Depois de, abaixo, ter mostrado a moda primavera/verão 2014 no feminino e a masculina de inverno/2015, dois filmes cheios de charme, e de ter confidenciado porque é que um pormenor no filme feminino me agrada tanto (e vários no masculino), aqui parto para outra.
A Estrela do Mar, por favor
Percorro os jornais online, uma vez mais tento perceber se há alguma coisa de interessante a acontecer. A nível partidário a coisa roça a indigência, o Governo parece que perdeu a cabeça, só contradições, uma bagunça que só vista, e estão numa de eleitoralismo sem vergonha. Não vou falar nisso, não apenas porque não tenho acompanhado de perto para poder falar com propriedade, como, sobretudo, não tenho paciência.
A nível geral, pouco sei. Os jornais ou relatam estas coisecas, desgraças ou futebol ou despistes ou choques frontais. Desastres. Ou males ainda piores, ocultos, terríveis.
Li no Expresso uma notícia que só não me deixou de rastos porque acho que a gente ficar de rastos não resolve coisa nenhuma: há cada vez mais crianças com depressão, várias internadas, casos graves. Um pavor. O que li deixou-me gelada, nem queria acreditar no que estava a ler. Uma coisa verdadeiramente horrível. Um país doente, infeliz.
A nível internacional há desgraças permanentes: ou raptam crianças, ou degolam adversários, ou os favelados revoltam-se, ou os policiais agem como terroristas, ou as armas continuam a entrar livremente nos países em guerra.
Os meios de comunicação social planam como abutres sobre a desgraça para disso fazerem um festim. Parece que não há nada de bom a acontecer no mundo ou parece que as escolas de comunicação social formatam os seus estudantes para, uma vez profissionais, farejarem o sangue, o suor ou as lágrimas, aí se detendo. E tudo o que cheire vagamente a vida nova, a felicidade, a esperança ou a conquistas deve ser deixado para lá: notícia boa interessa a quem? Só se for aos lamechas.
Que a maioria das crianças ainda cresça saudável e feliz quase parece milagre face ao ambiente tenebroso que as cerca: as televisões só a falarem de desgraças, os filmes que passam a horas que eles vejam são só violência e terror, e, em casa, tantos, tantos, a viverem no seio de famílias em dificuldades de todo o género.
Mas, adiante, que não quero eu agora também pôr-me a fazer eco de toda a depressão que por aí vai.
No entanto, ao procurar ansiosamente qualquer coisa de bom, foi uma notícia que também não é boa que despertou a minha atenção: as estrelas-do-mar estão a morrer.
E ninguém sabe porquê, o que ainda é pior.
Transcrevo uma parte desta notícia:
Sejam azuis, cor de laranja ou vermelhas, tenham cinco, sete, dez ou 50 braços, as estrelas-do-mar costumam captar a atenção de todos. Porém, estes animais estão debaixo de uma ameaça — de origem ainda desconhecida — nas costas da América do Norte, no lado do Atlântico e principalmente no Pacífico. Desde 2013 que milhões de estrelas-do-mar estão a aparecer mortas.
Apesar do trabalho desenvolvido por vários cientistas, a origem destas mortes é um mistério, como relatou no início deste mês Maio a revista Science num artigo noticioso. Comparando com os registos de surtos idênticos em 1978 e em 1997, ocorridos na Califórnia, agora a dimensão da devastação é muito maior. O problema apareceu em 2013: primeiro atingiu a estrela-do-mar-púrpura (Pisaster ochraceus) e a estrela-do-mar-sol (Pycnopodia helianthoides), depois foi a estrela-do-mar-morcego (Asterina miniata). Mas, ao longo de milhares de quilómetros da costa, estão a ser afectadas cerca de 20 espécies, como a estrela-de-espinhos-gigantes (Pisaster giganteus).
Inquietante. As estrelas do mar fazem parte do nosso imaginário. Pelo menos eu, eterna menina-do-mar, fico apreensiva com isto. Milhões de estrelas do mar a aparecerem mortas? Que coisa desoladora. E ninguém conseguir descobrir as causas para deter esta mortantade...
Quando eu era pequena, um dos livros que mais me prendia era um sobre o fundo do mar. Todo ele estava cheio de fotografias: o cavalo-marinho, o peixe-balão, as medusas, os corais. Eu adorava. Vi aquele livro vezes sem conta. Uma parte do meu imaginário fantasioso, feito de recantos nas profundezas do mar, de coloridos vibrantes em locais tais que quase ninguém os vê, as lutas de vida e morte que se travam longe do nosso conhecimento, a leveza do ondular sob as águas, a luz que se vai perdendo à medida que as águas são mais profundas, tudo isso nasceu nessa minha infância tão próxima ainda (tão próxima porque as memórias estão ainda tão vivas). E lá estavam, solares, exóticas, as estrelas-do-mar. Seres diferentes: nem peixes, nem moluscos, nem animais de corpo aquoso e coberto por belas conchas. Não, seres especiais, vindos do céu para iluminarem os esconderijos do fundo do mar.
Ainda há três ou quatro dias, nas minhas caminhadas pela beira de água dei com duas já quase desfeitas.
Fotografei-as. Brancas, sem vida.
Nem precisariam de ter perdido já os seus raios de luz, braços rendilhados, para se ver que a vida se tinha esvaído delas.
Pensei: assim somos todos nós. Um dia cheios de vida, outro já uns restos que a natureza se encarrega de desintegrar e em que ninguém repara, até que se desfaçam por completo e ninguém saiba sequer que um dia existiram.
NÃO SEI O QUE FIZ ANTES DE TE AMAR.
Não sei que vão comércio ou vã empresa,
Que Estrada percorri, que luz acesa
Deixei pra que voltasse pra apagar.
Foi tudo um sono, um rente entorpecer.
O que fizemos nós, tão sós no mundo?
Não sei que vão pensar meditabundo
Tornou sua razão razão de ser.
Nem lembro... somos breves, uma onda
Que quebra no olhar sua saliva
E a renda delicada rende aos seixos...
Mas hoje a minha vida quero-a viva!
Pensei que eram vigílias meus desleixos...
Agora a minha noite o dia a ronda.
Bem. Fico-me por aqui porque, depois de ter lido a notícia do menino que não queria viver e pediu para ser internado no hospital da Estefânia ou da menina que se cortou, e de todos aqueles casos tão, tão, tristes, e depois desta notícia da morte das estrelas-do-mar, hoje não sou definitivamente uma boa companhia.
Deixo-vos com um vídeo muito bonito, com estrelas do mar (vivas!) e não tão dóceis quanto parecem - mas, enfim, têm que se alimentar para sobreviver (e a sobrevivência, por vezes, não é coisa bonita de se ver).
Jonathan Bird's Blue World: Sea Stars
E, para terminar, a Estrela do Mar e as Pastorinhas, pela Maria Bethânia.
Muito bonito, quase uma prece, quase uma marchinha.
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- O poema é da autoria de Daniel Jonas (mas por onde andou antes este Daniel Jonas que eu nunca tinha dado por ele...?! - já o perguntei no outro dia e volto a perguntar) e faz parte do livro Nó da Assírio & Alvim.
- Lá em cima a Estrela do Mar é interpretada pelo Jorge Palma e pela Cristina Branco
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Se vos apetecer espraiar as ideias e mergulhar em beleza e suavidade e bom gosto, desçam, por favor, até ao post seguinte. O ambiente, por lá, é mais solto e leve.
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E, por agora, por aqui me fico. Desejo-vos, meus Caros Leitores, um belo domingo.
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