Depois de um dia de galdeirice, apetecer-me-ia reportar essa actividade. Mas, noblesse oblige, face à indisposição do Ventura, não me parece que haja clima para grandes bordejos.
Direi apenas que o almoço foi composto de petiscos em versão comida de autor e que, de cada vez que vinha o prato, eu pensava: 'já foste'. Coisinhas pequeninas cuidadosamente dispostas, circundadas por nano-caules ou nano-folhinhas, tudo em versão lilliput. Muito bem confeccionado, tudo saboroso e bonito.
Curiosamente, saí de lá bem, confortada, e, mais curiosamente ainda, cheguei à hora de jantar sem fome.
Enquanto lá estávamos -- numa mesa junto ao vidro que dá para a rua --, fui à casa de banho. Contou-me o meu marido quando voltei que, nesse ínterim, tinha passado uma conceituada jornalista, conhecida pela sua pretensa sabedoria e pela sua conhecida animosidade, diria até mau feitio, contra alguns ódios de estimação. O meu marido estava um pouco desconfortável com o que viu, disse que a senhora, a andar, quase parece meio trôpega (embora não tenha idade para isso), que tem uma figura um pouco embaraçosa, nada a ver com a pose algo superior com que se apresenta ao balcão do comentário televisivo. Cada um é como é e ninguém tem nada a ver com isso nem tem que alvitrar palpites sobre o tema. Mas, na verdade, já não é a primeira nem a segunda nem a terceira vez que, vendo ao vivo os temíveis jornalistas ou comentadores televisivos, penso: 'coitados... na verdade não metem medo a ninguém...'. É a televisão que é a arma temível, não as (por vezes) fracas figuras que por lá peroram.
Não há muito, íamos no passeio atrás de um que tem a mania que pode demolir políticos, em especial se forem mais à esquerda. Escreve e fala sempre assanhadamente como se tivesse na manga segredos e podres capazes de atirar os seus alvos para a sargeta. Ia ao telefone, a trocar informações com alguma fonte. E eu, que tenho um ladozinho um bocado infantil, ao vê-lo com ar de totó, só pensava: agora era tão fácil passar-lhe uma rasteira... e lá ia o temível jornalista com os cornos ao chão. Mas, claro, a minha mente policia-me e impede-me de concretizar essas inocentes diabruras. Aliás, acérrima polícia de costumes que também é, até me impede de verbalizar expressões mais vernaculares. Fica tudo dentro da minha cabeça.
Posso também acrescentar que, de regresso a casa, passámos pelo supermercado. Havia choquinhos na bancada do peixe e não resisti a trazê-los para os cozer com tinta. O meu marido perguntou se não ficariam bons assados no forno. Não me pareceu, eram miúdos demais.
Lavo-os bem. Por acaso estavam carregados de areia, lavei e lavei e lavei. Não arranjo, cozo-os com todas as suas vísceras e tentáculos. Cozo-os só em água, não muita. Nem sal ponho pois eles mesmos se encarregam de salgar a água. A água fica negra, claro. Quando estão macios, junto batata doce cor de laranja e roxa, com casca, cortadas às fatias grossas. Ficam tingidas e saborosas. Depois é que arranjo e tempero.
Só que, depois de ter colocado as batatas, ligou a minha filha, ligou o meu filho, e as chamadas foram mais longas. Quando vim ter com o meu marido à sala, deu-me o cheiro. Sempre acabou por ter chocos assados.
Felizmente, no tacho, coloco-os sempre com a prancha calcária para baixo. Por isso, o que foi à vida foi a membrana fina. Essa desapareceu, derretida no fundo do tacho. Depois as placas dos chocos ficaram castanhas, de queimadas que ficaram. Daí para cima ficou tudo bom, mas quase desfeito. Claro que o pior foi lavar o tacho. Tudo queimado, tudo negro, um cheiro a choco assado que nem vos digo nada. Caraças.
Mas estavam bons, embora quase tudo transformado em puré.
Também vi, depois, nas mensagens de um grupo de amigos, que um esteve doente e que ainda estará com um problema resultante da cirurgia, supostamente um mal menor. E fiquei como sempre fico quando sei de algum problema com os meus amigos, em especial os de longa data: parece que a modos que tolhida, talvez assustada. Tendo a pensar que eu e os que conheço de há séculos somos eternos, eternamente jovens, eternamente alegres, eternamente saudáveis. Quando constato que, de vez em quando, alguém adoece, fico triste, preocupada, com vontade de fazer ou dizer qualquer coisa para que se sintam animados, esperançosos, com optimismo, motivados para ultrapassar as dificuldades. Mas muitas vezes não digo nada com receio de que, ao transmitir uma mensagem de ânimo, deixe transparecer a minha preocupação. Mal comparado, foi o que aconteceu quando a minha mãe estava no hospital, muito mal, e, estando eu a querer animá-la, vejo aparecer um padre no quarto. Fiquei em pânico, com medo que ela percebesse que a morte estava a rondar. Lembro-me que enxotei o padre o mais educadamente que consegui mas numa aflição, receando que ele quisesse dar-lhe a extrema unção. E, de facto, no pouco que ele conseguiu dizer, houve lá umas palavras que me deixaram em transe, furiosa. Salvo erro, dirigindo-se a não sei que entidade, deus ou nossa senhora, não faço ideia, disse: 'recebe esta nossa irmã...'. Não sei se a minha mãe se apercebeu de alguma coisa mas eu fiquei traumatizada com isso. Mas, verdade seja dita, nem sei o que é que dá mais conforto a quem se sente menos bem, com incómodo físico, com receio do que por aí possa vir -- se é que tentem animá-los, tentem transmitir esperança e força, ou se é que lhes digam que se compreende o susto e o medo. Não sei. E acho que deveria saber pois posso agir desaquadamente numa altura em que alguém, estando mais vulnerável, precisaria do apoio devido.
