Não se assustou. Limitou-se a aceitar a triste condição.
Fechou as janelas, apagou as luzes e deitou-se no chão. De olhos abertos, fixando a leve penumbra. Quase sem pensar.
Depois fechou os olhos. Sem palavras que acompanhassem a desistência.
Depois fechou os olhos. Sem palavras que acompanhassem a desistência.
E, no entanto, do chão, como que subindo da terra, chegavam-lhe sons, talvez súplicas, talvez preces, talvez apenas silenciosos lamentos. Silenciosos lamentos subindo da terra. Ou, talvez, descendo das estrelas.
Não tentou percebê-los pois bastava-lhe senti-los. Olhos fechados, os braços cruzados sobre os seios nus, um abraço imaginário que, de longe, lhe chegava, um sussurro longínquo que parecia tentar serená-la, a ela, abandonada, sem palavras.
Ouvia uma música mas não sabia se a ouvia, se a sonhava. Alheada, atenta apenas ao silêncio que adivinhava subindo do coração de quem, lá longe, abrindo as mãos, soltava na noite palavras transparentes, generosas como pássaros cantando na suave madrugada.
Mas nada a consolava porque ela estava como que sem vida.
Tinha ouvido de estradas da morte, de vidas perdidas, de casas queimadas, sabia da cinza que tudo cobria, dos escombros onde as memórias se tinham desfeito, de um homem que sofridamente falava da mulher e das filhas perdidas para o fogo, da avó que quis salvar a neta e com ela se perdeu, sabia de todas essas aflições sem retorno. E, apesar de, nesse momento, lhe parecer que nada mais poderia haver no mundo, impedia as lágrimas, como se as suas lágrimas não fossem dignas da dor alheia, como se não pudesse sofrer por eles, sobretudo porque se sabia cobarde ao não perceber como poderiam aquelas pessoas voltar a viver depois de tamanho sofrimento. As palavras como que tinham sido sugadas por aquela desmesurada inclemência. A compaixão que sentia não era nada face à coragem dos que sabiam continuar de pé. Ela não. Ela caída, exangue, quase sem respirar. As palavras tinham desaparecido e as que, de longe, lhe chegavam em vão tentavam acordá-la. Em vão. Em vão. Um sono pesado parecia abater-se sobre o seu corpo derrotado. Ouvia-se dizer, como se o dissesse sem palavras, apenas com um olhar triste como nunca ninguém o tinha visto: deixa-me chorar.
Lascia Ch'io Pianga, ouvia como que num sonho emudecido, perdido entre pesadas nuvens. Lascia Ch'io Pianga.
E, então, as súplicas pararam, a música estancou, a penumbra escureceu. E, como que perdida num imenso vazio, entre silêncio e sombras, deixou que as lágrimas corressem, sem palavras, inundando a desolada noite.
Lascia Ch'io Pianga, ouvia como que num sonho emudecido, perdido entre pesadas nuvens. Lascia Ch'io Pianga.
E, então, as súplicas pararam, a música estancou, a penumbra escureceu. E, como que perdida num imenso vazio, entre silêncio e sombras, deixou que as lágrimas corressem, sem palavras, inundando a desolada noite.
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Não sei se o texto que acabei de escrever vem na continuação de Um coração negro como a noite
E continua em Outros tempos. Sem pena, sem arrependimento
E continua em Outros tempos. Sem pena, sem arrependimento
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