quarta-feira, junho 01, 2022

La Madre Panza e outras alegres maluqueiras

 

A reunião da tarde transbordou e ia sobrepor-se à que se seguia. Por isso, foi interrompida para saltarmos para a seguinte e recomeçará quando agora o sol nascer. Não é prudente ter reuniões comigo antes de ter descido em mim o manto diáfano da paciência, coisa que jamais pode acontecer à hora destinada às galinhas, não às pessoas. Mas parece que não havia alternativa pelo que me submeti; e agora quem optou por se pôr a jeito que se previna que eu, em situações adversas como esta, não respondo por mim.

Também aconteceu aquilo que às vezes acontece: uma pessoa que não deve muito à inteligência tentou, uma vez mais, infiltrar-se em momentos da reunião que não lhe são destinados. 

Há aspectos que ninguém valoriza, que continuam ausentes da formação académica dos comuns mortais: 

1. O primeiro é que continua a não ser obrigatório que do primeiro ao último ano da escolaridade obrigatórias e facultativa, mormente até que a pessoa acabe a licenciatura e o mestrado, a língua portuguesa seja obrigatória. 

Não sei como é convosco mas em mim provoca uma reacção somática violenta. Ao ser testemunha disso, penso que não vou aguentar-me sã de corpo e espírito com pessoas a darem assertivos e violentos pontapés na gramática. Fico doida. Faria-se, quaisqueres, há-des. E, por escrito ainda mais umas pérolas: à dois meses, pensa-mos. Atentados que me deixam ferida por dentro e por fora. E quem os comete continua ladino que nem um videirinho, sem qualquer empatia para com as suas vítimas.

Não sei como se age. Eu faço de conta que não se passou nada. É como se, em plena reunião, alguém desse um sonoro e mal cheiroso pum e toda a gente, eu incluída, fingíssemos que não tínhamos dado por nada e o autor continuasse na maior, impune, fresco e fofo.

2. O segundo é que continua a não ser obrigatório haver disciplinas em que a malta aprenda a lidar com malucos e com parvos. Uma pessoa vê-se e deseja-se para lidar numa boa, com uma tentativa elevação, com um maluco. Ou com uma parva. Maluquice e parvoíce não são a mesma coisa. É como a estupidez. Também não é a mesma coisa. Conheço um que é aplicado, trabalhador até dizer chega, sempre disponível. Mas burro que nem uma porta. Só que, para além de burro, é estúpido. Prejudica aquilo em que mexe e prejudica-se a ele próprio. E burro como é, acha-se incompreendido. E eu presencio isto e fico sem saber como lidar com uma ave assim.

Como se lida, com civismo, com a burrice, a maluquice, a parvoíce, a estupidez?

Não sei. 

A minha vontade é levantar-me e dizer: Acabou. Não dou mais para este peditório. Já chega. Mas não o faço. Continuo. Finjo cordialidade. Descubro em mim poços sem fundo de paciência. Mas não serve de nada. Gente parva, burra, estúpida e maluca não agradece.

Quando me reformar e puder falar à vontade hei-de escrever um livro com um título assim: 

Pergunta: porque é que Portugal não é mais competitivo? 

Resposta: porque os gestores são bonzinhos demais com os burros, com os estúpidos, com os parvos e com os estúpidos.

Ou, então, um outro: 

Manual de sobrevivência num mundo de analfabrutos que nem falar sabem

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Bem. Vou calar-me que isto hoje está de mais. E não é TPM, não senhor, é mesmo a reacção dolorida de uma pobre massacrada. 

A propósito: não sei se é por Espanha ou se também já é por cá, pela mão da fofinha do PAN, que as mulheres vão poder baldar-se ao trabalho quando estão com o período. E não falo assim, de forma depreciativa, por já estar livre disso. Não me parece que faça sentido (exceto nos casos de doença). Dói um bocado a barriga mas nada que não passe com um comprimidozeco. O que me parece que é complicado é uma pessoa trabalhar quando está na antecâmara da coisa, com TPM. Aí é que é dos outros se protegerem da fera. Falo por mim. Quando a coisa estava para aparecer, só não matava cachorro a grito por milagre. Ai de quem se cruzasse no meu caminho. E se, por decoro e educação, no trabalho tentava conter a fúria que grassava descontroladamente dentro de mim, quando chegava a casa e o meu marido tinha a pouca sorte de abrir a boca, a raiva saía de mim em potentes golfadas. Por isso, a bem da paz na sociedade e admitindo que eu não era caso raro, o que acho é que deveria ser mandatória a retenção em casa de todas as mulheres na véspera de menstruarem.

