No balneário da piscina, as minhas colegas encarniçam-se contra 'isto' e dizem que no dia 10 de Março é preciso ir votar para 'acabar com isto tudo', 'para os tirar de lá'. Tentei contrariá-las, contrapondo factos mas percebi que é escusado. Eu falo de números que confirmam o óbvio, não fujo do registo da objectividade, enquanto elas falam de uma fotografia que alguém lhes mandou com pessoas a dormirem à porta de um centro de saúde. Não sabem onde e muito menos sabem se a fotografia é verídica. Nem querem saber. Outra contrapõe com uma idosa que morreu à porta do hospital. Pergunto se a pessoa se salvaria se estivesse dentro do hospital ou se chegou lá já sem salvação. Não sabem nem querem saber. Sabem é que 'são todos uns gulosos' ou que 'há mais crimes violentos por causa dos brasileiros', 'uma vergonha'.
Quem vai votar no Chega não quer saber o que é que o Ventura fará se um dia chegar ao poder. Isso é coisa que não lhes ocorre. A única coisa que sabem é cavalgar a onda da maledicência e do deita abaixo.
Os meus filhos contam que colegas e amigos, técnicos superiores e gestores, pessoas em cargos relevantes e escolaridade elevada, dizem que vão votar no Chega pois acham que 'já chega de tantos anos de status quo' e que 'está na altura de rebentar com isto'. Uns são religiosos, frequentam missas e retiros, outros praticam muito desporto e têm muitos amigos. Não têm tempo nem pachorra para ouvir notícias, para ler artigos. Nasceram depois do 25 de Abril, só conheceram a democracia, não valorizam o que têm e, por desfastio e porque é cool, 'querem rebentar com esta porcaria toda'.
Numa entrevista, com pasmo, ouvi o pobre do Raimundo a apelar aos que antes votavam no PCP e agora vão votar no Chega. Diz, com ar de quem percebe que está a bater no fundo, que o PCP também é um partido de protesto. Já não quer saber de ideologia nem de coerência nem de nada. Desde que votem no PCP, tanto se lhe dá que seja gente que nem sabe o que faz e tanto vota na esquerda como na direita desde que seja do 'contra'. Demonstra que populismo é populismo, pinte-se de esquerda, pinte-se de direita.
Aliás, num grande cartaz Ventura diz que 'é preciso acabar com isto tudo' e põe cruzes em cima de Ricardo Salgado, Sócrates, Medina e Costa. E, ao lado, Mariana Mortágua, num cartaz igualmente grande, diz 'Não lhes dês descanso'. Populismo igual a populismo.
Quando a minha mãe morreu, a senhora da agência funerária perguntou se queríamos serviço religioso. Sendo a minha mãe crente, respondo que sim, mas uma coisa breve, simples. Pois, para meu espanto e, confesso, desconforto, já para não dizer mesmo desagrado, o padre falou que se fartou, um verdadeiro comício. Só faltou apelar ao voto no Chega. Disse que o país não está preparado para receber tantos imigrantes e por isso que não nos admiremos por haver tanto roubo e tanta desgraça, que cada vez se ouve falar mais em miséria e nem sei mais o quê. Eu estava como estava, prestes a despedir-me de vez da presença física da minha mãe e a ter que ouvir um homem que, em vez de dizer umas palavras simples alusivas ao momento, resolveu pregar contra o sistema de uma forma básica, quase boçal. Não consigo reproduzir mais pois, se antes já estava triste e enervada, às tantas comecei a ficar mesmo revoltada. Pois devo dizer que vi algumas colegas e amigas da minha mãe a acenar com a cabeça, a concordarem, como se ele estivesse a dizer coisas acertadas. Escusado será dizer que os meus filhos e primos se mostraram, depois, incomodados, quase incrédulos com o que se tinha passado. Naquelas circunstâncias não me pareceu correcto interrompê-lo para o mandar calar e limitar-se ao que seria suposto. Mas fiquei a pensar que se, ali, junto a uma urna, numa capela mortuária, fez um tal comício, imagino o que será quando está à larga, nas homilias. E isto foi numa zona central de uma grande cidade. Imagino o que não será por essas igrejas afora... quanta lavagem ao cérebro será feita por estes padres, inchados de reaccionarismo...?
