quarta-feira, maio 13, 2020

Um mundo em mudança. Até em coisas em que mais valia estar quieto





Mudei outra vez de poiso. Tento encontrar um lugar mais recatado. Mas não é fácil. Tal como as casas com que sonho quando sonho com casas, também numa certa área da minha casa não há portas. Passa-se de umas divisões para as outras por desníveis, por recantos. Portanto, quando em videoconferências, tudo se ouve de umas para outras. Quando são reuniões simples, sem relevância por aí além, não há problema em ter os meninos na minha mesa ou toda a gente circulando por onde estou. Mas se a reunião é sobre tema crítico, então prefiro que não haja barulho de porta da rua a abrir e fechar, um e outro para trás e para a frente, vozes, conversas. Mas não há lugar. Só se for mais longe mas aí não há boa cobertura de rede. Também poderia ir para a rua mas chove, faz frio, sempre muito inconveniente.

Mas estava eu a participar nas usuais meetings, os meninos nas suas aulas, ouvi um a olhar para um canto e a dizer: 'olha, uma aranha com um totó'. O outro levantou-se e foi conferir. 'Pois, parece'. Mais tarde, o diagnóstico era outro: 'aquela aranha está grávida' e o outro 'pois, se calhar está'. 

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Agora, quando se despediram para irem para o estúdio, mostraram-me: 'aquela aranha não está grávida?'. Olhei e disse: 'Tu é que estás... maluco'. Ia sair-me 'tu é que estás grávido!' mas, quando dei por isso, substituí por maluco. Antes estar maluco que grávido, credo. Mas depois olhei melhor para a aranha e parece que tem um grande ovo pendurado. Se calhar é isso mesmo. Disseram-me que se calhar era melhor matá-la porque senão nasciam centenas de aranhas. Mas matar um animal grávido faz-me impressão. Disse-lhes que o avô logo avaliaria a situação. Um dos meninos disse: 'se não a matares agora, ela morre de qualquer maneira'. Perguntei porquê. Disse-me que quando nascem os filhos elas morrem. Não sei. Sou ignorante sobre cada vez mais coisas. 

Quando cá chegaram, eu imaginaria que depois de estar tanto tempo sem estar com eles, os estranharia por estarem maiores, diferentes. Afinal o que chamou a minha atenção foi estarem branquinhos, ar um pouco enfiadinho. Estarem confinados num apartamento não estava a fazer-lhes bem. Saíam de vez em quando mas não era suficiente. Ao fim de menos de uma semana, já estão rosados, já mais bochechudinhos. Correm e brincam e comem todo o dia. O meu marido está sempre a dizer: o pior é a logística. No outro dia, acho que no sábado, foi ao supermercado. Entre muitas outras coisas, trouxe carradas de pão. Quando vimos aquilo, gritámos as duas: 'Que exagero!'. Pois bem, já só vai dar para amanhã. Fruta também quase não há. A minha filha diz: 'já estão a ver o que foi estes quase dois meses... todo o dia a comerem... eu a querer ir poucas vezes às compras...'. Pois. Devoram tudo. 


Fiz hoje uma tachada das grandes de bacalhau à gomes de sá. Pensei: dá para o jantar e para o almoço de amanhã. Qual quê? Dará para o almoço deles mas já não para nós dois. O que vale é que ainda há para ali uns restinhos do outro dia. De qualquer forma o meu marido há bocado disse-me: 'não é só a eles que os ares do campo estão a fazer bem'. Temi o pior: 'Mas quê? O que é que queres dizer com isso?'. Ele: 'Eu? Nada...' Receei que fosse o que me estava a parecer: 'Estou mais gorda...?'. A minha filha riu-se: 'Não...' Olhei-me ao espelho: estou mais gorda, sim. E não pode ser das sobremesas que ela tem feito, que está cá há pouco tempo. Na volta também ando a comer demais. Tenho que deixar de jantar, por exemplo. Chá e chá, talvez. Na volta até ajudo na logística.

