O dia foi quase tranquilo. O quase tem a ver exclusivamente com o facto de não sabermos estar sossegados. É o mal de se estar de férias num lugar em que há sempre coisas para fazer. Se estivesse num hotel não teria como pôr-me a experimentar cortinados ou a avaliar como melhor arrumar as toalhas turcas o móvel da casa de banho grande. Nem faria sentido ir comprar mais tinta para pintar móveis. Nem faria sentido andar de vassoura e pá de alumínio de cabo alto a varrer os caminhos em volta da casa. Estando num hotel, se uma pessoa se puser de perna estendida, não está a pensar que melhor faria se fosse fazer o que está mesmo a pedir para ser feito.
Mas, fazendo as coisas sem pressa ou obrigação, não cansa nem enerva. Simplesmente não dormi a sesta, não li nem fiz nada do que supostamente deveria ter feito e de que tão precisada ando.
Mas, tirando esses domésticos afazeres, o dia foi calmo. Pior mesmo foi conseguir que os do ikea dessem com isto. Quase duas horas a andarem em volta, a afastarem-se, a retrocederem, a telefonarem, perdidos, desorientados. Quando os vi, percebi que devem ter aterrado ontem vindos do Brasil para serem postos ao volante de um camião pelas estradas de Portugal.
Antes de aqui chegarem, pelo telefone, eu dizia ao que me ligava: 'Mas tem que me dizer onde está para eu poder ajudar'. E ele, aflito, 'Não conheço nada daqui, só diz igreja matriz'. E eu: 'Mas onde? Qual a localidade?' E ele 'Não sei, senhora, nunca vim antes por aqui'. Depois, ligava-me e dizia: 'Senhora, estou numa rua que diz Rua Direita'. E eu: 'Mas ruas direitas há muitas, vá andando até descobrir onde está'. Passado um bocado (e agora vou adaptar o nome mas mantendo o tipo de confusão): 'Senhora, passei num lugar que dizia Freguesia das Tubalas'. E eu: 'Tubalas? Tubalas...? Não será confusão...? Nunca ouvi falar.'. Ouvia-o a falar com outro. Depois: 'Vamos voltar atrás para ler melhor'. Passado um bocado: 'Freguesia das Tubalas'. E eu: 'Das Tubalas? Tem a certeza? Nunca ouvi falar. Não será das Tábulas?'. O outro dizia: 'Sim, sim, é isso: Tábulas'. E eu: 'Mas por onde vocês andam... Isso é longíssimo daqui... Prestem atenção. Subam por essa estrada em direcção à Estrada Nacional mas virem ao pé de uma fonte antes de chegarem à Nacional'. Passado um bocado, como não aparecessem nem dessem notícias: 'Mas por onde é que andam agora? Já passou tanto tempo.... 'Senhora, fizemos como a senhora disse, estamos na Estrada Nacional'. E eu: 'Oh não... Mas o que é que eu vos disse...?'
Escusado será dizer que o meu marido estava arreliado era comigo: 'Metes-te nisto não sei para quê'.
Mas tudo nisto foi de uma pessoa perder a cabeça. Quando finalmente chegaram e pararam perto da casa e quando abri o portão ao pé da casa para eles passarem com as coisas, para meu espanto vi-os a fazerem marcha atrás com a camioneta. O meu marido: 'Mas o que é que os gajos agora estão a fazer?' E eu: 'Sei lá. Ainda vão é deitar os muros abaixo'. Fui ter com eles e disse: 'Isto aqui é apertado para uma camioneta. Não é preciso pois vai ficar mais longe da porta do que se tivessem ficado onde estavam'. E um deles: 'Não senhora, assim é mais fácil'. Mentalmente disse: whatever. Tremi até que pararam o carro. Não deitaram nada abaixo mas não sei como.