E enquanto o PS não perceber bem isto, este caldo de gente desinformada, que não quer informar-se, que não está nem aí, enquanto não perceber bem a forma como o Chega está a manobrar e a manipular as opiniões, e enquanto não conseguir encontrar um antídoto eficaz, o risco de a democracia sair seriamente beliscada vai continuar a aumentar.
Seria também interessante que a gente do SIS andasse em cima das movimentações de bastidores pois não me admirava nada que a longa mão de Steve Bannon, quiçá alimentada por Putin ou afins e sei lá por mais quem, essa gente obscura que tem vindo a manobrar nas catacumbas para manipular as opiniões públicas e para conseguir levá-las a perder a confiança nas instituições democráticas. Não estou a alucinar. Basta fazer meia dúzia de pesquisas sobre a erosão que as democracias liberais ocidentais vêm sofrendo ao mesmo tempo que o populismo mais descarado e destruidor vem subindo para se perceber que este não é um mundo inocente, habitado por piedosas virgens.
E, no entanto, ao contrário do que dizem o Ventura, o Montenegro, a Mortágua, o Raimundo e toda essa gente que tem alimentado a opinião pública com o insistente discurso de que 'isto está tudo mal', a verdade é que não está tudo mal. Pelo contrário, na verdade é francos sinais de que as coisas estão a melhorar e que já não estão nada mal.
Passo a palavra a três ilustres bloggers que sigo pela sua coerência, inteligência, e objectividade, esperando que não levem a mal que puxe, na íntegra e com as formatações de origem, posts seus que me parecem ser exemplares, muito esclarecedores.
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duas ou três coisas
É isto
Causa Nossa
Aplauso (34): Abaixo dos 100%!
1. Para quem, como eu, há muito anos considera essencial a frugalidade orçamental e a contenção do endividamento público - desde logo, porque fica caro! -, só posso saudar vivamente a notícia de que, apesar da grave crise da pandemia, voltámos a uma dívida pública bem abaixo dos 100% do PIB e que baixámos mesmo o stock da dívida pública em termos líquidos, retirando o país do clube dos países mais endividados. Um notável triunfo político!
Para além de confortável seguro contra qualquer crise orçamental superveniente, esta notável redução do peso da dívida pública traduz-se numa substancial poupança orçamental em juros, proporcionando maior flexibilidade na gestão da despesa pública aos governos que vêm.
2. Com este importante desempenho orçamental do governo do PS, um dos melhores da UE, ficamos menos longe e mais bem posicionados para atingir o objetivo do Pacto de Estabilidade da União, que é de 60% do PIB. Ponto é que os próximos governos não enveredem de novo pelo laxismo orçamental e pela "desbunda" na despesa pública ou num demagógico corte da receita, como deixam temer muitas das promessas eleitorais neste momento irresponsavelmente apresentadas por quase todos os partidos.
Neste quadro, é especialmente preocupante o programa do PSD, que, entre aumentos de despesa e um maciço e aventureiro "choque fiscal", propõe um rombo de mais de 5 000 milhões de euros nas contas públicas -, ou como um partido de governo outrora financeiramente responsável, passou a acreditar irresponsavelmente em operações de prestidigitação orçamental.
Eleições parlamentares 2024 (34): Azares do PSD
Como se não bastasse a pouco recomendável novela política sobre o governo regional da Madeira e a inquietante especulação sobre uma possível aliança de governo do PSD com o Chega nos Açores, no plano nacional acumulam-se as notícias pouco propícias, como a dos números sobre o crescimento do PIB em 2023, o maior da UE, ridicularizando a acusação de Montenegro sobre o "ciclo de empobrecimento" do País (como já havia mostrado AQUI).
Em condições normais, o PS deveria obter uma vitória folgada nestas eleições. Mesmo que o PS pareça não querer explorar excessivamente os resultados económicos da sua governação de oito anos, os portugueses não podem deixaram de notá-la, no emprego, nos rendimentos e no poder de compra. Não se vê como é que o PSD pode contrariar eficazmente este panorama daqui até às eleições.
