O meu dia foi tão cheio de coisas. Tantas. Em contínuo e em sobreposição. Acresce que dormi mal e que me acordaram cedo demais. Comecei o dia em défice e tudo, ao longo dele, serviu para consumir as minhas energias. O que me animou foi uma coisa que me contaram ao fim da tarde. Era uma coisa que eu temia e, na verdade, uma má notícia. Mas tão, tão má, a um nível que nunca tinha imaginado que a minha reacção, perante a estupefacção de quem me dava a notícia, foi desatar a rir. Mais tarde, em troca de mensagens com outra pessoa, contei-lhe as más notícias e descrevi tal como a mim me tinham contado. Do outro lado recebi isto: ahahahahahahahah. De vez em quando as coisas más, más demais, são tão inconcebivelmente más que na minha cabeça viram anedota e, pelos vistos, involuntariamente descrevi-as de tal maneira que outra pessoa -- que tinha razão para ficar tão apreensivo quanto eu -- igualmente caiu na galhofa.
Felizmente estamos a entrar no fim de semana e com sorte não vou lembrar-me destas coisas.
Aliás, ao finzinho da tarde, como senti que ainda estava um fiapo de calorzinho, despi as calças e vesti uns shortinhos, despi a blusa e fiquei apenas em top, soutien não estava a usar (em videoconferência não dá para perceber esses pormenores, e prefiro estar à larga). Pus a espreguiçadeira no cantinho de relvado ainda com sol e pus-me a ler. Mas tarde demais o fiz. Passados uns quinze minutos não havia qualquer sol e começou a esfriar. Fui de novo para dentro e fui tratar de mais umas cenas macacas.
Esta sexta-feira o meu marido teve a bela ideia de irmos buscar street food asiática. Fomos, pois. Aproveitámos para também darmos um passeio à beira de água e fomos ao restaurante. Fomos atendidos à porta, tinham o saco pronto. Em casa, por via das dúvidas, passámos os acepipes pelo micro-ondas e deliciámo-nos. O meu marido disse que temos que repetir. Acho que sim.
Mas estou cansada. Tenho dormido pouco e não muito bem e tenho acordado sempre cedo demais. O corpo ressente-se.
Tenho decisões relevantes a tomar nos próximos tempos e ainda estou na fase que precede a inspiração que me há-de salvar do impasse em que as sucessivas dificuldades me fazem sentir atolada.
E só me apetece estar com a família, todos juntos -- e sei que não é grande ideia. Mas temo os dias de frio em que não podemos estar ao ar livre e em que o risco há-de aumentar. O meu filho diz que eu e o pai somos mais de risco do que eles e que sou sempre a mais descuidada, esqueço-me da máscara. E é, bem sei que tem razão. Em casa não me lembro de a pôr. Não me apetece. Não gosto. Estou farta de tanta limitação. Há meses que não abraço capazmente nenhum dos meus ou puxo para o colo e dou mil beijos aos meninos. Acho isto tenebroso. Apanho-os de costas, beijo-lhes a nuca, os ombros. Eles chamam a minha atenção, em especial o meu filho que diz que eu é que estou a correr riscos. Mas acho que estes tempos de não manifestação de afecto ou de convívio mais distante são tempos perdidos e odeio não usar o tempo da melhor maneira. Mas, enfim, prefiro nem falar nisto. O meu filho hoje chamava-me a atenção para que os contágios estão a nascer nos encontros familiares. Já antes tinha eu dito isto mesmo à minha mãe que ainda colocava a hipótese de organizar um lanche na sua sala de jantar. Em espaços fechados não, mãe, não ouviu? É arriscado. Só na rua.
Aos poucos vou sabendo de casos mais próximos: um colega, o filho de um colega, gente que fica de quarentena. Preocupa-me isto. A tendência está a acelerar e o que aí vem não pode ser bom. Como foi possível chegarmos aqui é coisa que nos deveria envergonhar a todos. Bichos mais indefesos e impreparados não há. Bichos com a mania que somos racionais, os maiores, quando somos é parvos. Mas é escusado, não se aprende nada. Sempre presos às mesmas porcarias de assuntos e parece que ninguém se preocupa em prevenir que coisecas destas ponham em causa todo o nosso modo de vida. A quantidade de gente que tem ido desta para melhor, gente que nem enterros decentes tem, gente que morre a arfar e que antes disso só vê gente mascarada à sua volta. Coisa horrível.
Estou sem paciência para continuar a escrever. Estou cansada.
As pinturas são de Olga Albizu a a ideia era ver se o colorido contagiava as palavras. Mas acho que não.
Que a voz de Cohen me tranquilize e me abra caminho para um sábado feliz
Um dia feliz a todos que aí estão desse lado.
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