terça-feira, dezembro 03, 2019

Desvendado o mistério das meias desaparecidas.... e o da concha da sopa também.




Contei há umas duas semanas que, num mesmo dia, me desapareceram duas meias, uma de cada par  -- e ambas de forma inexplicável. Fiquei maçada e intrigada mas não preocupada. Não acredito em vudus ou magias macacas e, de resto, estou beige de saber que estas coisas, cá em casa, tão depressa desaparecem como aparecem.

A preta com as pintinhas brancas foi a primeira a aparecer. No fim de semana seguinte ao desaparecimento, na sequência da minha menininha ter estado aqui a maquilhar a tia, desapareceu-me um gloss cutâneo. Pensei que só podia estar aqui na sala. Na demanda, espreitei por todo o lado, revirei tudo, incluivamente arrastei o pesadíssimo sofá que é muito baixo e para debaixo do qual raramente vão cenas porque não cabem. Então, ao afastá-lo da parede... pimbas... lá estava o baton e... a meia preta. Ora... como? Como é que uma meia, que é coisa que não rebola, para ali se esgueirou...? Não encontro explicação. Mas nestas coisas eu não tento explicar, limito-me a aceitar. Com o tempo estou a tornar-me crente.

Subsistiu o desaparecimento da meia felpuda cor de rosa e branca. Já tinha desistido. Pensei que era um daqueles casos de sublimação que exemplificam as maravilhas da ciência. Claro que gostaria de ter assistido ao processo, uma meia felpuda a evaporar-se, mas pronto, foi-se, foi-se. Tem-se sabido de fenómenos ainda mais inexplicáveis.

Até que hoje...

Não fui directamente para o escritório pelo que coloquei o computador no porta-bagagens. Quando,  ao início da tarde, no parque da empresa, abri o porta-bagagem e me debrucei para puxar o computador, vi, para meu espanto, uma coisa cor de rosa a vir arrastada. Puxei mais. A meia. Disse alto: 'Ai... não acredito...' e desatei a rir. Ali sozinha, como quem assiste a uma aparição mas em cómico.

A meia, num daqueles tão vulgares movimentos de telecinesia, voou do quarto directamente para o porta bagagens do carro, uns pisos abaixo, na rua, e, certamente, uns metros adiante. 

Agora à noite, quando fomos caminhar, contei ao meu marido que a meia cor de rosa tinha aparecido. Ele não foi capaz de adivinhar. E eu vi-me aflita para contar, a rir à gargalhada, quase sufocada. Ele olhava para mim antevendo que dali vinha coisa.

Quando consegui articular palavra, ele encolheu os ombros. Como sempre, disse que não se admirava. Mas depois, pensando melhor, quis saber qual a explicação. Depois de muito pensar só posso admitir que, a não ser uma meia telecinética, só pode ter ido no meio de qualquer coisa. No outro dia, quando começou a esfriar, lembrei-me de levar para o carro, para um just in case, uma capinha de lã. Será que, antes de pegar nela para a levar, a capa pousou em cima da meia e a meia, com aquelas bolinhas anti-aderentes de repente aderentes, se agarrou à capa? Pois não sei. 

Nisto das coisas muito científicas ou transcendentais deixo para entendidos. Eu limito-me a aceitar. A meia ressuscitou e eu, sem a pretensão de querer questionar, só posso festejar o facto.

Esta, a fofa pink, e a outra, blackinha com pintinhas, quais gatas vadias, foram dar as suas voltas e agora que tiveram saudades dos quentinhos da mamã resolveram dar as caras e cá estou eu para as acolher.

Mas mais curioso foi o que aconteceu à concha verde da sopa. Há uns dois ou três meses, nem sei. Tenho um conjunto de utensílios de cozinha, comprados no IKEA, a que dou muito uso. Uma big pinça, uma colher de servir, uma espátula e uma concha de sopa. Tudo verde-alface. Até que um dia a concha desapareceu. Pensei logo que o meu marido, por algum motivo, a tinha deitado fora. Incriminei-o. Ele não gostou. Eu não quis saber: só podia ter sido ele. Procurei por todo o lado, na esperança de descobrir que ele não tinha cometido tão indesculpável acto. Mas nada. Claro que achou que eu não estava boa da cabeça: porque haveria ele de deitar fora uma concha da sopa? Não encontrei motivo mas só podia ter sido ele a dar-lhe sumiço.

Depois suspeitei da senhora que, meio dia por semana, cá vem limpar a casa. O meu marido ficou chocado com a minha suspeição. Tentei racionalizar, encontrando um motivo para justificar a suspeição. Mas não me ocorreu. Obviamente tive a decência de não a deixar perceber a minha suspeição.

De vez em quando, intrigada, voltava a revirar gavetas, a espreitar para dentro de armários. Mas nada. O meu marido, quando me apanhava naquela demanda, dizia: esquece a porcaria da concha. Fiz por isso. 

Até que no domingo, de manhã, quando acordei, o meu marido nem esperou que eu saísse da cama: Lembras-te da concha da sopa?

Tive vontade de o corrigir: da defunta concha da sopa. Mas a curiosidade impediu-me de perder tempo. Então? 

E então diz ele: achei a concha, uma afiador de facas, uma pinça de inox da salada, um quebra-nozes, uma pega, um pano das mãos. Estava estupefacto. E eu ainda mais fiquei: Onde? Conta.

Diz ele: resolvi afiar uma das facas mas não encontrei o afiador na gaveta onde estava, a última, a de baixo. Estive à procura na gaveta e, quando fui fechá-la, ela não fechava. Então puxei-a para fora e, lá atrás, estava tudo aquilo. Perguntei-lhe como foi isso possível. E o que se passa é que os carris daquela gaveta não vão até ao fundo, deixando aquele alçapão secreto.

Portanto, tudo está bem quando acaba bem.

Quando as coisas se perdem de mim, acabam por voltar para mim. As pessoas também.

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E tendo estes invulgares eventos a reportar, ainda não foi hoje que distribuí presentes: livros ou objectos úteis. Talvez amanhã.

As fotografias que mal-empreguei aqui, dispondo-as por entre meias usadas e conchas da sopa, são da autoria de Nick Knight, homem talentoso para além da conta.

Para acompanhar, só podia aqui ter Bruce Springsteen não por ser o Boss mas porque canta como gente grande e há dias assim, em que me sabe bem ouvir gente grande. Também podia ser uma marcha militar que uma vez, por entre anjos perdidos, me maravilhou. Infelizmente há rastos que teimam em esvanecer-se. Mas talvez sejam como as meias ou a concha da sopa e um dia voltem.

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E dias felizes para todos que aí estão, desse lado, a ouvir a minha respiração

2 comentários:

Lucilia disse...

Olá UJM,por falar no Boss -"Springsteen On Broadway", gostei muito.
Um beijinho

Um Jeito Manso disse...

Olá Lucilía,

É o máximo, não é? Gosto imenso de o ouvir nesta canção. Uma voz grossa, grossa, mas que pode ser tão macia... não é?

Beijinho!