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quinta-feira, janeiro 07, 2016

A vida multiplicada e brilhante, em que é pleno e perfeito cada instante. Agora e na hora da minha morte.





Cansa-me o que é mais do mesmo. Pelo contrário, atrai-me a diferença. Seduz-me a imprevisibilidade. A multiplicidade, a mim, encanta-me. Perceber que pouco percebo, descansa-me o espírito. Andar como uma criança por entre um mundo de desconhecimento atrai-me. Se eu fosse de me exprimir através de lugares comuns (e acho que não sou) até poderia acrescentar que a diversidade é a minha praia, em especial, se for inesperada.

Que o sol se descubra, em brilho e festim, no meio de um céu cinzento, para logo desaparecer, fazendo crer que não aconteceu, é para mim um milagre que me empolga. Que uma palavra silenciosa se desprenda de um coração para vir pousar junto ao meu, parece-me coisa dos deuses. Que uma música me transporte pelos céus como se eu fosse dentro de nuvens feitas de algodão em rama, parece-me magia. Que uma flor surja, rosada e límpida, por entre um chão de folhas mortas, parece-me um presente que nada fiz para merecer. Andar pelo campo, só eu, em passos de lã, e ouvir os pássaros, cantando de árvore para árvore, místicos, seres de um outro mundo, parece-me bênção, quase predestinação.


Não sei se um dia conseguirei ordenar todas as peças por forma a fazerem sentido. Espero que não. Se isso acontecesse seria como andar na formatura, sabendo os passos a dar, todos iguais, obedecendo a uma voz de comando, sem uma gota de surpresa a perfumar os meus sentidos.

Prefiro continuar assim, feita de muitas peças coloridas colocadas à toa, como uma casa de lego feita por uma criança, e saber que amanhã a casa pode estar diferente, as peças amarelas misturadas com as verdes e com as encarnadas, as janelas no lugar das portas, a chaminé a parecer uma torre que aterrou no telhado, e que no outro dia a casa vai parecer um lago com árvores dentro e pássaros no jardim e que afinal não são pássaros, são cavalos azuis. Assim é que me sinto bem.


Ouço música enquanto escrevo. Escolho ao acaso. Agora tinha escolhido uma, uma fantasia árabe, ficou a tocar, depois passou para outra que reconheci. Maravilhada fui espreitar: quem a pôs aqui a tocar para mim? Não sei mas acredito que uma mão que me quer tocar, a pôs a tocar para mim. Já a coloquei agora aqui, lá em cima, para que a ouçam também. Já mil vezes aqui a coloquei, em diversas interpretações, mas mil outras vezes ela me aparece, tentadora, um espelho em frente de um espelho, a alma translúcida de alguém que talvez seja eu reflectida num espelho que descobre alguém que não sou eu mas que está presente em mim como eu.
E se nada disto tem explicação, nem o que escrevo, nem o que penso ou faço, então está certo, é mesmo assim, sem explicação. 
Fui buscar imagens para intercalar no texto sem saber o que procurava. Escolhi ao acaso, não sei se fazem sentido junto a estas palavras desordenadas. Sinto que sim, parece que trazem alguma ordem a este caos que me seduz e que me acolhe. Mas também não sei explicar porquê, nem tento.


Olho à minha volta nesta minha mesa redonda onde escrevo e onde se aninham os livros que gosto de ter por perto: um livro sobre bibliotecas, livros de poesia, aqui mesmo ao meu lado 'Amar a vida inteira' de Casimiro de Brito e 'Últimos poemas de amor' de Paul Éluard, livros sobre pintura e entrevistas a pintores, também a um arquitecto, e 'Cartas de Amor' de Pablo Neruda,  e um livro vibrante sobre Havana com as suas cores quentes e alegres e gente sorridente, e também um daqueles livros loucos, que me delicia, do Beckett. E 'Seis propostas para o próximo milénio' de Italo Calvino. E outros. Uma miscelânea que parece que me procura ou que se forma, por si só, à minha volta.