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Com o país a crescer acima de média da União Europeia, a Segurança Social com um excedente de 5,46 mil milhões de euros, a dívida pública abaixo dos três dígitos - 98,7%, Portugal como o sétimo país mais seguro do mundo, o partido da taberna vai passar a campanha eleitoral a berrar nas ruas "Isto é monhés por todo o lado! Alguns até rezam virados para Meca!", "Um gajo quer sair à rua e não pode que é logo assaltado!", e o irmão gémeo Ilusão Liberal a martelar contra a carga fiscal, a AD - Anedota de Direita, contra o "gonçalvismo" que nos esbulha com impostos, coadjuvados pelos ex líderes partidários, agora comentadores "independentes", nas noites de domingo da televisão do militante n.º 1 e na CNN Portugal, mentira azar, a "carga fiscal foi de 38% em Portugal em 2022, abaixo da média europeia". Daqui até 10 de Março vai ser terrível com os "Goebbels" de pacotilha nas televisões.
[Link na imagem]
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Um dia bom
Saúde. Lucidez. Paz.
8 comentários:
Uns são desinformados, outros não. É sobretudo votar com os pés. Anda por aí um enorme descontentamento. Surpreende, mas anda, e é fundo.
Até eu votaria no Chega, só para abanar estes partidos onde já ninguém tem ideias mas apenas interesses. Não o faço porque não quero passar pela vergonha, passado este desassossego, de levar com um também tu. Pura e simplesmente não vou votar. Agora, pedirem-me para ir votar num partido tradicional (como os casamentos) nem pensar. Quem comeu a sopa que beba o caldo.
Fazem parte da minha leitura diaria, desde há imenso tempo. Há muito que abandonei os medias tradicionais.
Também eu estou perplexo com a atitude da geração pos 25A. Como? Porquê? Talvez a psicanálise possa explicar.
O exemplo acabado do que afirmo, é a atitude de João Taborda Gama, filho do ilustre socialista Jaime Gama, signatário do manifesto de apoio a AD! Fez tábua rasa do passado político da família, esquecendo que a própria mãe foi saneada do MNE pela AD.
O que se passa com esta geração?
O que têm comum? Comecemos por Vital Moreira. É um constitucionalista de renome e de créditos firmados que, quando escreve, concorde-se ou não, expõe os seus argumentos sobre a causa pública de forma sucinta, directa e alavancados em factos concretos. Continuemos. Seixas da Costa. Um ex-embaixador que tem um muito bom domínio da língua portuguesa e que é um excelente contador de histórias. Raramente acerta quando fala sobre política externa, é um conservador nato, um homem do establishment, mas isso é natural dada a imersão do mesmo durante décadas nos eclécticos meios das Bruxelas deste mundo. O José. O José é um anti-comunista primário (à semelhança da autora deste blogue), com muita bílis para descarregar e tempo livre em concordância. O que têm em comum? Seguramente, boas reformas, muito boas reformas e um total desfasamento da vida real das pessoas que dependem do seu trabalho para pagarem as contas no fim do mês.
Votar ou não votar.
A insuspeita Maria Filomena Mónica,
desiludida com a falta de evolução do sistema politico,
cristalizado na malha distrital do anterior regime,
os oartidos satisfeitos com os 230 deputados da lista dos boss artidários.
No 30 J de há dois anos:
Ficar em casa, tendo os dois coincidido com ta.
Antigo eleitor habitual no PS. Creio que como MFM.
José Monteiro
Car@ Anónimo@,
Se um dia acordar com os anti-democratas e os ignorantes e os proto-fascistas no poder sentir-se-á bem? Não se arrependerá de não ter votado?
Vá votar...
Caro Amadeu Moura,
Tal e qual. Custa a perceber. Felizmente os meus filhos votam e votam em consciência. Mas eu teria um grande desgosto se eles não votassem ou se desprezassem as conquistas do 25 de Abril.
Por isso digo: há que perceber bem estes fenómenos mas agir inteligentemente, há que conquistar as pessoas que parecem não dar grande valor à democracia.
Abraço.
Caro Lúcio Ferro,
Os reformados não trabalharam e não descontaram para poderem ter direito às suas reformas?
Que análise distorcida e enviesada de tudo.
Passe bem.
Caro José Monteiro,
A democracia pode ter defeitos mas é ainda o melhor regime político e, como tal, deve ser preservada. A liberdade e a democracia são sagradas. Podemos não concordar com este ou com aquele, podemos até ir atrás dos maus jornalistas ou das patranhas que circulam nas redes sociais.
Mas não podemos baixar os braços e deixar que o populismo e a anti-democracia se instalem.
Votemos nos partidos democráticos. Votemos com a cabeça.
É o que eu digo e direi enquanto tiver tino.
Um bom fim de semana!
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