sexta-feira, abril 13, 2012

O sim de Eva, a mulher que ama a poesia, e a sua maravilhosa festa de casamento. E daqui envio ao casal os meus sinceros votos de que sejam felizes para sempre!


Um pré-aviso. Hoje tive um dia fatigante, ao todo umas cinco horas de carro, reuniões. Cheguei tarde, estou com sono.

Enquanto aqui estive a responder aos comentários e a escrever no Ginjal fui ouvindo as notícias na televisão, a Quadratura no Círculo, etc, e fui-me dando conta dos acontecimentos do dia e, não estivesse cansada como estou, hoje era dia de me 'ir a eles' com estrépito e vigor. Mas faltam-me as energias. Passa da meia noite e acho que não consigo ir até tão tarde como me é habitual. Por isso, vou deixar de lado a política e a economia, a crise, o tom preocupado de Christine Lagarde, a crise (grave...!) em Espanha, e vou ver se consigo continuar, nem que seja por um bocadinho, o dia do casamento de Eva e Miguel.


Música, por favor

Rodrigo Leão - Ave Mundi, na voz de Ângela Silva


Eva ia entrando, pois, pelo braço do filho e era como se caminhasse sobre nuvens. 

Dourada, luminosa, cabelo solto, elegante, perfumada, Eva deslizava e espalhava charme, um charme tão mais cativante quanto todos a sentiam frágil, emocionada, quase etérea.

Nem ouvia a música, nem via distintamente coisa nenhuma, nem conseguia pensar, nem seria capaz de pronunciar uma palavra que fosse. Olhava Miguel, olhava a filha, sentia o braço ligeiramente trémulo do filho e ia feliz, imensamente feliz. Depois olhou em volta e viu os pais e, aí, Eva não se conteve, as lágrimas rolaram-lhe pelo rosto. Muito juntinhos, os pais choravam também e sorriam, e Eva sentiu-se contente consigo própria por estar a dar esta alegria aos pais, queridos, queridos pais.

E então, no meio de sorrisos, ao som daquele cântico que que sempre a deixa a pairar, fazendo-a sentir-se insconcientemente abençoada, Eva olhou Miguel nos olhos, sorriu e viu Miguel a sorrir, feliz, deixou-se olhar com ternura e amor pelo homem da sua vida, trocaram olhares cúmplices e apaixonados e, sem qualquer sacrifício, Eva disse o tão esperado sim

Todos bateram palmas, todos estavam comovidas e todos, especialmente os filhos, disseram cadenciadamente: 'Beija, beija, beija' e então Miguel enlaçou Eva, abraçou-a com toda a ternura do mundo e Eva abraçou Miguel com toda a paixão do mundo e beijaram-se, ao princípio era um beijinho envergonhado mas, depois, Miguel puxou-a com vigor e beijaram-se com todo o amor do mundo. Até que a filha os refreou: 'Então...? Já chega...' e o filho, com pudor: 'Também não é preciso tanto...' e Eva e Miguel suspenderam o beijo para, apenas, se olharem enternecidos.

Depois todos os vieram beijar, cumprimentar, grandes palmadas nas costas de Miguel, então, finalmente, lá conseguiste dar a volta à miúda...!, e Miguel sorrindo, um homem feliz, não largando a mão de Eva e os amigos a gozarem, é melhor não a largares mesmo, não vá ela arrepender-se e fugir..., e Eva e Miguel agarradinhos, cúmplices, felizes. 

E depois a festa começou.

A filha pediu para Eva se sentar num determinado sítio e todos fizeram um círculo em volta. Sempre atenta, ainda lhe ajeitou o vestido, queria a mãe bonita nas fotografias. Eva não aprecia grandemente surpresas, sente que não fica com o controlo da situação mas, enfim, um dia não são dias e, percebendo que tinham preparado alguma, não quis ser desmancha prazeres.