E tenho também aqui verniz carmim, estive a pintar as unhas, e um CD, ofereceram-me pelo natal, muito bom, e uma concha que trouxe de Lagos, adoro Lagos, parece que uma parte de mim tem sempre vontade de para lá ir, e agora acabo de descobrir um saquinho de tâmaras (como veio isto aqui parar? - é certo que gosto imenso de tâmaras mas não me lembro de as trazer para aqui). Ao centro da mesa está uma bandeja que tem uns pequenos pés. Está cheia de coisas: as rodas de um carrinho, um ramo pequeno com bolinhas encarnadas, deve ter-se desprendido de um enfeite de natal, uma caneta cor-de-laranja, uma lupa, um lápis que escreve palavras macias, e mais coisas. Na parte de baixo da bandeja mandei gravar um poema de Sophia:

És tu a Primavera que eu esperava,
A vida multiplicada e brilhante,
Em que é pleno e perfeito cada instante!


Às vezes penso que um dia vou deixar de andar por cá. Se eu estiver consciente quando isso acontecer, penso que estarei serena, como quem já conheceu e desfrutou bem esta vida e está pronto para partir para outra. Quando tive um acidente violento que destruiu o carro, tive, na fracção de segundos em que aconteceu, a consciência de que poderia estar a viver os meus últimos instantes. E não me assustei. Estava num carro sem travões, a descer por uma descida que ia ter a uma rotunda cheia de camiões, era mais que certo que me ia desfazer contra um deles, e não senti medo. Depois, não sei como tive discernimento para isso, para evitar bater nos carros que circulavam, resolvi subir para o centro da rotunda, vi o carro a avançar contra uma enorme peça metálica, pensei que a peça ia entrar pelo vidro e talvez degolar-me. E não me assustei. Teria morrido na maior das tranquilidades. Pensei que nem tinha tempo para pensar nos meus filhos. Já o contei aqui: os airbags abriram-se, encheram o carro de fumo branco, o carro ficou meio no ar, de lado, espatifado, choquei com uma árvore, que ficou destruída, e choquei com aquela enorme peça. A custo, dada a posição do carro, saí dele, admirada por estar viva. As pessoas saíram dos carros, assustadas, diziam para eu fugir porque o carro podia explodir, pensavam que o fumo era o carro a arder. Eu estava calma. Não fiquei ferida. Telefonei, vieram buscar-me, queriam levar-me ao hospital, não quis, sabia que estava bem. Fui trabalhar como se nada se tivesse passado. O seguro declarou perda total para o carro.

Penso nisto, às vezes: na minha tranquilidade perante uma situação da qual, racionalmente, pensei que talvez resultasse a minha morte. Mas não pensei assim: 'a minha morte' ou 'vou morrer'. Pensei apenas: 'se calhar estou a viver os meus últimos instantes de vida'. E pensei isso com uma paz assombrosa. Parece estranho mas foi assim que aconteceu.

Não sou católica, não sou sequer crente, pelo menos segundo os ditames da religião católica. Mas parece que sinto que vivi antes, como se trouxesse em mim memórias de vidas que não vivi. Ou que vivi. E parece que sinto que viverei mesmo depois de ter deixado esta vida. Talvez viva apenas na memória dos que me amaram. Ou viva no corpo de uma gaivota. Mas isso não me interessa.


O que me interessa é esta aventura, é este prazer em juntar palavras, em descobrir cores, em deixar-me embalar por acordes, é deixar-me amar, é amar, é ser meio louca, é dizer coisas que não fazem sentido, é sorrir, é ver o sorriso no olhar de quem me quer bem, é saber que mais logo, se calhar, vou ser o oposto disto, e depois outra vez diferente -- a vida caleidoscópica e irrepetível e eu também incompreensível, quase inexistente na minha colorida, ilógica e indescritível multiplicidade (ou unidade?).

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As pinturas, por ordem descendente são de Balthus, Guilherme Parente, Júlio Resende, Chagall, Matisse, Gauguin.

Spiegel im Spiegel de Arvo Pärt é interpretado por Leonhard Roczek no violoncelo e Herbert Schuch no piano.

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Sobre o debate Paulo de Morais e o Zelig da campanha presidencial, Marcelo de seu nome, é descer até ao post seguinte, por favor.

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segunda-feira, agosto 03, 2015

Medo











 acredita em mim: é só um rumor.

não sei escrever o vento,
nem sei como se nasce outra vez.
nunca soube como se tece
no piano a face vazia do tempo.

por favor, não perguntes:
pois eu não sei como germina um poema,
nem quantos dias cabem no teu rosto.
E como se conjuga a cidade com o adeus?

Perguntas, mas eu não sei o que é a morte.






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As fotografias foram feitas da zona da Rua da Escola Politécnica para baixo, vendo-se ao fundo a Basílica da Estrela.

