Olivier Blanchard é economista, francês, nasceu em 1948 e tem um aspecto que me faz lembrar o Clint Eastwood. Professor reputado, agora de licença, é também Director do Departamento de Investigação do FMI.
As suas exposições são sempre claras e não foge a formular questões incómodas.
Espanta-me o destaque que só agora está a ser dado às suas posições. Há algum tempo que ele vem alertando para o que agora defendeu: o ajustamento através de uma travagem brusca, ou seja, através de um corte acentuado do rendimento disponível, desgraça a economia deixando-a incapaz de gerar fluxos que permitam estancar o crescimento da dívida. Alerta, pois, para que o ajustamento não seja feito desta forma. Aconselha ele que haja prudência e moderação na aplicação dos curativos.
Bastará aceder à página em que estão os seus textos para o comprovar. Não foi apenas agora que ele acordou como, ouvindo a comunicação social, somos levados a crer.
Já em 2011, aqui, no Um Jeito Manso me mostrei animada com um artigo seu. Achava eu, na altura, que quando uma pessoa como Blanchard publicava de forma tão clara a sua opinião, o Governo português e a Comissão Europeia, já para não falar nos departamentos operacionais do FMI, iriam seguir as suas orientações. Enganei-me.
O que se passa, no terreno, com os operacionais do FMI que parecem seguir uma agenda diferente da de Blanchard e até da de Christine Lagarde, é para mim um mistério. Muitas vezes me interrogo se será mesmo assim ou se há por aí muita manipulação da informação.
Já o que se passa na Comissão Europeia não me admira. Aquilo é uma babilónia entregue a gente de quinta escolha. Quando alguém não presta nas políticas nacionais, chutam-no para Bruxelas. Aconteceu com o cherne Barroso e com quase todos os outros. Não havendo lideranças carismáticas, os funcionários burocratas fazem a União Europeia arrastar-se sem um rumo estratégico. Uma desgraça.
Por outro lado o BCE padece dos mesmos males. Sem um enquadramento claro, o BCE move-se conservadoramente, sem energia, sem grande autonomia. Se pensarmos em Vítor Constâncio, talvez uma excelente pessoa mas uma nódoa como governador de um banco central (lembremo-nos do que se passou no Banco de Portugal, nas suas barbas, sem que ele mexesse uma palha: diz que não viu, não ouviu. E nem desconfiou). Mario Draghi tem estado a portar-se relativamente bem mas não chega. Toda a sua actuação é tardia e titubeante - mas, se pensarmos bem, no caldo amorfo que é a UE será que ele poderia fazer muito mais?
Por outro lado, por cá, a miséria é idêntica. A classe política instalada no poder, PSD e CDS, deve estar para cumprir uma qualquer encomenda a mando de não se sabe quem e não há quem a detenha. Despacha as maiores empresas públicas, lança ataques soezes aos pilares do Estado Social, arruina a economia, atira com milhares de pessoas para o desemprego e ataca os direitos de quem trabalha ou já trabalhou e, de caminho, aumenta a dívida. E mantêm-se nesta senda haja o que houver, provem-se os erros que se provarem, constatem-se os resultados que se constatarem.
E a corte de papagaios (comentadores, jornalistas, avençados, assessores, consultores, etc) que os rodeia e que, de alguma forma, beneficia desta governação incompetente e mal intencionada, ao longo deste tempo tem, também, ignorado olimpicamente os alertas de Blanchard.
Perto do final de 2012 voltei, de novo, aqui a dar conta de novos avisos de Blanchard que, dessa vez, até foram usados por Cavaco Silva para sugerir (daquela forma meio ínvia e inconsequente que costuma usar) que o ajustamento à bruta seguido por Passos Coelho era reconhecidamente errado.
Nada. Ouvidos de mercador. Prego a fundo na austeridade. Cortar é que é bom, portámo-nos mal, temos que expiar os pecados. Sofrer, empobrecer, emigrar, é que é bom.
Pois bem, foi preciso que passassem dois anos para que a opinião pública acordasse e viesse clamar justiça. Foram preciso dois anos de muita desgraça, de muito sofrimento, de falências, de desemprego, de sopa dos pobres, de dívidas na farmácia, para que as incongruências e a ausência de pensamento da gente desta fraca coligação fossem notórias - hoje até aquele coiso, o Marco António, apareceu a criticar a duplicidade do FMI (leio no Expresso: Marco António Costa acusou hoje o Fundo Monetário Internacional de "hipocrisia institucional", por fazer "proclamações em relatórios" onde reconhece excesso de austeridade). Pudera, aproximam-se as eleições e há que tirar o cavalinho da chuva. E qual o espanto? Não é sobejamente conhecida a falta de decoro destas figurinhas da politicazinha nacional?
O PSD é aquele saco de interesses, patos bravos, arrivistas, jotas armados em justiceiros, ignorantes encartados, burros armados em doutores, em que apenas uns quantos se salvam (sendo rapidamente ostracizados). E portanto, mal a coisa começa a cheirar a fim de festa, os seus principais intervenientes começam a sacudir o pó, a mudar de casaca, a ajeitar o discurso. Vergonha é coisa que não lhes assiste.
Mas como a liderança de Passos Coelho é uma anedota, enquanto uns pedem clemência, outros continuam a pedir sangue. É o caso da pinókia que ainda há pouco vi na televisão a defender que a austeridade deve continuar, que o caminho é para prosseguir.
Parece uma tropa fandanga, desafinada, uma cambada.
Uma desgraça. Que raiva que tudo isto me mete.
3 comentários:
resumindo - https://dl.dropboxusercontent.com/u/117669777/young-frankenstein.gif
a reunião já foi - http://expresso.sapo.pt/videntes-cartomantes-e-bruxos-de-regresso-a-vilar-de-perdizes-montalegre=f829044
falta-me as palavras, ainda bem que as encontro por aí "os jornalistas portugueses estão assim tão abovinados" - http://delitodeopiniao.blogs.sapo.pt/5706652.html
Enviar um comentário