Sentou-se, pois. E então ouviu Miguel começar a dizer na sua bela voz que, aos poucos foi enrouquecendo de emoção:

                Amo o teu túmido candor de astro
                a tua pura integridade delicada
                a tua permanente adolescência de segredo
                a tua fragilidade acesa sempre altiva


                Por ti eu sou a leve segurança
                de um peito que pulsa  e canta a sua chama
                que se levanta e inclina ao teu hálito de pássaro
                ou à chuva das tuas pétalas de prata


                Se guardo algum tesouro não o prendo
                porque quero oferecer-te a paz de um sonho aberto
                que dure e flua nas tuas veias lentas
                e seja um perfume ou um beijo  um suspiro solar
      
                Ofereço-te esta frágil flor  esta pedra de chuva
                para que sintas a verde frescura
                de um pomar de brancas cortesias
                porque é por ti que vivo   é por ti que nasço
                porque amo o ouro vivo do teu rosto


As lágrimas deslizavam no belo rosto de Eva quando Miguel acabou e lhe veio oferecer uma flor. Eva queria agradecer mas não conseguiu, a voz presa, apenas lhe fez uma festa na mão. Miguel sentou-se então ao lado da sua mulher enquanto todos atiraram sobre o casal uma chuva de pétalas. A Eva tudo isto parecia irreal. Miguel passou-lhe o braço sobre os ombros, beijou-a.

A seguir Eva ouviu a voz emocionada da filha, da querida filha, certamente a obreira desta celebração e sorriu-lhe, agradecida, comovida:

                 Algo que não sei
                 uma felicidade tão leve tão frágil e tão nua
                 o desejo de nomear
                 uma pele fresca de lua   uma mulher de chuva
                 o perfume azul de um corpo adivinhado
                 ou um oásis de silêncio  a brancura de um lírio
                 que nascesse do seio do espaço

Depois a voz trémula do filho e Eva enterneceu-se sabendo o sacrifício que devia ter sido para ele predispor-se a isto, tão avesso que é a estas coisas, e Miguel, emocionado também, abraçou Eva com força:

                 A palavra-silêncio do seu corpo
                 entra no íntimo de nós
                 onde recolhe o sonho de viver
                 que só pode revelar-se numa infinita
                 contemplação
                 que não pode deter-se em nenhum sentido
                 porque é o incessante, o interminável sim do amor



E um a um, cada um dos presentes, foi dizendo um poema e era uma toada mágica, palavras divinas, a celebração autêntica da palavra, do afecto, da partilha, do amor. Dispostos em círculo, dizendo poesia para Eva e Miguel no centro, uma música maravilhosa em fundo, era todo um ambiente de tangível felicidade que ali se vivia.


Quando acabaram, Miguel puxou Eva pela mão e levou-a para o centro da sala, 'Anda miúda, vamos dançar'.


Música, por favor


Rodrigo Leão - La Fête com Ana Vieira na voz, Celina da Piedade no acordeão e Viviena Tupikova no violino


E dançaram abraçados, enlevados, apaixonados e felizes e depois todos se lhes juntaram e todos dançaram na maior alegria até que começaram a chegar os amuse-bouche, as bebidas e, finalmente, o jantar foi servido, vichyssoise, perdizes assadas em azeite e salsa, regadas com Madeira e acompanhadas de batatinhas assadas e espargos verdes, e outros petiscos que deliciaram todos os animados convivas; e todos comeram e beberam e, no final, já cantavam, dançavam, declamavam poesia, beijavam-se e foi uma festa que nenhum dos presentes conseguirá alguma vez esquecer-se.

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Os poemas são na verdade excertos de poemas de António Ramos Rosa e podem ser lidos na sua Antologia Poética, selecção, prefácio e bibliografia de Ana Paula Coutinho Mendes.

Por poesia: Se ainda tiverem disposição para isso, terei todo o gosto em receber-vos no meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa onde hoje as minhas palavras voam em torno do mar vermelho de de Ana Marques Gastão e de uma fotografia com umas cores fantásticas (e desculpem-me a imodéstia).

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É sexta feira, grande dia! 

Tenham, meus Amigos, um dia cheio de amores, de danças, de beijos. 
E, se não tiverem com quem, vão à procura, ou, se não se quiserem maçar, imaginem, sonhem com isso, o que também não é nada mau. 
Sorriam e sejam felizes.


(NB: Já passa das 2 da manhã - se houver letras trocadas, gralhas e outras trapalhadas, já sabem, é do sono, desculpem)

11 comentários:

Anónimo disse...

Que maravilha, divinal, a poesia, a música o texto.
Que belo momento me propocionou.
Obrigada UJM.
aNA

Anónimo disse...

