Ontem ouvi Marcelo Rebelo de Sousa mas, quando ele chegou ao fim, faltou-me energia para comentar o Grande Comentador. A Covid continua a cercear-me a verve.
Hoje não estou melhor mas, paciência, acho que tem que ser. De resto, o tema é fácil de resolver numa penada. Marcelo esqueceu-se das suas funções de Presidente e, comunicador como é, deixou-se embalar, falando de tudo o que lhe perguntaram. Falou como um cidadão informado e com voz própria, como ser livre e amante da comunicação a quem é colocado um microfone e câmaras à frente. Falou do Governo, da Oposição, falou da Igreja, deu palpites sobre negociações com Sindicatos, enviou recados, deixou no ar algumas pontas boas para serem entrelaçadas por outros. Enfim, pintou a manta.
Mostrou estar em grande forma do ponto de vista analítico: avança com interpretações, decompõe vertentes de análise, projecta cenários. O problema é que embala no seu próprio entusiasmo e, às tantas, facilita, esquece-se de alguns pormaiores.
Mostrou ainda estar em grande forma como fazedor de factos: lança bicadas, dá com uma mão, tira com a outra, pisca o olho a um, dá um biqueiro a outro, a seguir desconstrói o biqueiro e sorri com ar de que para bom entendedor un demi mot suffit, constrói sound bites, intercala com a graça das radiações que o seu corpo já acumula. Diverte-se.
E, quanto à Igreja, interpretando -- e, neste caso, bem -- a descrença e a fúria que grassa nas hostes, cavalgou a onda da censura e do repúdio e atirou a matar no Dom Ornelas e nos que o rodeiam.
(Isto depois de lhes ter andado a pôr a mão por baixo e de ter andado ele mesmo a dar palpites sobre os palcos das jornadas da Juventude. Mas faz de conta que a gente já não se lembra)
Se lhe derem pano para mangas, ele mesmo irá fazer a faxina na cúria, na sacristia e por onde lhe pareça que a coisa fede. Isto, claro, para receber o aplauso da malta.
Vê sondagens todos os dias, as que são e as que não são publicadas e, de todas, a que mais o deve preocupar é a que se refere à sua aceitação junto do pagode. De cada vez que a curva desce, aí deve estar ele, noite adentro, a congeminar sobre o que há de fazer para que a malta volte a amá-lo. Se lhe parecer que deve dar uma canelada ao Costa, ainda que injusta, ele dá. Mas, se vir que o Costa fica sentido, ele passará a mão pelo pêlo do Costa e, em público, arranjará maneira de aligeirar a canelada, ou mesmo, dizer que não era nada canelada, era brincadeira de amigos.
Acima de tudo, Marcelo é um carente. Quer que a malta goste dele. Fazer o quê?
Resumindo: aproveitando a ocasião dos 2 anos de segundo mandato, avançou pelo terreno aberto que se abriu à sua frente. Não quis cá saber de contas públicas, não quis saber de poder estar a encalacrar negociações, não quis cá saber de, com as suas palavras, se Costa for na conversa, abrir uma caixa de Pandora. Isso não é com ele. Quem vier atrás que feche a porta, quem estiver com dores nos calos que descalce a bota.
No fundo, no fundo, ele é o Grande Comentador do regime. Espero que, em breve se crie uma Ordem adequada, não de Comendador mas de Comentador.
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Quanto ao Ornelas é o tiro ao lado em forma de bispo. O que ele diz e faz deixa o pagode de boca aberta. É ele e o Clemente. E eles e mais quase todos. Uma maltosa habituada ao bem-bom e a viver no vicioso hábito de ouvir e calar segredos, os próprios e os dos outros. No confessionário, na sacristia, na sala da catequese, na tenda, no escurinho do seminário, qualquer sítio é bom para conversinhas badalhocas, para apalpadelas impróprias, para gestos indecentes, para actos criminosos. Desde que todos se calem, está tudo bem.
Diz agora que se saiu mal, que foi erro de comunicação. Está bem, está. E diz que é heterossexual (e o que é que a gente tem a ver com isso?) e que não anda por aí a deitar-se (e o que é que a gente tem a ver com isso? Se ele se 'deitar' com um adulto que o consinta, o que é que a gente tem a ver com isso? E que conversa é essa das 'mamãs' e dos 'papás'? Que conversa é toda esta quando o que está em causa são os actos criminosos dos padres que violaram crianças e de toda a seita que, sabendo disso, os encobriu e desculpou?). Quanto mais fala, mais se enterra este Ornelas. É como o Clemente de ar pio: fala e a gente só pensa que, para ele ter dito o que disse, melhor fora que fosse mudo.
Salvam-se dois ou três que já se mostraram incomodados com a pouca vergonha que continua a ser a actuação da Santa Madre Igreja, essa casa do pecado onde alguns fiéis ainda teimam em ir.
Mas, de forma geral, a nível institucional, é uma vergonha e, volto a dizer, o Ministério Público deveria avançar com uma grande operação, a nível nacional, para procurar indícios de práticas criminosas em todo o lugar onde existe um padre, um bispo ou afins.
(*) No título, pífio atirador pois Ornelas atira nos pés, atira ao lado, atira para onde calha. Contudo, nunca acerta nos pedófilos. Acerta é na Igreja.
5 comentários:
UJM
Cada vez estou mais satisfeito de não ter votado Marcelo
A propósito de Marcelo "comentador", deixo aqui o endereço de um grande artigo de Miguel Monjardino de 1 Dezembro de 2022 no expresso, sobre Marcelo.
https://expresso.pt/opiniao/analise/2022-12-01-Como-o-flautista-de-Hamelin-o-comentador-Marcelo-poe-em-causa-o-futuro-de-Portugal-82c1adb7.
Já agora, UJM
Será que Marcelo considera os votantes que deram a maioria absoluta ao PS , uns totós?!
Requentados?! Marcelo, despreza o voto dos portugueses no PS, que o levou ao seu maior desgosto politico!
Um PR que apostou na humilhação do PS, e assim, levar a sua "reacionária direita, á qual, pertence politicamente" ao poder. Mas o povo, disse não a Marcelo. Aliás, se Marcelo fosse um politico de coluna direita, demitia-se imediatamente fruto da derroa que os portugueses lhe deram contrariando o seu calculismo politico .
Tal como aconteceu com Cavaco, voltamos todos, a ajudar Marcelo Rebelo de Sousa, a acabar com dignidade o seu mandato para dignificar o cargo.
O Presidente tem evoluído na matéria:
"... O Presidente da República não ficou surpreendido com o número de denúncias de alegados abusos sexuais cometidos por membros do clero sobre crianças. Questionado pelos jornalistas na tarde desta terça-feira, no Palácio de Belém, Marcelo Rebelo de Sousa referiu que as 424 queixas recebidas pela Comissão Independente para o Estudo dos Abusos de Menores na Igreja (CIEAMI) não será um número “particularmente elevado” ...
https://www.publico.pt/2022/10/11/sociedade/noticia/marcelo-abusos-igreja-haver-400-casos-nao-parece-particularmente-elevado-2023659
UJM,
permita-me postar um link do "Causa Nossa" de hoje, ao nosso Amigo: Anónimo
https://causa-nossa.blogspot.com/2023/03/o-que-o-presidente-nao-deve-fazer-35.html
Obrigada a todos.
Ccastanho, seguindo a sua dica fui ler o texto e juntei o blog à minha lista lateral de blogs a seguir.
Obrigada!
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