Depois vi as imagens do André Ventura e também fiquei um bocado impressionada. Ainda por cima é bem mais novo do que eu julgava. Politicamente não posso estar mais distante dele. Tudo me separa do populismo. Mas se, a nível político, gostava que ele se estampasse nas eleições, a nível pessoal, não quero o seu mal. Se ele tem pais, imagino o medo que sentiram ao ver o filho agarrado ao peito e ao pescoço e a desfalecer. E depois o Chega é ele. Se ele se retirar de cena, nem que seja por uns dias, não há Chega para ninguém. E a ele, que de burro não tem nada, isso também deve preocupar. No seu íntimo, o seu sonho deve ser arranjar maneira de ainda chegar à liderança do PSD, um partido minimamente respeitável e não aquele aglomerado de gente desqualificada que é o Chega.
Mas, enfim, espero que melhore.
E agora vou espreitar o instagram (@veramulanver) antes de me ir deitar. Aquilo é, verdadeiramente, um infinito caudal de cenas, uma janela de onde se vê o mundo (ou parte dele), uma imparável torrente de imagens e palavras efémeras.
A minha filha no outro dia disse-me que deixar corações ou mensagens nas outras pessoas é importante para alcançar algum engagement -- e espero não estar a distorcer o que ela disse pois há ali uma lógica e uma semântica que ainda não domino bem. Acontece que, salvo raríssimas excepções, nunca me lembro de tal coisa. Aliás, sempre achei essa coisa dos likes uma puerilidade, uma fixação. As pessoas estarem a contar likes ou seguidores parece-me uma coisa tonta, um sinal de carência afectiva -- nem sei. Mas, na verdade, contra factos não há argumentos e tonta devo ser eu por estar tão fora destes tempos em que as redes sociais quase parece que tendem a substituir-se ao mundo real.
Para já, tenho 251 seguidores, e, tal como ficava estupefacta por tantas pessoas descobrirem o meu blog, agora também fico admirada quando pessoas que não faço ideia quem sejam se tornam minhas seguidoras. Sinto-me agradecida. Comecei a ter conta de instagram em Fevereiro e não faço ideia se 251 seguidores é um número que não envergonha ou se é tão pouco que até dá pena. Mas, seja como for, é o meu ritmo. Não quero nem sei nem me apetece andar à pesca de seguidores.
Também acontece que, acho eu, tudo o que ponho no Instagram vai também para o Facebook. Mas eu nunca vou ao Facebook, esqueço-me, parece que não me entendo com aquilo, parece-me antiquado, não sei. Mas, volta e meia, reparo que tenho mails a dizer que tenho notificações. Vou ver e são pessoas a quererem ser minhas amigas no Facebook. Mas, como aquilo é público, acho que não tenho que fazer nada. Se querem ser minhas amigas ou seguidoras, pois muito bem, que sejam. O pior é se eu tenho que as puxar ou dar algum ok e estou a deixá-las penduradas. Tenho que me informar. Não quero parecer desagradável ou que pensem que estou armada em coquette.
E é isto.
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Dias felizes
7 comentários:
Correndo o risco de parecer grotesco, digo que ervas daninhas não fazem falta nenhuma. Por outro lado, e sabendo a qualidade da criatura, não deixo de me questionar se este fanico foi apenas para não ficar atrás do Luis. Mas se calhar foi só coincidência.
Nuvens negras no horizonte. Hoje numa tertulia, ouvi vários presentes, daqueles que como eu souberam como era a vida antes de 74, a dizer que vão votar na criatura referida neste post do blog, porque ISTO TEM QUE MUDAR NEM QUE SEJA PARA PIOR. É nestas alturas que tenho pena de não ser crente, como se usa dizer. Se fosse, ao menos podia invocar os céus e dizer- perdoai-lhes SENHOR pois não sabem o que fazem-.
Os likes e os seguimentos, no insta e nas outras redes, servem para a empresa perceber as preferencias de cada um, e criar o respectivo perfil, para assim lhes impingir o que gostam, e eventualmente ganharem com publicidade. Eu por exemplo não dou likes em coisas patrocinadas, mas se calhar basta só visualizar e já fica lá a impressão digital. Privacidade, mas qual privacidade, nem é preciso o GRANDE IRMÃO, as pessoas abrem-se todas. Alguns vivem disso, e tudo bem, mostram coisas que muitos nunca conheceriam de outra forma, mas o risco é de quem se expõe demasiado, e cujo perfil pode ser usado para o manipular.
O Trump teve um atentado, o Bolsonaro teve um atentado, todos já apareceram com pensos ou no hospital... e ele nada...? Ora, ora...
Pois, o pior é que por todo o lado me falam de quem vai fazer o mesmo. Gente burra, só pode. O pior é que muitos são letrados e até parecem inteligentes. Não dá para perceber. Uma tristeza.
Não, não é gente burra. A outra chamou-lhes deploráveis e, assim a porta ao Trump
Pois não, não dá para perceber. Que tal retirar as suas palas que só permitem olhar numa direcção?
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