De vez em quando sinto-me intelectualmente muito limitada. Vejo coisas à minha volta que não percebo. E, no entanto, são coisas que, pelo menos aos outros, parecem fazer sentido.
Por exemplo, a rábula marcelista da expedição nocturna de ontem com as televisões atrás. Parecia apenas uma excentricidade, daquelas que ele engendra para as televisões e os telespectadores não se esqueçam dele. Afinal parece que tinha uma mensagem a passar. No fim, falou, com ar ilustrado, com ar de quem tinha sacado de uma cartada de tipo xeque-mate, sobre o azar dos Távoras,
Mas, se bem sei (mas pode ser que esteja enganada), na volta, os Távoras foram mortos só por causa de uma intriga. Ou seja, tiveram aquele tipo de azar desgraçado em que uma praga vinda não se sabe de onde nos cai em cima sem que tenhamos possibilidade de nos defendermos.
Marcelo também falou daquele castigo que consistiu em mandar colocar sal para que nada mais ali medrasse.
Mas ele próprio, com ar de desconsolada constatação, referiu que, afinal, a sanção foi ineficaz.
Acresce que Marcelo terminou a rábula fechando o semblante como quem, depois de ter atirado uma bomba para a mesa, dá a entender que já tinha avisado.
Mas tinha? Marcelo tinha avisado quem? Sobre o quê?
Ou seja, naquela sua rábula quem é quem e qual a moral da história? E qual a história?
Quase se poderia pensar que, ali, estava a assumir, como se não assumisse, que houve mãozinha dele num ajuste de contas, talvez na praga que se abateu sobre o Costa. Mas não pode ter sido isso, pois não? Até porque não há personagens que encaixem naquele enredo nem a conclusão se ajusta a coisa alguma. Ou ajusta?
Estou burra de todo e é tudo clarinho como água...?
Outro exemplo. Ouço, de raspão, o que vai saindo para a comunicação social sobre o que serão as suspeitas no caso Influencer (chapeau para a delícia que são os nomes das Operações...), e fico beige, isto para não dizer banza. É que, do que vi, ainda só vi tretas insignificantes, reuniões aqui ou ali, almoços, levar as meninas no carro... Se é isto, ou eu estou mentecapta de todo ou, então, está tudo doido.
Então se o homem, como pai, normalmente levava as filhas à escola e se agora se desloca no carro do ministério, qual o mal de levar as crianças no carro até à escola, antes de ir para o ministério? Qual o mal, senhores? Está tudo maluco?
E as outras coisas...? Mas pensarão aquelas aves raras que as pessoas do governo governam sem falar com ninguém? Não sabem que, no governo, ministros, secretários de estado, etc, acompanham dossiers, querem saber (e bem) como vão as coisas, querem saber (e bem) se há entraves que possam ser removidos? Se não for isso, então qual o papel do governo? Pensarão que devem ser umas réplicas de sua britânica majestade que não faz nada?
E se há uma visita de comitivas governamentais a instalações de empresas, por exemplo, e se oferecem o almoço a quem lá vai que mal há nisso? Não é isso o mínimo que a boa educação exige?
[Dito isto: se houve corrupção, gente que andou a ganhar dinheiro ilegítimo para favorecer quem não devia em detrimento de quem estaria melhor qualificado, se houve licenciamentos indevidos, emitidos mediante suborno de alguém, se houve coisas assim, então tal deve ser investigado, provado e, se for caso disso, os infractores condenados. E que se apurem responsabilidades rapidamente].
Agora se os membros do Governo andaram a tentar dar corda aos sapatos dos investidores a ver se concretizam os projectos do PRR, não fez mais do que devia. Se tratou disso em reuniões ou telefonemas não fez mais do que devia.
E depois outra coisa: fala-se de milhões e milhões como se só o facto de mencionar milhões já indiciasse corrupção. E eu volto a perguntar: mas está tudo doido? Se os investimentos são destes montantes, e são, achará esta gente do Ministério Público ou jornalistas que quem trabalha ou se ocupa ou acompanha estes projectos ou negócios milionaríssimos são todos uns corruptos?
Digo eu que não. Durante parte da minha vida lidei, profissionalmente, com milhões. E nunca me apropriei indevidamente de um único cêntimo. E como eu, tenho a certeza, as pessoas com quem trabalhei ou que trabalharam comigo.
Portanto, ou há, nesta cegada, coisas palpáveis, com materialidade, em que se veja que os indícios levam mesmo a ver que ali há caldinho a sério ou isto, uma vez mais, é daquelas macacadas em que o MP se tem vindo a revelar exímio. E o pior é se, reconhecendo a miséria do que tem em mãos, faz de tudo para encontrar qualquer coisa e andam anos e anos e anos a coligir tretas para ver se dão corpo à coisa.... enquanto os envolvidos vão envelhecendo, encalhados, num limbo, com a reputação e a vida estragadas.
Enfim. A ver vamos.
Mas é isto? Ou não? A menos que seja tudo claro como água e eu é que esteja burra de todo. Nesse caso, podem fazer a gentileza de me esclarecer?
Agradecida.
7 comentários:
UJM, pelo menos por agora é tipo, SOCRATES V.2. Tudo igualzinho, tudo escarrapachado nos jornais.
Não podia estar mais de acordo consigo!
UJM,eles é que nos fazem burros,€75000 escondidos em livros na residência oficial do Primeiro Ministro?? Está na altura de os portugueses experimentarem outras alternativas governativas,não tratarem os partidos como clubes de futebol onde é permitido tudo e tudo se desculpa...
Vai começar o episódio da vitimização, género já utilizado no passado: A culpa foi do Passos, mas o diabo só veio agora !
A.Vieira
Mas influenciar não é crime. Todos nos influenciamos, até na literatura. O que acho estranho é que, na privatização da TAP, o Ministério Público não pôs aquela gente toda sob escuta.
Cumprimentos
Querida Um Jeito Manso,
Não me sinto muito burra pois em materia de politica não é facil compreendermos tudo o que se passa e o que não se passa mas a comunicação social assim faz crer. Mas sinto-me triste porque a oposição desde sempre trabalha para esta demissão. Apanhou Antonio Costa num mau momento, frágil com a doença da sua companheira.
Espero que seja desta que o Ministerio Publico tenha uma boa limpeza e renovação. Estou convencida que todo este mau folclore, esta histeria, não passe de uma maneira da direita achar que ganha.
Concordo em que ter dinheiro em casa não é sonónimo de ilegalidades. A dificuldade que se sente hoje em levantar 50 mil euros ao balcão de uma qualquer dependencia bancária, não o consegue na hora, levando a perdas de tempo para quem, por exemplo, faz produção de eventos, filmes ou outros.
Contudo neste caso, resta-nos aguardar com esperança.
Saude, paz e paciencia para este mundo mal frequentado
A "rábula" de Marcelo - Deitaram sal encima do Governo PS, muito sal e já lá não vai florescer nada de jeito...
Talvez...?
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