A música, lindíssima, é um dueto: Júlio Resende no piano com Amália Rodrigues, na interpretação de 'Medo'

O poema é o XXIX de Espera Vigilante de Ricardo Gil Soeiro.

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terça-feira, fevereiro 17, 2015

Porto, lindo e majestoso [3 de 4] - a beleza desta cidade que tem um rio chamado Douro


No post abaixo mostrei algumas das pequenas lojas de comércio local do Porto e que são parte do encanto desta cidade que está cada vez mais bonita.

Noutro, mais abaixo ainda, mostrei uma árvore muito especial.

Aqui, agora, mantenho-me no Porto e, para não vos maçar demais, vou cingir-me a uma das zonas mais felizes da cidade, a Ribeira. Mas abro uma excepção para a 1ª fotografia. Sempre que venho ao Porto gosto de dar um giro na R. de Sta Catarina. 



Na Rua de Sta Catarina, casal sorrindo para a selfie da ordem enquanto um 'local' lhes tenta vender qualquer coisa


É um hábito que vem de outros tempos, quando a Rua de Sta Catarina tinha uma loja que eu conhecia de Espanha e que ainda não havia em Lisboa, a Zara. Gostava de ali comprar roupas para os miúdos, e para mim também, claro. Chegava a vir ao Porto quase de propósito para vir às compras. Havia outras lojas onde também gostava de me abastecer. E sempre gostei muito de aqui passear.

Dantes o meu marido tinha que cá vir em serviço com alguma frequência e eu chegava a meter um dia de férias para ficar a flanar pela cidade enquanto ele tinha reuniões.

É uma cidade à qual volta e meia e de há muito também eu venho em serviço mas na qual, nessas alturas, irritantemente nunca consigo passear: é chegar, trabalhar e largar. Mesmo quando cá fico a dormir, chego ao hotel ao fim do dia, faço o check in, saio para jantar, jantar também de serviço, regresso tarde, vou para o quarto e, no dia seguinte, estupidamente cedo, pequeno almoço, check out e ala moço que se faz tarde para mais um longo dia de reuniões. Por isso, com uma certa frequência, bate esta vontade de cá voltar para me desforrar.

Claro que o tempo é sempre muito rateado e é um calcorrear até quase à exaustão, turista no meio de muitos outros. Mesmo nesta altura do ano, com frio, chuva, tempo cinzento, há muitos estrangeiros e isso é bom para a cidade, torna-a ainda mais cosmopolita. Mas tal a raça da sua gente, nota-se que a alma tripeira continua viva no sotaque e na irreverência das pessoas do Porto.


Porto sentido - Rui Veloso



Há um passeio a que nunca consigo resistir: ir até à Ribeira. Descemos até lá, eu fotografando, tantas coisas sempre novas, um prédio que se recupera, um novo hostel muito bonito de onde saem jovens animados, as caixas com os quadro eléctricos nas ruas com pinturas engraçadas, uma loja que dá vontade visitar, uma gaivota sobre um carro ainda longe do rio, o cheiro a bolos que vem de uma pastelaria que aqui geralmente se chamam leitarias, sempre mil motivos de interesse.

Até que chegamos à margem, à Ribeira. Menos gente do que quando o tempo está mais quente e, portanto, mais calmo. Sentámo-nos de frente para o rio e ali ficámos, eu a ver as gaivotas, os barcos, a outra banda.


A zona ribeirinha, com as esplanadas


S. João Baptista de João Cutileiro no nicho da Fonte da Praça da Ribeira



Depois passámos para o lado de Gaia para poder ver o Porto de frente, ver o rio que aqui, ao contrário do Tejo que é largo como um lago, é estreito e permite que praticamente se veja de um lado para o outro. É um rio romântico, e os tons são melancólicos. Há muita beleza mas é uma beleza requintada, solene, não uma beleza meridional e luminosa como a de Lisboa. 


A beleza quase sublime do Douro e dos seus barcos rabelos na margem do lado de Gaia


Mesmo a zona da Ribeira que é uma zona popular, de casas antigas, muitas com ar pobre e que se adivinham com poucas condições, tem uma beleza ancestral, de cidade histórica com muitas histórias, que forçosamente inspira amores, abandonos, traições.


O colorido quase irreal do Porto que se quer ver ao espelho na superfície das águas do Douro


De todas as vezes rendo homenagem ao Mestre Júlio Resende que tão bem gravou no azulejo a sua Ribeira Negra.