CARA UJM:
Belíssima a festa! Nunca vi coisa assim! Não estive lá, como gostava de ter assistido.
Pela descrição da apara imaginar …não só a alegria, o momento poético como os saborosos amuse-bouche.
E Miguel, sem dúvida, um arcanjo dos céus! Sortuda Eva!

Para si também, dias felizes cheios de amores.
Abraço da
Leanor formosa e segura

Maria disse...

Querida Amiga:
Hoje, a sua Mary, não vai fazê-la rir, porque o texto me fez chorar.
A entrada triunfal de Eva, a ternura de Miguel, as lágrimas dos pais, comoveram-me.
Aquela parte das poesias lindas, de António Ramos Rosa, causou-me um arrepio de emoção.
Achei oportuna e delicada, a ementa.
a) como vê Rufino, tudo tem hora.
Só espero, que como nos contos de fadas, eles sejam muito felizes.
Vou mandar-lhe um mail.
Não vou misturar coisas prosaicas, com este "sonho de amor".
Até já.
Beijinhos
Mary

Anónimo disse...

Que belo texto, que bonita música (gosto bastante de Rodrigo Leão) - e que bela poesia!
(Ah, e...que saboroso jantar!)
Cara “UJM”, permita-me a ousadia do seguinte comentário: das duas uma, ou é escritora (e quem?), ou se não o é – ainda –, é pena. Perdem os potenciais leitores (nos quais me incluo).
Sem dúvida, Mary, tudo tem o seu momento.
Leonor, essa sua sugestão de passeio no Douro é absolutamente deslumbrante. Eu mesmo, que conheço razoavelmente a região (tantas férias ali passei!), fiquei a aprender com estas deliciosas “dicas” que nos deixou no seu comentário do Post anterior. Grato!
Bom fim de semana! Chuvoso (ao que dizem), mas não se pode ter tudo!
E antes esta chuva do que chuva...de impostos e outras “torturas”do Passos de Massamá, que já nos vai preparando para o pior: nem depois de 2015 “teremos sossego”!
É sempre um prazer ler o que aqui escreve. Sobretudo depois de um dia chato!
P.Rufino

Um Jeito Manso disse...

Ana,

Fico muito contente que tenha gostado. Eu ontem estava mesmo cansada, perdida de sono e estava convencida de que não ia conseguir escrever muita coisa. Mas, de facto, como gosto de escrever e como, quando escrevo, adquiro uma certa velocidade própria, a coisa escreveu-se por si e gostei de escrever, ia escrevendo e ficando mesmo animada, como se eu estivesse estado lá a assistir e participar.

E, se quer que lhe diga, até fiquei com pena de acabar a história.

E, claro está, obrigada eu.

Um Jeito Manso disse...

Leanor, formosa, segura, gémea de Eva,

Eu acho que, se me casasse agora outra vez, estava capaz de organizar uma coisa assim. Saíu-me na hora e até me fui deitar a pensar que devia ser gira uma festa assim.

Acho que este casal, Eva e Miguel, estão mesmo bem um para o outro. Gostei imenso de ir escrevendo sobre eles.

Obrigada pelos seus votos. Felizmente não tenho de que me queixar, excepto de que constato o ditado popular - é que, talvez por causa disso, não tenho sorte nenhuma com o jogo. Só jogo no euromilhões (detesto jogar ao que quer que seja, nem xadrez tenho paciência para aprender) mas, nem assim, concentrando toda a 'fé' no euromilhões, me sai nalguma coisa!

Um abraço e uma boa noite!

PS: Um dia destes, se tiver paciência e não achar que estou a abusar da sua boa vontade, poderia complementar o seu roteiro turístico (que aqui em casa já ganhou outro adepto) com a sugestão de um ou dois restaurantes 'à maneira'...?

Um Jeito Manso disse...

Mary, minha amiga,

A sério que se emocionou? Acho graça às palavras que me ocorrem e ao que sai escrito. É que eu vou 'embalando' e às tantas tenho imenso prazer em ir relatando as coisas como se as estivesse a viver. Também dou por mim toda comovida, e vou descrevendo o que eu própria estou a sentir como se estivesse a viver as situações. Será que não sou boa da cabeça...?

