quarta-feira, maio 15, 2019

O Expresso de sábado passado: belos textos
de Pedro Mexia [As bruxas de Allen],
de Tolentino de Mendonça [A mais antiga flor do mundo],
de Ricardo Costa [Um dia a casa vem abaixo]
e até, imagine-se, um bom editorial de João Vieira Pereira [E sobre a educação nada?]


Já no outro dia abordei o tema; agora vou falar dele.

Desde que me conheço, sempre que ia de férias e parávamos na estação de serviço para atestar o depósito, eu comprava uma revista. Comprava a Vogue ou a Art et Décoration, cheguei até a comprar a Hola. Era o que, no escaparate, mais chamasse a minha atenção. Apesar de ir sempre carregada de livros, as férias tinham sempre que começar com uma coisa atípica e ligeira.

Agora, para quatro dias em Lagos, foi a mesma coisa -- só que desta vez a coisa atípica e ligeira foi o Expresso.

Depois de ter sido fiel leitora durante mais anos do que aqui seria decente confessar, fartei-me: o Expresso tornou-se pasquim, coisa sectária e nada rigorosa, instrumento ao serviço de uma agenda que a mim me desagradava demais.

O meu marido desistiu antes de mim. Passei a ser eu, sozinha, a dar a volta àquilo, e cada vez mais contrariada; por fim um exercicio que já mais parecia puro masoquismo. Até ao dia em que decidi: nunca mais. E mandei o Expresso catar-se. Depois disso abri umas duas ou três excepções. E este sábado foi uma delas. Não só, como sempre, me apetecia algo como fiquei curiosa com a capa da Revista: aquilo do Bannon interessou-me. Esta sinistra criatura intriga-me (e assusta-me).

O meu marido é mais firme e radical que eu, recusa-se a tocar no Expresso. Eu sou mais moderada nas minhas antipatias.

Ainda não li tudo e creio que não lerei pois, ao espreitar algumas colunas, vi que continua a ser mais do mesmo, conversa vazia, conversa mascarada de coisa de jeito, treta, manipulação, ainda a mesma desagradável manipulação. Encolhi os ombros e passei à frente.

Mas, verdade seja dita, eu que sou céptica, e ponham céptica nisso, sobre o João Vieira Pereira -- jornalista que se especializou em avisar que vem aí o lobo e cujos ódios de estimação frequentemente toldam a sua capacidade de isenção -- até gostei de ler o seu editorial sobre a crise dos professores ('E sobre a educação nada?'). Fui até ao fim a ver quando é que apareciam aqueles seus velhos tiques de sectarismo mas cheguei ao fim a pensar que alguma coisa nele mudou. Na volta, está mais homenzinho, já vê as coisas de uma maneira mais esclarecida, aprendeu a sobrevoar a espuma e a olhar melhor para a raiz das coisas. Não sei. Não é por um editorial que posso tirar conclusões mas lá que me espantei, espantei. 

De qualquer maneira, concentrei-me na Revista que é aí que habitam aqueles de que mais gosto, e, tenho que confessar, gostei do que li. Sobretudo o Mexia, o Tolentino, e, surpresa das surpresas, o Ricardo Costa. É que, se não me admirei de gostar do Mexia ou do Tolentino, a verdade é que pasmei com a qualidade do artigo do Ricardo Costa.  

E, embora ainda mantendo severas reservas mentais, tenho a dizer que gostei de matar saudades dos bons velhos tempos.

Se um dia me der para isso ainda aqui hei-de transcrever um pouco do texto do Pedro Mexia sobre a perseguição a Woody Allen, 'As bruxas de Allen', texto no qual me revi, e também sobre o belo texto escrito pelo Pde. Tolentino de Mendonça e dedicado a Maria Teresa Horta, 'A mais antiga flor do mundo'

E gostava de ter coragem e tempo para aqui fazer um resumo do bom artigo de Ricardo Costa , 'Um dia a casa vem abaixo' mas temo que isso nunca aconteça pois é um texto longo e todo ele suculento. 

E para atestar a sua qualidade conto-vos que no outro dia à tarde, à beira da piscina, estive a ler o artigo em voz alta e o meu marido, interessado do princípio ao fim, a ouvir. E, volta e meia, interrompíamos para comentar. No fim, ele disse: 'Ora aqui está uma boa coisa: tu lês em voz alta e eu ouço'. E eu disse: 'Ser a tua diseuse, querias...'Mas a verdade é que gostei da experiência. 

Não sei qual a prática do Expresso, se ao fim de algum tempo, os conteúdos exclusivos a quem tem assinatura ou compra em papel ficam abertos. Se ficarem, sugiro a sua leitura. 

Os riscos do populismo, as manobras dessa criatura tenebrosa que dá pelo nome de Steve Bannon, agora apostada em destruir o edifício europeu, as emergentes figuras de ultra-direita em ascensão no panorama político e que ameaçam dinamitar o frágil equilíbrio existente entre os partidos com assento parlamentar, tudo ali aparece fundamentadamente descrito. 

Tinha-me esquecido que Ricardo Costa era jornalista. Afinal é e, se se mantiver como se mostrou neste artigo, arriscarei dizer que é dos bons.

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