quinta-feira, março 23, 2023

Horas e horas e horas e horas nas urgências de um hospital (público).
Ou seja, não acontece apenas aos outros.

 

Ouve-se nas notícias, percebe-se que é do caraças mas parece que é coisa que está longe. Não está. Estamos todos sempre perto de tudo.

Não vou entrar em pormenores. Não apenas não me dizem directamente respeito como são irrelevantes para o caso que aqui me traz. Mas quero dizer que chegámos ao hospital às duas da tarde e saí de lá à 1 da manhã. É fazer as contas. E é isso que aqui me traz.

E saí porque, à meia noite e tal, a senhora da segurança me sugeriu que fosse bater à porta da triagem e pedisse ao enfermeiro que fizesse o favor de me informar. Senão, se calhar a esta hora ainda lá estaria.

Um enfermeiro bem simpático percebeu a minha preocupação e impaciência, foi ao sistema e disse-me que ela estava a ser medicada, que ia lá passar a noite e que amanhã reavaliariam. Perguntei porque é que não tinham informado antes. Disse-me que, sim, eu tinha razão, deviam tê-lo feito pois já um bom bocado sabiam disso, mas que não deveriam ter conseguido mas que eu, se estivesse com o médico, de manhã, o questionasse. Provavelmente já será outro e a justificação já não servirá de nada.

Entretanto, a minha mãe (tal como eu) estava praticamente sem carga no telemóvel. Perguntei ao gentil homem da triagem se não haveria por lá carregadores. Sorriu, encolheu os ombros, disse-me que aquilo são as Urgências... como poderiam ter carregadores...?

Não disse nada mas pensei: poderiam, sim, é barato e resolveria muitos problemas e evitaria muita ansiedade. Quando eu tive um episódio cardíaco há ano e picos e fui de charola para as Urgências, numa ambulância com luz azul e um ti-nó-ni a atravessar os ares, tendo lá passado a noite e a manhã, também sofri horrores a ver o telemóvel a ficar sem bateria, o meu marido, os meus filhos e os meus netos a ligarem ou a mandarem mensagens e eu a ver-me a ficar incomunicável. E, claro, carregador que pudessem emprestar, nicles.

Agora é a minha mãe que está na mesma. Aflita com medo que a carga se esgote.

Eu, entretanto, já estou em casa, já tomei banho, já comi um iogurte e uns frutos secos e já tenho o telemóvel a carregar. Mas ela provavelmente vai ficar sem conseguir ligar ou atender chamadas ou mensagens e toda enervada.

Durante toda a tarde estive sem perceber o que se passava. Tentava saber, telefonando-lhe ou trocando mensagens, e nada de concreto, apenas um sistema empastelado. O médico viu-a pouco depois de chegar. Vinha com uma carta do centro de saúde, foi logo para a chamada sala aberta. Depois ao longo da tarde foi fazendo exames e depois até às onze da noite esteve à espera dos resultados. Pelo meio houve mudança de turno, nova equipa. Depois parece que apareceram reanimações, outras e compreensíveis prioridades, e o médico esteve desaparecido. Perto da meia noite apareceu, perguntou-lhe como estava, auscultou-a, e disse-lhe que se calhar podia ir para casa. Depois disse que se calhar não porque a filha se tinha ido embora. A minha mãe disse que achava que eu não me tinha ido embora, que não iria sem lhe dizer. Depois o médico foi ver e disse que era confusão. E que ia falar com outro médico e já lhe dizia.

E voltou a desaparecer. 

Eu trocando mensagens com ela ou telefonando, e nada, o médico desparecido e a enfermeira que, pouco tempo antes também tinha dito que se calhar ela ia para casa, depois também não sabia.

Até que à meia noite e tal, sem saber se deveria ali continuar à espera, horas e horas e horas, lá fui bater à porta da triagem e lá soube o que contei acima, que ela lá ia ficar.

O que é isto? Desorganização? Falta de consideração pelos doentes e pelas respectivas famílias? Isso tudo mais falta de sentido de gestão na equipa que dirige o hospital?

E porque levam tantas horas a ter os resultados dos exames? Há algum estrangulamento no laboratório ou na imagiologia que esteja a causar tamanhos atrasos? Será que, se resolvessem isso, não resolveriam muitos problemas a jusante?

Tenho experiências de idas a urgências e internamentos no Público e no Privado e uma coisa é certa: há um problema severo de (des)organização e de comunicação no Público. Não vejo que haja diferenças a nível de competência ou de qualidade de serviço. Mas na organização e na disponibilização de informação há uma terrível diferença.

Uma coisa que o Ministério da Saúde poderia fazer seria tentar replicar o modelo de organização e gestão de um hospital privado num hospital público. A CUF pode ser um bom modelo pois já teve inclusivamente a responsabilidade pela gestão de hospitais públicos. Num hospital privado não há mais recursos nem se ganha mais. Do que sei o que há é um foco na boa gestão, com indicadores internacionais que o comprovam. 

Bem, são quase três da manhã, estou cansada, foi uma tarde e uma noite stressantes. Fui lendo os comentários e tenho pena de não responder, mas não consigo. Pode ser que esta quinta-feira a tarde seja tranquila e consiga. 

Enfim. É a vida..., como dizia o outro.

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