Quanto aos seus votos de que eles sejam felizes, quando acabei e fui escrever o título, formulei também esses votos e mesmo com sinceridade como se eles fossem de verdade... até porque já estava a germinar na minha cabeça uma 'sacanagem'...

Dei a história por acabada mas ficou aqui a fermentar uma coisa, envolvendo uma pessoa da história anterior. Mas vou tentar resistir até porque gostava mesmo que esta história fosse uma história feliz.

Um beijinho pelo apoio, Mary.

Um Jeito Manso disse...

Caro P. Rufino,

Como disse acima, fico mesmo contente por gostarem de ler o que escrevo.

Não sou escritora. A minha actividade está nos antípodas disto. Mas gosto muito de escrever. Aliás dá para perceber, não é? Ponho-me aqui a escrever à noite e escrevo, escrevo, escrevo. Mas, claro, quantidade não é qualidade pelo que fico contente se as minhas palavras soarem bem a quem as lê.

Já escrevi tanto entre o que escrevo aqui (e no 'Ginjal') e o que escrevo de relatórios e coisas assim no trabalho que acho que talvez já possa dizer que já escrevi um livro. Também já plantei árvores e também já fiz filhos. Ou seja, acho que já posso ser considerada um homem. (Essa é que seria engraçada, não era...? eu ser, afinal, um homem.... Mas não sou, também aqui não há surpresas, sou uma mulher comum)

E gosto muito de poesia e de música e gosto de cerzir as coisas umas às outras. E, na hora, as ideias ocorrem-me e parece que acabam por se conjugar bem, não é?

De resto, quanto ao jantar... acha que eu ia deixar escapar as predizes...? Nem pensar. Adoro perdizes e adoro batatinhas assadas no forno. Ou seja: guardado estava o bocado para quem o ia comer...

E olhe, P. Rufino: não pense no rapazola de Massamá, que já estamos no fim de semana, é altura de descansar a cabeça.

Abaixo os dias chatos e vivam as coisas boas da vida.

Um bom fim de semana, P. Rufino e agradeço as suas palavras tão simpáticas e incentivadoras!

Isabel disse...

Só acompanhei o fim da história, porque comecei a vir aqui há pouco tempo, mas gostei muito do final feliz.
É bom saber que vão ser felizes para sempre...

Um beijinho e bom fim-de-semana

Um Jeito Manso disse...

Isabel, Isabel,

Agradeço imenso as suas palavras, fico muito contente que, apesar de nova por estas bandas e não tendo acompanhado toda a história, tenha gostado. Palavras destas da parte de quem nos lê, são um incentivo.

Mas tenho que lhe confessar que a sua inocência é um desafio para mim...

Que, até ver, eles estejam felizes não dá para concluir que vão sê-lo para sempre... O que é isso do 'para sempre' em relacionamentos amorosos é uma utopia e, por vezes, uma ratoeira.

'Para sempre' é coisa que não existe.

O que existe é um dia a seguir ao outro e, em cada dia, tentar que seja especial e bom. O 'para sempre' pode ser que aconteça mas é melhor não agir em função disso.

Teorias à parte, não sei se vou resistir à tentação de, por um dia destes, pôr algum destes dois a descarrilar nem que seja para ver se o amor resiste a um descarrilanço dos valentes... Mas não me leve muito a sério, Isabel, gosto de me divertir e gosto de escrever o que, por vezes, produz misturas desconcertantes.

Um abraço, Isabel e bom fim de semana!

Isabel disse...

Até me fez rir!

Bolas! Não me diga que vai "estragar" tudo...

Não é ingenuidade minha, mas vontade de acreditar que é possível amar alguém para toda a vida. Ainda sou desse tempo.
Há poucos casos se calhar, mas ainda se encontram.
Sei que não é fácil manter um relacionamento, mas também acho que as pessoas hoje em dia não se esforçam muito e desistem à primeira contrariedade. Não desistem de nada e num relacionamento é preciso desistir de algumas coisas individuais em favor dos "dois".
Bem, digo eu.
Mas o meu mundo também é diferente do da Eva.

Fico a aguardar os próximos episódios. Hei-se aguentar a sua "maldadezinha" se der uma reviravolta ao caso. O que é que se pode fazer...

Beijinhos