No lado de cá da estrada está a homenagem ao barqueiro salvador Deocleciano Monteiro, mais conhecido por Duque. Foi esculpido por José Rodrigues.




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Relembro que no post abaixo há lojas para todos os gostos e, mais abaixo, uma árvore bela demais.

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terça-feira, julho 22, 2014

Limpezas in heaven em tempo de trabalho - uma coisa a fazer de conta, a bem dizer


Ora, então, comecemos pelo resumo dos posts anteriores.

A seguir a este, temos anedotas sobre advogados, essa raça de gente mais perigosa, credo.

Mais abaixo ainda, mostro uma quase selfie da Joaquina depois de o meu marido ter tratado da sua higiene. Resolvi que vou ensiná-la a tocar ferrinhos para fazer uma surpresa à família. Quando regressarem dos banhos, nem vão acreditar quando a virem, toda gaiteira. Para a ensinar, vou usar como guru o fofinho do selfie Tozé, mostrando-lhe o vídeo desse grande líder da classe operária e das cassetes piratas em plena actuação pelas terras de Portugal.
Eu, se fosse o Eurico Brilhante ou os outros da entourage do Tozé (quem são?), haveria de tentar para o grande chefe uma coisa ainda mais arrojada. Por exemplo, contratava a Joana Vasconcelos e encomendava-lhe uma obra de arte que o Tozé pudesse vestir quando anda em digressão. Um fato de galo de Barcelos, por exemplo. Feito de pegas. Já estou a vê-lo, todo contente, biquinho afiado, todo colorido, a tocar ferrinhos e a ver se caça mais um votinho. Fofinho.

Bem, mas isto é a seguir. Agora, aqui, a conversa é outra.







Os assuntos que estão em fila de espera na minha cabeça amontoam-se porque eu sou só uma. Alguns acabam desistindo, outros pacientam até que as agruras diárias deixem uma aberta para que eles metam o pé e acabem forçando a entrada. Tenho pena de não poder atendê-los bem a todos. Se eu conseguisse escrever a quatro mãos, desafogava. Assim fazem enchente e, como não tiram senha, eu, que não quero ferir susceptibilidades, não sei por que ordem ir dando vazão.

Por exemplo, tenho na caixa de correio alguns artigos ou anedotas que alguns Leitores, generosos, me vão enviando. Mas gosto de os tratar, embelezar ou, quando são assuntos sérios, gosto de os perceber, de cruzar informação. Mas escasseia-me o tempo e os assuntos vão-se juntando. Depois há os  que nascem da actualidade, estou a ver as notícias enquanto janto e lá me aparece um tema que atropela os outros, salta por cima, vem plantar-se-me na ponta dos dedos. E alguns dos outros, depois, perdem razão de ser.

É o caso. Tenho aqui uma mente mas não sei se faz sentido. Quem me vai ler a uma terça feira, quer lá saber do que eu fiz no domingo... É assunto já de si irrelevante e se, ainda por cima, já for velho, interessa a quem?

Estava in heaven no domingo a fazer a faxina doméstica e, ao mesmo tempo a fazer a reportagem fotográfica, pensando depois falar nisso..

Quando estou no fresco do gabinete, a tratar de assuntos sem graça, não me ocorre mostrar-vos as paredes onde óleos verdadeiros as embelezam ou as paredes de vidro por onde a luz entra sem que o calor do sol me incomode. Tudo me parece inenarrável. Talvez tivesse interesse a quantidade incrível de pessoas que encontro nos grandes elevadores que andam em permanência para baixo e para cima sem que eu antes alguma vez as tivesse visto. Agora, já aparecem as que vieram de férias, mulheres esculturais bronzeadas e vestidas como se fossem para cocktails em Embaixadas ou cavalheiros tisnados e elegantes como se fizesse parte de um filme da Dolce and Gabanna. Ou outras, parecidas, perfumadas da mesma maneira, vestidas também quase da mesma maneira mas numa gama mais baixa (talvez queiram imitar as primeiras) ou homens conversadores e divertidos que falam sobre assuntos incompreensíveis.
Eu poderia pedir autorização para filmar esta curiosa gente que habita o grande edifício onde trabalho e teria, com certeza, a partir daí roteiros para muitas histórias.
Mas, tirando isso, os assuntos são muito específicos ou muito atilados para aqui me referir a eles. Há também o sigilo, claro, mas isso obviamente, está fora de questão pois jamais falaria aqui de assuntos profissionais particulares.
Em família também raramente falo de trabalho. Quanto muito, falo de assuntos de pessoas que lá trabalham. Não acho graça a falar de trabalho nem acho que isso interesse a ninguém tirando aos que lá trabalham comigo. Acho que a grande maioria das pessoas da minha família e amigos não sabe exactamente o que faço. Sabem a designação do meu cargo mas não como lá ocupo o meu tempo.
Contudo, gosto de falar de outras actividades que desenvolvo. Por exemplo, não me importo nada de falar de culinária, arrumações de livros ou limpezas.