Quando abriram as portas da camioneta aí, então, é que foi mesmo de uma pessoa perder a cabeça de vez: saltaram de lá dois gigantes bem encorpados, na verdade dois pedações de mau caminho, dois mulatos bem marrons, cabelo frisado crescendo em liberdade, cabeludos mesmo, brincos em cada orelha, uma coisa de a gente ficar à espera é que tirassem a tshirt e desatassem a fazer capoeira. Bonitos que só visto. Se tivesse que pontuar, ver-me-ia confrontada com a necessidade de ter que rebentar com a escala.
Mas não, foram comedidos, tiraram os pacotes (refiro-me aos que tinham transportado), tiraram fotografias aos pacotes, pediram um autógrafo e lá foram.
Espectáculo.
Tirando isso, acho que nada de mais se passou digno de destaque.
No outro dia o meu filho disse que nós tínhamos que ver a Veep na HBO e instalou-nos a dita. Um dia depois, quando eu estava a falar nisso, o meu mais crescido corrigiu: 'Tenho que dizer uma coisa, Tá. Por favor não digas HBO (lido à portuguesa: Agá Bê Ó). Percebi. 'Eich Bi Ô (lido à inglesa)?'. Ele sorriu, compreensivo e confirmou: 'Isso, Tá'.
Começámos e vimos dois episódios. Mas ou ainda não chegámos ao ponto ou não sei. Demos um tempo que é coisa que parece que, por vezes, resulta. E, no entretanto, começámos a ver o White Lotus. Parecia uma coisa ligeirinha, comédia de verão, mesmo a calhar para a disposição estival em que pretendemos posicionar-se. Mas a coisa foi tomando contornos de coisa imprevisível, uma inquietação sempre latente, um desconcerto que não poderia acabar bem, uma música perfeita, um ambiente entre o wanna be e o que infelizmente é, uns personagens... tudo. Prendeu-nos. Fomos vendo.
Ontem vimos uns, hoje despachámos o resto. Muito bom. Suspense com algum humor e com boa música à mistura. Recomendo.
Mas, então, ao fim da noite, neste dolce far niente que se instalou entre o estado de dormência e o de continuar sem assunto, fui ver as estatísticas do dia.
As visitas continuam a acontecer ao ritmo habitual, duas mil e tal visitas por dia, e as palavras colocadas nos motores de busca que trazem as pessoas até cá continuam a ter 'um jeito manso' ou 'blog um jeito manso' nos primeiros lugares.
Mas em terceiro lugar, hoje uma novidade de monta: homens e mulheres sem quecas. Nem mais. Ganhei o dia com esta. Sem quecas.
Pensei com os meus botões (que, por acaso, também não constam da minha indumentária de hoje -- e reparem na subtileza do também): mas quem procura isto, quererá ver homens e mulheres sem cuecas (tendo-se trocado na primeira letra) ou quererá mesmo ver virgens, abstinentes ou desinteressados, gente que não tenha umas quecas de vez em quando para animar a sua existência?
Uma pessoa quer servir bem os Leitores mas, sem esta desambiguação, como conhecer os seus mais íntimos desejos?
O melhor que posso fazer para tentar não desiludir completamente os pesquisadores dos sem-quecas é polvilhar o texto de imagens que talvez ilustrem o que se pretende. Caso não cumpram os requisitos, queiram lavrar protesto que tentarei esforçar-me um pouco mais a ver se, da próxima, não desiludo.
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E queiram, por favor, ter um belo dia, ok?
E, pelo menos em público, vamos lá a deixar estar as cuequinhas vestidas, está bem...?
3 comentários:
Bom dia,
Só para avisar que sem quecas não é o mesmo que sem cuecas. Terá sido propositado?
que·ca |é|
(origem obscura)
nome feminino
[Portugal, Calão] Relação ou acto sexual (ex.: dar uma queca). = BERLAITADA, PIRAFO
"quecas", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021, https://dicionario.priberam.org/quecas [consultado em 08-09-2021].
JPFerra
Demoraram a chegar, mas valeu a pena heheh.
Uma rica Mittwoch.
Para conseguir ler este post tive de ir à procura de outro post, um post-it dos grandes, para colar em cima do desfibrilador automático da Sharon ..
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