quarta-feira, outubro 21, 2020

Às armas! Às armas!

 

Leio e, à luz do meu pensamento -- que, à luz do meu pensamento sobre o meu pensamento, é avesso à irracionalidade --, acho que aquela malta é doida varrida. Contudo, acredito que, porventura, se lhes perguntarem a eles o que acham do meu comportamento dirão que me acham irracional. O mundo é assim, uns com as patas da frente, outros com as patas de trás, outros com as patas de cima e outros com as de baixo, todos fazem o cocó sobre o qual se andam a deitar. Não me iludo, portanto. Não sou melhor que eles, sou apenas o avesso deles.

Perante a ameaça do merdinhas, ponho máscara, lavo as mãos, afasto-me, essas coisas. Eles compram armas. Eu acho que me defendo melhor se tiver hábitos defensivos de higiene; eles acham que se defendem melhor se reagirem ofensivamente, seguindo a lei da bala.

Eu tenho medo de ser contagiada e de ficar doente ou de contagiar outros. Eles têm medo de ser assaltados, creio que não pelo corona mas por outros, iguais a eles.

A desgraça de uns é a oportunidade para outros e, no fim, a indústria do armamento ganha sempre.

Eu vivo num país em que o presidente se senta nu, peludo, com as mamas penduradas, enquanto leva uma vacina, um presidente que comenta tudo e todos a toda a hora e que é viciado em receber afecto mas que, apesar de tudo, é inteligente, culto, informado e, valham-nos todos os santinhos, até é um tipo decente. 

Eles vivem num big, big country em que o presidente é o palhaço Donald da cara cor-de-laranja e melena de palha, narcisista insuflado, maozinhas de pinypon, boquinha de boneca e, certamente, pilinha de hamster, que se acha o maior e que troça de deficientes, que apela ao voto das mulheres suburbanas a quem chama isso mesmo, suburbanas, que insulta e ofende Fauci, o infecciologista que mais tem penado para minimizar o catastrófico efeito das suas decisões, um presidente que é bronco, boçal e que gere o país na base das bocas.

Assim vamos.

Mas enfim, pouco a fazer. Como dizia o outro: 'é a vida'. Que é como quem diz, c'est la vie (malheureusement pas la vie en rose). 

A quem não esteja bem a perceber que macacoa me atacou para eu estar com este converseio, recomenda a leitura do artigo completo no The GuardianMore than 100,000 Californians have bought a gun in response to Covid-19 crisis, report finds.

Claro que há quem tema que tanta arma venha a traduzir-se em violência, nomeadamente violência doméstica, em aumento de suicídios -- esse tipo de efeitos colaterais que as armas costumam provocar. Mas isso, para aquela gente, não interessa para nada. O que lhes interessa, perante ameaças de incertos, é armarem-se até aos dentes. E, lá está, eles estarão que estão certos e quem sou eu para lhes atirar a primeira pedra...?

Uma canseira, isto. Um mundo a andar às arrecuas, danado para se encafuar num buraco negro.

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Felizmente, o que por lá ainda têm de bom é a liberdade de imprensa. A resposta da CNN a mais uma cavalice do Trump, que lhes chamou bastardos e que troçou deles por continuarem a fazer a cobertura da pandemia, é coisa boa de ver.


CNN's Brianna Keilar responds to President Trump's comments at a rally that people are "tired of the pandemic" and those who continue to cover the crisis are "dumb bastards."



Ou este:

CNN’s Anderson Cooper rolls the tape on leaked audio between President Trump and staffers where the president is heard bashing Dr. Fauci.



Coisas do além.

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E dias felizes para todos

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