No outro dia, numa de zapping, parámos num daqueles programas em que as pessoas conhecidas da televisão são exibidas, são usadas como entretenimento. Provavelmente elas acharão que são elas próprias que decidem exibir-se e, se calhar, acreditam que se divertem. Mas facilmente percebemos que estão apenas a ser um veículo de promoção para os programas de televisão em que participam ou para marcas cujos produtos usam como se não passassem de uma montra.
Esses programas são o cúmulo da futilidade. Todos se riem muito e todos ostentam felicidade, momentos de amor com a 'nova' relação ou de entusiasmo com o 'novo' projecto. Os entrevistadores geralmente colocam questões infantilóides, desprovidas de sentido, e os entrevistados, sempre sorrindo muito, dão respostas muito parvas.
Se calhar durante uns tempos gostam, se calhar sabe-lhes bem o dinheiro que ganham. Mas é mais do que natural que, ao fim de algum tempo, se sintam vazios, esvaziados até às entranhas, sugados, incapazes de se aguentarem mais naquele registo.
Já aqui falei de um conhecido próximo, dantes dir-se-ia 'prente' ou 'aparentado'. Jovem, bem sucedido, bem disposto, sempre com amigos, com uma vida amorosa preenchida, uma família amiga. E, no entanto, aos poucos foram-se percebendo alguns aspectos que pareciam não bater muito certo. Muitas vezes, em reuniões familiares, afastava-se e, quando regressava, vinha eufórico, eléctrico, esfusiante. Não se percebia de onde tinha surgido tamanha energia. Depois, começou a pedir dinheiro emprestado. Nunca se percebia bem para quê. Pertencendo a uma família abastada, tendo uma boa profissão, não tendo despesas elevadas, não se percebia. Mas pedia dinheiro ora a um, ora a outro e, como era tema sensível, os que emprestavam guardavam reserva. Logo, não sabiam uns dos outros. Ou seja, ninguém sabia a dimensão que as dívidas estavam a assumir.
Continuava a trabalhar mas percebia-se que aquela não seria bem a sua praia. Esforçava-se por encaixar num destino que a herança familiar parecia querer traçar-lhe e pensava-se que noitadas eram uma forma de espairecer do espartilho profissional.
Mas, tirando um ou outro insignificante pormenor, no dia a dia, tudo parecia normal.
Uma vez, numa dessas ocasiões em que a meio do convívio familiar se afastava, alguém ouviu um barulho suspeito na casa de banho, como se alguém estivesse a inalar qualquer coisa. Quando de lá saiu vinha brincalhão como sempre mas imparável, tudo a uma velocidade vertiginosa, metia-se com um, metia-se com outro, ria, dizia piadas, uma coisa for de normal. A namorada, inocente e enfeitiçada como sempre, sorria embevecida, contente com o seu namorado hiperactivo. Toda a família inocente, muito longe do que estava a passar-se.
Até que a bomba rebentou. Estava cheio de dívidas, estava viciado. O núcleo mais próximo abafou. Pouca gente sabe. Largou a profissão, afastou-se, mudou integralmente de vida. Casou, tem um monte de filhos. Ninguém toca no assunto. Como é que ele conseguiu esconder de toda a gente, onde se abastecia, como conseguiu gastar tanto dinheiro, como conseguiu arranjar tanto dinheiro, isso acho que ninguém sabe. Talvez só ele.
A entrevista, um vez mais, é muito boa, sensível, directa, interessante. E o Pedro Barroso não é apenas um pedaço de mau caminho, é também um homem corajoso.
Pedro Barroso e a adição. “A cocaína era como se fosse o meu medicamento”
Aceitou ajuda quando os consumos já eram diários e percebeu o descontrolo em que vivia. O tratamento foi o primeiro passo, mas não deixou o ator imune a duras recaídas. Uma parceria Observador/FLAD.
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Desejo-vos um dia bom
Saúde. Compreensão. Coragem. Paz.
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