Nestas alturas, penso: como deve ser difícil para quem não tem dinheiro, para quem tem casas pequenas e está em teletrabalho e com crianças em telescola, ou para quem não tem trabalho e vê as economias a esvairem-se, para quem passa por dificuldades, para quem não tem saúde. Como deve ser difícil para tanta gente que tem medo do futuro. 


Tomara que tudo isto se resolva rapidamente, tomara que nasçam novas oportunidades, que a economia reanime, que haja trabalho, rendimentos justos e futuro para toda a gente. Tomara. O pior é que não vai ser tão cedo que as coisas vão voltar ao que eram -- pelo menos, para muitos, a nível de desafogo.

Porcaria de situação esta que deve estar a deixar tanta gente desesperada. Quando penso nas minhas dificuldades e me lembro que são nada quando comparadas com as de quem está, de facto, a passar um mau bocado, até me sinto mal. Depois fico a pensar que o diabo disto é que a gente não sabe mesmo quando é que vai desaparecer esta malfadada nuvem negra que paira sobre o mundo.

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Tirando isso: não sei o que raio me aconteceu com esta porcaria do blogger. Deixou de me aparecer o formato normal quando quero fazer um post. Não consigo fazer as coisas mais banais. E o pior é que, a esta hora, me falta a pachorra para andar à procura de uma explicação para o que aconteceu. Será que tudo tem que andar a mudar a toda a hora? Não basta termos mudado de vida? Não basta o mundo ter mudado? Gaita.

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As imagens são muito bonitas, não são? Pudera, são do melhor que há e algumas das The 2020 BigPicture Natural World Photography Competition. E vêm ao som do Smile de David Gilmour. Não sei se já perceberam que tenho um xodozinho por ele...

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Saúde tudo a correr bem, ok?

2 comentários:

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Não há dúvida que este bicho é manhoso e enquanto não lhe forem postas rédeas estaremos no vai não vai e a viver cada fase no seu momento e a gerir toda uma panóplia de necessidades fundamentais que vieram a ser agravadas por este momento da história.

Valham-nos as coisas belas que o rabudo, o carcará não consegue dar conta e que nos enchem da esperança que deve governar estes tempo.

Uma bela 4f.

Pôr do Sol disse...

Essa vontade de acalmar carências, parece ser comum a todos os jovens e não só.

Fico feliz por ter alguns dos seus meninos consigo. É meio consolo.

Os jovens, por aqui, descobriram as maravilhas da Bimby, e trocam receitas com os colegas e amigos. Pão, bolos, bolachinhas, snacks e tudo o mais. Esvaziam a despensa em tres tempos só que na fuga às grandes superfícies, a nova mercearia da rua não é solução. Tem tudo, mas ao dobro do preço.

Se por um lado esta novidade dá imenso jeito aos pais, pois libertam-nos para o tele trabalho e ajudam nas refeições, por outro arruínam-lhes o orçamento. Passam os dias a comer.

Por mim ando farta de comida. Por muito que advogue não termos necessidade de refeições completas duas vezes por dia, o meu marido não concorda e lá vem o lamento...há tanto tempo que não fazes aquele bolo de... ou a carne... não sei quê.

Gosto de cozinhar, mas só para dois não apetece. Basta-me um almoço completo, um lanchinho e uma sopa ao jantar, por vezes nem isso. Fico-me por um iogurte e uma fruta.

Por isso padeço do mesmo mal, quilos a mais. A falta de exercício e demasiado tempo sentada a juntar ao uso de roupa prática camuflou mais a triste realidade. E agora perdê-los? Para mim o exercicio em casa não resulta.

Receio que este novo modo de vida esteja para durar e em dias de chuva vamos desanimando.

Aguardemos dias melhores.

Hão-de vir. Até lá saude, beijinhos e paciencia.