancro a precisar de longos e penosos tratamentos, em que infelizmente, temos gente que cai na rua e aí fica desamparada, em que infelizmente, temos mulheres maltratadas que têm que se esconder dos agressores, em que temos pessoas em casa com fome e vergonha de pedir ajuda, em que temos famílias sem dinheiro para comprar roupa e livros para os filhos, em que infelizmente temos jovens que pertencem a famílias carenciadas ou desagregadas sem um adulto que os apoie no processo de crescimento, em que infelizmente há reclusos renegados pela família que nunca recebem uma visita – há também pessoas abnegadas que se dão a si próprias, que dão parte do seu tempo, de forma desinteressada. São os Voluntários.
Há Voluntários de várias actividades: para ajudarem jovens, para ajudarem famílias, para ajudarem crianças, para ajudarem doentes, para recolherem alimentos, para redistribuírem alimentos, ou vestuário, ou livros, para fazerem visitas, para levarem uma comida quente, uma palavra amiga, para dar formação, para dar apoio administrativo, para transportar, enfim, para quase tudo o que for preciso.
E já nem falo nas missões fora do País, em campanhas de vacinação, alfabetização, etc.
Vidé o filme Beyond Borders ou Amor sem Fronteiras, com a Angelina Jolie (ela própria uma Voluntária, uma lutadora por nobres causas) e o Clive Owen, cujo trailer coloquei no post abaixo.
A quem quer ser Voluntário, que eu saiba, ninguém pergunta qual a religião que professa (eu, por exemplo, conheço católicos, budistas, agnósticos e, da maioria, não faço a mínima ideia), qual o partido em que vota, qual o clube de futebol. Que eu saiba, quem vier por bem, é bem vindo.
Apenas fiz uma pequena actividade de voluntariado e é recente o meu contacto com este outro mundo, pelo que ainda não me considero uma voluntária. O que sei é ainda muito pouco; por isso, frequentei uma acção de formação para me preparar para actividades futuras e tenho lido, tenho-me informado.
Sei que é uma realidade dura, difícil. Abdica-se de estar confortável em casa, com os amigos, com a família, para ir lidar com uma realidade difícil, dolorosa.
Por isso que ninguém desdenhe do trabalho dos voluntários. É uma sociedade civil silenciosa, organizada, generosa, que se movimenta geralmente na sombra, para ajudar quem precisa de ajuda.
Seria bom que todos nós percebessemos isso e nos dispuséssemos também a dar um pouco de nós para bem dos outros.
A Isabel Jonet, à frente do Banco Alimentar contra a Fome, é uma das caras mais conhecidas do voluntariado mas há milhares de outras pessoas que, com a mesma dedicação, se entregam, na medida das suas possibilidades, à ajuda desinteressada a quem, seja quem for, dela esteja a precisar (Acreditar, Ajuda de Berço, Entreajuda, Comunidade Vida e Paz, etc, são algumas instituições conhecidas mas há muitas outras).
São pessoas que dedicam parte da sua vida aos outros, que fazem de tudo para conseguir disponibilidade, recursos, para os entregar a quem mais deles necessita. E são pessoas que sabem acompanhar o seu tempo. Isabel Jonet, uma vez mais, é um exemplo: tem sabido tirar partido das novas tecnologias e assim vemos a instituição que gere já inserida no Facebook, vemos o perfil da própria Isabel Jonet no LinkedIn pretendendo com isso estimular os contactos por esta via - porque todos os meios servem; aliás não nos esqueçamos que felizmente há muitos, mas mesmo muitos, jovens voluntários que, com o conhecimento que têm das novas formas de contacto social, contribuem dessa forma para a divulgação da causa e para angariar mais voluntários, mais meios, mais donativos.
E todos nós, mesmo que felizmente ainda não tenhamos precisado ou mesmo que ainda não tenhamos a abertura de espírito ou a experiência de vida para perceber esta outra realidade, deveremos estar muito gratos a estas pessoas.