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E pronto, vou calar-me. 

As fantásticas fotografias -- um concurso de barrigas em Manágua, Nicarágua; um café para cães (apenas para cães) no Dubai, o Happy Bark Day; um robot em forma de animal de carga no Japão; um homem a votar em Sydney, Austrália; e um cavalão a cavalo no Kosovo -- podem ser vistas no Guardian (aqui e aqui).

O pas de deux, ou melhor, o pas de trois está a cargo de Wilson Keppel & Betty - Sand dance + extra stair dance
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Desejo-vos um dia bom
Saúde. Serenidade. Paz.

4 comentários:

Arménio Pereira disse...

"Pergunta: porque é que Portugal não é mais competitivo? "

Resposta a): porque está pejado de gestores, sobretudo políticos, e de políticos, sobretudo gestores.

Resposta b): porque está pejado de portugueses que, por atavismo luso, não se governam nem se deixam governar. (Os portugueses, p'ra sempre deambulando no fado hiato entre o que foram e o que poderiam ter sido, nessa mítica, brumosa ilha dos desAmores, perdida algures entre o Saudosismo e a Esperança, as duas grandes endemias pátrias, os dois principais narcóticos nacionais.)

Carlo Cipolla argumentou (aqui) - e eu subscrevo - que não existem mais pessoas estúpidas num dado grupo em relação a outros, o que existe é sempre um número insuspeitado - e subestimado - de pessoas estúpidas seja em que colectivo for. O que diferencia uma sociedade mal sucedida - como a portuguesa - é a conjugação de dois factores: a assustadora proliferação em cargos de poder de pessoas mal-intencionadas com tendência para a estupidez e o aumento alarmante do número de pessoas indefesas*.
No caso português acrescentaria uma especificidade: as pessoas mal-intencionadas em posições de poder têm facilitado sistematicamente o acesso de pessoas estúpidas a cargos de relevo nas hierarquias. (Que é como quem diz: adicionar insulto ao dano - adding insult to injury.) A prazo isto irá funcionar em detrimento dos próprios bandidos, mas infelizmente não antes de dar cabo do país.

* Cipolla identifica quatro grandes grupos:
- Pessoas inteligentes: capazes de gerar benefícios para elas próprias e para outrem (contribuintes líquidos para o bem-estar colectivo.)
- Pessoas mal-intencionadas (bandidos): aquelas que ganham à custa de provocar perdas para outrem (meros agentes de transferência de activos.)
- Pessoas indefesas: as que perdem a favor doutrem (meros agentes de transferência de activos.)
- Pessoas estúpidas: as que provocam danos ao colectivo a que pertencem sem obter qualquer ganho pessoal ou incorrendo mesmo em danos para si próprias (contribuintes líquidos para o mal-estar colectivo.)

João Lisboa disse...

"continua a não ser obrigatório que do primeiro ao último ano da escolaridade obrigatórias e facultativa, mormente até que a pessoa acabe a licenciatura e o mestrado, a língua portuguesa seja obrigatória"

É um desespero. A maioria das vezes consigo controlar-me e não provocar demasiados estragos. Mas já houve momentos em que foi mais forte do que eu e fez faísca...

Um Jeito Manso disse...

K.,

Ora cá estão duas espécies que já percebi que abomina: os gestores e os políticos. Mas a sua inteligência deixa-o embarcar na ratoeira das generalizações? Todos os gestores são uma desgraça? Todos os políticos uma tragédia? Pense lá bem nisso.

Mas há uma macro-espécie que já percebi que ainda lhe causa mais brotoeja: a dos portugueses. Ora porquê? Não há portugueses que se aproveitem? Nem o meu Caro se aproveita?

Quer dizer qual seria para si a conjugação perfeita (Nacionalidade + profissão)?

Quanto às classes, parece-me uma boa sistematização e concordo com a descrição. O meu Caro inclui-se onde? Presumo que, por modéstia, não se inclua nos inteligentes mas, sim, nos indefesos. Certo?

Um Jeito Manso disse...

Olá João,

Para mim existe uma situação ainda mais aflitiva: é quando, perante um grupo em que todos dizem ou escrevem disparates, sentir que eles devem achar que eu não sei falar ou escrever.

Complicado.

Cada vez mais gente que não sabe falar nem escrever...

A semana passada encaminharam-me um mail de um delegado sindical. Não há linha que nao tenha dois ou três erros ortográficos. Alguns impensáveis. Parece uma anedota. Li e fiquei quase na dúvida se aquilo era a sério. E era.

Estaremos a caminhar para o fim dos tempos, João...?