sexta-feira, agosto 16, 2013

'Subitamente, no mês de Agosto', com Richard Avedon, Mario Testino, Tim Walker, os meus cães fiéis, os meus trendy gatinhos, os meus amores ciumentos --- [Mas sem a Drª Marta Rebelo porque no meu canil e no meu gatil mando eu, eu e só eu. Além disso ela já não é Provedora dos Animais, para que haveria de estar aqui, ora essa? ]

Gosto muito de animais. Muito. Muito. Gatinhos, tanto que eu gosto deles.

Ao fundo do meu jardim tenho um gatil. Felpudos, vaidosos. Pós-modernos. 

Gosto de me deitar no meio deles. Toda nua mas com uma unha de cada cor para fazer pendant com eles. Nada de cores fortes, não, cores suaves, mimosas como os meus doces gatinhos.



Mas também amo cãezinhos. Amo de paixão. Amo. Mas esses não os tenho no jardim, tenho receio, sei lá. Receio que se peguem com os pussy cats, não quero correr o risco. Por isso, o canil é no meu closet. Não há problema, são limpos, tenho-os sempre escovados, tratados, pêlo tratado com amaciador, máscara hidratante. Sentam-se nas bergères e fazem-me companhia. Quando me visto e dispo olham-me apreciadores, invejosos. Tenho que ter algum cuidado, no entanto: já não é uma nem duas vezes que surpreendo um olhar malicioso, uma troca de olhares entre eles, não sei. 


Brinco muito com os meus amiguinhos, tão fiéis, tão brincalhões. Tomo-os nos meus braços e eles entregam-se, generosos, meigos. Há um, todo branco, macio, macio, que me olha nos olhos, que me desafia. Finge-se de paciente, deixa que eu o pegue, que o levante no ar, e nada me diz. Nessas alturas visto-me de branco para ele perceber que quero que ele me aceite como uma sua igual, uma gatinha branca. Ainda hoje o fiz. Mas reparei um olhar de censura nele. Só, depois, quando, preocupada, me vi ao espelho é que percebi: o soutien era preto. Que gaffe!



Mas depois há um outro, nada a ver com os restantes, nada de mignon, é um big guy, negro, impõe respeito. Não tenho preconceitos, vocês sabem, mente aberta. Não tenho que esconder os meus amores, era o que faltava. Sou uma mulher livre, moderna. Adoro animais, adoro, para quê negá-lo? 

Por isso, de vez em quando, tiro-o do canil e vou lanchar com ele. Visto-me de branco para que melhor se acentue o contraste. Eu virginal, ele feroz. Mas é só aparência, ele é um querido, meiguinho que só ele, estico o meu braço sobre a mesa e assim faz ele também, e ali ficamos em silêncio, olhando-nos nos olhos, ele e eu.

Não sei se era do calor ou se quê mas todo o tempo olhava para mim, olhar fixo, de boca aberta.


Mas o meu amor por animais não se extingue nos cãezinhos e nos gatinhos, ora essa, claro que não. Por isso, não tenho apenas um canil e um gatil. Tenho também uma capoeira. A grande sala da minha casa é agora uma capoeira. As paredes amaciadas pela patine são o décor perfeito para as minha belas aves. E para mim.




É com os faisões e pavões que aprendo a arte da sinuosidade, da subtileza. Visto-me com um vestido justo, leve, alvo, complemento-o com plumas, uso-as como asas, ou como uma coroa, e arrulho. Sei que há alguém que costuma ser sensível ao meu canto. Ao meu assobio. E espero. Espero uma resposta, um assobio de volta. Assalta-me, então, uma dúvida e, em silêncio, pergunto-lhe: You know how to whistle, don't you? Como ele não responde, não diz nada, grito-lhe: une os lábios e sopra...! Vá...!

Estou no chão, e agora não sou uma gatinha trendy, nem uma coquette a brincar com os pet dogs, esses fofos. Agora não, agora sou a que chama, a que tem o corpo em chamas.

E então ouço. Um rugido. Não. Dois. Dois rugidos. Solto o meu canto de ave branca e espero. De novo ouço rosnar. Um som cavo, raivoso. O som dos ciúmes em fúria. Não me levanto, não preciso espreitar para saber o que se passa. São eles, os dois animais possantes que disputam a minha atenção. Fofos, tão queridos. Gosto de os saber assim, viris, dentes de fora, olhar cortante.



Aguardo então que resolvam a contenda entre eles. Sei que, daqui a nada, o meu amor me aparecerá, vitorioso, clamando recompensa.



Mas, quando ele aqui entrar, não vai encontrar uma gatinha pós-moderna, uma ave sinuosa, uma cadela pura. 

Vai encontrar-me a mim tal como sou nas noites de estio, uma loba, uma loba que desce da montanha, arfando, que busca o seu amor, uma mulher selvagem, sem regras, sem leis.

Depois se verá. A noite é longa. E quentes e perigosas são as longas noites de verão. 



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Tiger in the night, Katie Melua




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Até certo ponto, este post foi inspirado na leitura dos textos intitulados 'Subitamente, no mês de Agosto', no Malomil. Depois desse ponto, tresmalhou-se e não se inspirou em lado nenhum.

As fotografias usadas são de Tim Walker, Richard Avedon e Mario Testino.


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A seguir a este post, se descerem um pouco mais, terão o que pode ser chamado 'serviço público à moda de o Um Jeito Manso' e que trata da análise do curriculum de Agostinho Branquinho numa tentativa para perceber porque terá ele sido escolhido para aquela Secretaria de Estado. Antecipo já aqui a conclusão: não dá para perceber.

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E muito gostaria ainda de vos convidar a darem uma esticada até ao meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa. Hoje, por lá, as minhas palavras andam caídas, no meio das chamas, guiadas pelo coração escarpado de Herberto Helder. Segue-se-lhe a música é de Aline Frazão.

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E até parece que é segunda feira. Mas não: felizmente é sexta feira. Gozem-na muito bem, ok?


1 comentário:

Anónimo disse...

nestes dias de sol, a sombra nunca fez mal a ninguém.