Dizia eu, portanto que, no domingo, tinha a ideia de falar das limpezas mas, depois, meteu-se o artigo do Pde. Tolentino Mendonça sobre a carta da Rosa Luxemburgo e, quando acabei, apeteceu-me escrever o outro sobre eu ter nascido sem asas.

A propósito, quando estávamos esta segunda feira à espera para almoçar, perguntei ao meu marido se tinha lido. Respondeu-me: ‘Uma maluquice’. Perguntei de qual é que ele estava a falar já que tinha escrito dois posts. Respondeu ‘De teres nascido sem asas. Está muita gente aqui e eu não me posso demorar’. Interpelei-o, claro está: ‘Pergunto-te se gostaste do que escrevi e despachas o assunto em grande velocidade, mudas logo para outra coisa’. Respondeu-me: ‘Mas claro. Se é uma maluquice, mudo de assunto e faço de conta que não é nada. Ia agora pôr-me a falar de teres nascido sem asas? Não sou maluco.’ Isto para vocês verem o quanto os meus dotes literários são apreciados aqui por casa.

Bem, a ver se me concentro. Limpezas.

Tapetão de Arraiolos feito por moi-même, desenho livre, que tenho aos pés do sofá em frente da televisão


Há coisas de que gosto bastante de fazer. Gosto de varrer, sacudir tapetes, pô-los ao ar, lavar o chão, lavar casas de banho e cozinhas. E cozinhar, claro.

Não gosto nada é de limpar o pó. Fui enchendo os móveis de tralha e depois não dou mãos a medir. Qualquer dia guardo as bugigangas todas numa arca para só ter superfícies lisas para limpar.

E agora acontece um fenómeno.


Onde eu fui dar com a tesourinha... dentro de um dos pratos da balança antiga

Volta e meia os pimentinhas desencantam coisas onde não podem mexer. Então a gente tira-lhes as coisas das mãos e esconde-as onde eles não cheguem. E depois nunca mais ninguém se lembra. Bem se podem depois procurar essas coisas porque nunca estão onde é expectável. Ao limpar o pó é que vou descobrindo coisas onde menos se espera. Por isso, a tarefa de limpar o pó é uma seca ainda maior: é limpar e encontrar novos esconderijos para os objectos que vou descobrindo fora do sítio.

Acresce agora a quantidade de brinquedos que descubro por todo o lado. 


Brinquedos que eram dos meus filhos.
A estes pu-los a ocuparem dois lugares de sofá


Nem sei onde guardá-los pois os pimentinhas, mal chegam, entram a correr à procura do carro da pá, da cama da barriguita, do cavalinho, da casa das chaves. Mais vale as coisas estarem à vista. Eram brinquedos dos pais. Tenho a despensa cheia deles. Vão saindo à cena à medida que os pais se vão lembrando.

Depois, quando saímos, é uma manobra logisticamente tão complexa que não dá para estar com grandes arrumações. A maior parte, a bem da verdade, nem com grandes nem com pequenas. Fecham-se portas e janelas, desliga-se o gás e a água, acciona-se o alarme, e ala que se faz tarde.

O pior é quando se entra em casa na vez seguinte.


Estaca de madeira que ficou assim
depois de a terem andado a revestir de plasticina.
Menos mal aqui, até fica com piada.
O pior é quando encontro nas carpetes,
bolinhas dentro de caixinhas e sei lá mais por onde.

As plasticinas agora estão escondidas mas encontro vestígios por todo o lado. O meu marido aborrece-se, Porque é que tiveste a triste ideia de lhes dar plasticina...? Esconde-a bem escondida antes dos gajos chegarem!


