Trabalhei em empresas durante décadas, trabalhei em contexto público e em contexto privado. Durante todo o meu longo percurso assisti a incontáveis 'casos'. Quase todos foram esporádicos, temporários, inócuos. Apenas um, justamente com a minha Secretária, divorciada, deu em rotura de casamento (dele) e foi porque ele contou à mulher, tentando convencê-la a aceitar a situação. Para surpresa dele, a mulher não aceitou. Creio que não se divorciou mas foi viver com a 'namorada'. E agora são todos amigos, uma família unida. Mas, que me lembre, foi o único caso sério.
O que sempre aconteceu e causava sérios embaraços aos envolvidos foram as cartas ou telefonemas anónimos para as legítimas e legítimos. Colegas despeitados ou maldosos, geralmente mais mulheres que homens, resolviam estragar o romance.
Sempre se entendeu que era tema que, na pior das hipóteses, poderia molestar o casamento legítimo. Não o desempenho profissional.
Um dia vou escrever as minhas memórias nesse capítulo. Dará, certamente, um livro suculento.
Quando penso nisso, um dos casos que logo me ocorre e que me faz sempre rir, tem a ver com um colega, grande amigo, divertido, alegre, hiperactivo, As mulheres caíam por ele. Conheci-lhe várias namoradas. Um dia pediu a um funcionário da Contabilidade para lhe fazer um apanhado para um relatório que de que precisava com urgência. O funcionário ficou a trabalhar até tarde. E ele ficou à espera. Mas, pelo meio, fora de horas, uma das admiradoras foi fazer-lhe uma visita ao gabinete. No calor do momento nem mais ele se lembrou do 'apanhado'.
Estavam ali, no truca-truca, em cima da mesa, quando apareceu o funcionário com o 'apanhado'.
No dia seguinte o meu colega, à primeira da manhã, receando o falatório, resolveu ser ele a ir expor o sucedido ao Presidente.
Foi dia de festa.
Quando, nessa manhã, fui ter o meu ponto de situação diário com o Presidente, saiu-se logo com esta: 'Então, já soube do coxo?'. Eu ainda não sabia. Contou-me, e contou que já tinha chamado o funcionário (que era coxo) e já lhe tinha pedido que não comentasse nada com ninguém. E ainda nos fartámos de rir. Ao longo do dia, qualquer um que entrasse no meu gabinete ou com quem eu me cruzasse, já vinha a rir e a comentar o 'achado' do 'coxo'. Uma galhofa pegada. E o meu colega, esse grande doido, dizia que tinha apanhado o susto da vida dele quando se viu naquela situação com o funcionário à porta, de boca aberta e papéis na mão, a olhar para eles, sem saber o que fazer.
Numa remodelação algum tempo depois, aquela mesa acabou por vir para o meu gabinete. Havia sempre quem se lembrasse: 'Ah, se esta mesa falasse...'.
Algum tempo depois, tive um outro colega que também deu mais que falar do que os outros. Era muito 'palhaço', muito bon vivant, muito bem disposto. Teve também várias namoradas. Conheci bem a mulher dele. Era apaixonada por ele, tal como ele o era por ela. Mas ceder à tentação era mais forte que ele. Uma das vezes, havia lá uma jovem que entrou para estagiar na minha área e que lá ficou. Era muito bonita e vestia-se de uma forma muito 'exibida'. Andava mais despida que vestida. E era pouco inteligente. Muito imprevidente, muito tonta. Para ela, ter um caso com um director era o máximo. Contava o que fazia, quando fazia, onde fazia. Um disparate. Nós aconselhávamos o nosso colega a ter cuidado pois era quase inevitável que aquilo fosse parar aos ouvidos da mulher. E ainda me lembro do Presidente, no meu gabinete, um dia em que eles chegaram a meio da tarde vindos sabe-se lá de onde, todos alegres e tontos como adolescentes, e o Presidente o chamar e dizer que não tinha nada a ver com isso mas que ela era tão tonta que ele deveria ter mais cuidado. Disse: 'A ter um caso, que seja com uma mulher inteligente, não com uma tão limitada'.
São tempos longínquos. Não se falava em #Metoo ou em assédio. Se calhar havia casos de assédio mas nunca soube de nenhum, nenhum dos múltiplos casos que testemunhei foram casos de abuso, de prepotência ou de actos não consentidos.