Mas o pior mesmo são as teias de aranha. Não dá para acreditar. Há teias nos cantos das paredes, entre as molduras dos quadros ou dos espelhos e as paredes, debaixo das cadeiras, por todo o lado. A cadeira de balouço por baixo era uma teia de aranha pegada.

Quinze dias sem entrarmos em casa e a bicharada toma-a de assalto. Dos bichos de conta então nem é bom falar. Afasto os sofás ou os móveis e não há apenas pó: há toda a espécie de animais rastejantes. Este fim de semana mais uma: a sala estava cheia de formigas. Eu, que gosto de andar descalça, ia sendo devorada.

Mas são limpezas à pressa. Ao fim de semana, geralmente mal estamos lá 24 horas. Entre chegar, ler o Expresso, descansar e comer e dormir, como fazer uma limpeza como deve ser...? E isto quando estamos só os dois porque, se vai a tropa toda, então, é tentar chegar antes deles para uma limpeza à pressão e acabou-se, porque mal chegam já não há oportunidade para frescuras dessas.

Estou desejando que cheguem as férias para poder fazer uma limpeza mais a sério, lavar tapetes, lavar vidros, pôr cera nos soalhos.

E lá fora...? Desta vez não tive tempo mas há folhas secas que dão para uma semana de vassoura na mão. E o que eu gosto de varrer.


Paredes a precisar de pintura
Chão a precisar de ser varrido


Há outros trabalhos mas esses requerem mais mão de obra e mais tempo. Por exemplo, pintar a casa e os muros, já para não falar de bondex nas portas e portadas. Com tanta chuva, o musgo infiltra-se nas paredes e descolora e seca as madeiras. Eu gosto imenso de ver, farto-me de tirar fotografias, acho bem mais bonito assim do que paredes brancas imaculadas e madeiras reluzentes mas, de facto, acho que estaria na hora de pintar tudo. Mas quando? Vamos sacrificar as poucas férias que temos com homens lá dentro, a pintar a casa? Pintarmos nós não dá, é parede a mais para sermos só nós dois. Aí é que as férias não dariam mesmo e acabávamos as férias mais podres do que quando começássemos. Enfim, vamos andando, a casa cada vez mais coberta de patine. Um charme - faz de conta.

Agora tinha ainda ideia de vos contar sobre o almoço de domingo cujo tempero foi feito apenas com ervas que apanhei por lá mas já são duas da manhã e já estou com sono. Fica para outro dia, está bem?


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A música lá em cima é uma interpretação de um pianista fantástico (tantas vezes uso estes adjectivos que qualquer dia vocês não me levam a sério mas que hei-de eu fazer se há tantas coisas e pessoas fantásticas?): Júlio Resende aqui interpretando "Fado" (Gaivota).


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Relembro: para piadas sobre advogadas perigosas e sobre ainda mais perigosos estudantes de advocacia, desçam por favor até ao post já a seguir. Para verem o que eu vou ensinar à Joaquina para ver se ela se torna primeira-ministra, desçam até um pouco mais abaixo. Informo os que não gostam de fofinhos: para além da Joaquina, vão lá encontrar uma coisa ainda mais fofinha que a Jaquina, o docinho do Tozé a tocar ferrinhos.


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E, por agora, por aqui me fico.
Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela terça feira. 
E os que estiverem de férias façam a caridade de não mo dizerem, para eu não morrer de inveja, está bem?


quarta-feira, setembro 21, 2011

Júlio Resende, a suavidade das suas cores, a leveza das suas figuras


Tenho aqui ao meu lado dois pequenos quadros com coloridos suaves, infantis. Pequenas manchas, pessoas entre flores, uma mulher com um livro no regaço, um homem sentado ao longe, talvez, noutro uma mulher reclinada num quarto florido, num jardim, não sei. Manchas de cor, de ingenuidade, de um mundo puro.

Fotografei-os para vos mostrar mas o programa de edição de fotografia hoje não funciona, vá lá saber porquê.

Queria mostrar-vos para vos dizer que Júlio Resende está aqui comigo e aqui continuará. Os artistas estão onde estão as suas obras, vivem para sempre, estão entre quem ama as suas obras.

Por isso, vou à internet buscar uma imagem porque quero cores perto de mim quando falo dele.


Cores, sorrisos, flores, movimentos subtis, leveza, transparência, aragens suaves, luz, inocência: para sempre entre nós a gentileza da obra de Júlio Resende.