Na maior parte dos casos, os envolvidos tentavam que ninguém desse por isso e, se algum tinha função ascendente, mais depressa prejudicava a 'namorada' do que a beneficiava (tendo eu trabalhado em empresas em que eu era a excepção feminina em cargos de gestão quase exclusivamente ocupados por homens, a maioria dos casos eram entre 'chefes', 'doutores', 'engenheiros' e mulheres com cargos hierarquicamente abaixo).
Nas empresas em que nos últimos anos exerci cargos de administração, passaram por mim várias denúncias feitas através do canal próprio para isso e que chegavam à Comissão de Ética.
A maioria tinha a ver com denúncias anónimas, não fundamentadas, de eventual corrupção ou de decisões enviesadas, favorecendo empresas de forma pouco clara. Quando as denúncias eram tão vagas e tão absurdas que não tinham ponta por onde se lhe pegasse, eram arquivadas.
Houve um caso que deu em despedimento de uma sub-directora que foi acusada de fazer bullying a alguns funcionários. Nesse caso houve testemunhas, houve um caso bem fundamentado. Rua sem apelo nem agravo.
Nunca apareceram denúncias de casos amorosos mas, a menos que fosse algum caso escabroso ou que se percebesse haver abuso de função dominante, se aparecessem seriam arquivadas.
O que está a acontecer ao CEO da GALP parece-me inacreditável. Ou há ali, da parte dele, qualquer protecção absurda à directora, promoção sendo ela incompetente, atribuição de avultado prémio de desempenho sendo ela um calhau, ou coisa assim (e nesse caso, será grave), ou, então, estamos na presença de uma coisa miserável.
Parece-me absurdo, ridículo, impensável, que o homem tivesse que declarar à Comissão de Ética que tinha um caso com a directora. Está tudo maluco.
Já não basta as beatas que acham que estas coisas são caso para ir à igreja, confessar os pecados ao padre. Agora é também confessar à Comissão de Ética.
Uma coisa que é do foro íntimo, mais do que privado, tem que ser participado à Comissão de Ética?!
Até me custa a acreditar numa palhaçada destas.
E, para cúmulo da porcaria, alguém despejou isto na Comunicação Social. Um mundo de miseráveis armados em puritanos, em moralistas, um mundo de gente estúpida.
5 comentários:
Olá UJM;
Revejo-me a 100% (até mais se fosse possível) em tudo o que escreve. Também me "movimentei" alguns anos nesses contextos que descreve e testemunho que só pessoas incompetentes, ressabiadas, ou que se sentiram despeitadas por não atingirem os seus intentos ousavam alinhar nas práticas da delação caluniosa ou nas tretas que agora se designam pomposamente por "me too". Em 45 anos de trabalho, mais de metade dos quais com responsabilidades de Direção de topo e de Gestão, nunca fui assediado, en nenhuma forma conhecida de assédio, nem assediei ninguém. Mas, mais do que uma vez, fui objeto da torpe calúnia anónima, que, como tudo o que não tem fundamento morreu como nasceu porque não "era moda" usar a pulhice para desfazer vidas e arruinar empresas, coisa que agora parece, mais do que moda, ser um objetivo.
Faça por passar bem.
ABR.
Quando eles estavam no truca-truca o patrão pagava?
É curioso, nunca vi uma mulher nova apaixonada por um velhadas depenado. Curiosamente os casos de que se ouve falar metem sempre um tipo rico ou influente.
Que caraças... Grandes patuscadas de CEOS!
Ou será apenas um belo motivo para um bom saneamento?
Talvez no seu tempo ou no seu meio as mulheres fossem as que mais cuscuvilhavam, enviando mesmo cartas aos "legítimos", mas no meu os homens são feitos de osso sem pingo de decência ou misericórdia na medula. Se apanham um caso, não se coibem de assediar a mulher do caso até ela ser demitoda (por vontade própria ou dos superiores). São uns cuscos, uns totós e uns cobardes. Acho que cada vez mais as mulheres estão de emnte aberta e os homens fechados no mundo anti-woke dos Elon Musks e Trumps da vida.
Enviar um comentário