Enquanto estou neste dolce far niente vou observando. Por vezes fotografo, outras vezes não posso. Por isso, não tenho como ilustrar algumas situações que ficariam com mais piada se, em vez de relatadas, pudessem ser vistas.
Paciência.
Assim, as fotografias que aqui vos mostro, feitas estas segunda-feira, nada têm a ver com o que vou escrever. As minhas fotografias são instantes captados enquanto observo mas as que aqui vos mostro são apenas aqueles em que não se reconhecem as pessoas, muito menos aquelas de que vos falarei de seguida. Ou seja, digamos que o que aqui se vê são meras abstracções. Excertos. Peças de um puzzle feito de acasos.
Paciência.
Assim, as fotografias que aqui vos mostro, feitas estas segunda-feira, nada têm a ver com o que vou escrever. As minhas fotografias são instantes captados enquanto observo mas as que aqui vos mostro são apenas aqueles em que não se reconhecem as pessoas, muito menos aquelas de que vos falarei de seguida. Ou seja, digamos que o que aqui se vê são meras abstracções. Excertos. Peças de um puzzle feito de acasos.
No outro dia, quando chegámos, vi um senhor de uns quarenta e tal anos, por aí, talvez cinquentas e picos, não sei precisar. Cabelo quase rapado dos lados e maior em cima, como agora se usa, e uma barba de uns quantos dias. O senhor era de baixa estatura. Estava de calções, tshirt justa, sem mangas, multicolorida. Via-se que cuidava do físico: ombros bem desenhados, barrigas das pernas e bíceps bem nutridos. Hoje encontrei-o ao pequeno almoço. A tshirt e os calções eram outros mas do mesmo género. Para meu espanto, logo a seguir vi outro igual, vestido quase da mesma maneira, mas em ponto grande. Não sei se deixei que a boca se abrisse, tal a perplexidade em que me vi. Segui este segundo com o olhar. Para meu espanto, foi sentar-se na mesa do outro. Iguais, um pequeno, outro grande. Quando saí, iam os dois à minha frente. Iguais. Um o dobro do outro. Pela forma afectuosa como se olhavam e se riam um para o outro, via-se que era um casal. Uma coisa delirante. Na verdade, dir-se-ia até que incestuosa. Gostava de poder fotografar para vos mostrar mas não posso. Mas creiam-me: é tal como descrevi. Um com talvez um metro e noventa e tal, um verdadeiro calmeirão musculado, e o outro talvez com um metro e sessenta, também musculado. Vestidos da mesma maneira, penteados da mesma maneira, barba igual, feições idênticas. Um perfeito nonsense.
À tarde, outra. Vínhamos no passadiço da praia atrás de dois gémeos, vestidos de igual. A diferença é que os calções de um eram às riscas verticais azuis escuras e brancas enquanto nos do outro as riscas eram encarnadas e brancas. Pólos azuis muito escuros. Chapéus de palhinha clara de aba larga e fita preta. Da mesma altura, a mesma compleição, o mesmo andar. Cada um com um saco de pano em cor crua ao ombro. Entretanto, um virou-se: asiático, talvez japonês. Já bem nos cinquentas. Óculos escuros. Estupefacta com aquilo, perguntei ao meu marido, em voz baixa: 'Mas o que é isto? Gémeos? Vestidos de igual? Mas na terra deles vestem-se de igual até serem velhos?'. O meu marido espantou-se: 'Qual gémeos? Tens com cada uma. Não vês que é um casal?'. Fiquei ainda mais parva. Perguntei: 'Japoneses?'. Diz ele: 'Sei lá se são japoneses. Um não deve ser'. Entretanto pararam, o japonês a meter uma pedra de gelo na boca de outro, de óculos escuros iguais, e esse, a seguir, a querer devolver a pedra ao outro, tentando colocá-la também na boca do japonês. De facto, um deles, francamente abichanado, não tinha traços orientais. Mas vestidos de igual? Almas gémeas, só pode. Também seria bom se pudesse fotografar porque, na realidade, só visto. Uma coisa digna dos 'apanhados'.
Na praia, de tarde, ficámos cá mais em cima, ao lado de duas espanholas. Conversaram o tempo todo mas falavam baixo. Era uma música de fundo boa de ouvir. Apenas quando uma chegou a espreguiçadeira dela para a sombra, para mais perto da minha, ouvi que estava a pensar seguir para a Tailândia ou para o Vietname. A outra falava em Machu Picchu. Andariam pelos quarenta e tal. Percebi que falavam de viagens, de irem encontrar outras pessoas, falavam das melhores alturas do ano para visitarem alguns países.
Olhei-as tentando perceber o que faz com que umas pessoas tenham em si, sempre activo, o motor das viagens enquanto outras têm, sempre presentes, os laços da família. À vista desarmada não vi nelas nada de substancialmente diferente de mim. Deve ser uma coisa genética, oculta.
Tirando isso, nada. Não tenho planos para esta segunda-feira. O plano é não ter planos. Talvez leve um livro para a praia na parte da tarde. Na parte da manhã não consigo, o sol é forte, não dá.
Vou vendo os mails do trabalho já que me põem em conhecimento de quase tudo mas fico na minha, caladinha, como se aquilo se passasse noutro planeta. Claro que já fiz uns telefonemas para alguns dos que trabalham directamente comigo mas coisa ligeira, tudo na boazinha, apoiozinho remoto na base do levezinho. A outros, que me convocam para isto, aquilo e o outro, limito-me a responder que estou de férias. Pimbas. E com que prazer sinto que me estou a livrar de belas estopadas. Apenas a um, em que o estupor escrevia uma coisa que me fez chegar a mostrada ao nariz, atirei um petardo. Estúpido como é, em vez de ficar caladinho a esfregar o lugar onde apanhou com ele, resolveu ripostar. E eu nem pestanejei: atirei-lhe um outro, fulminante, que o deve ter deixado de cabeça às voltas. Ainda por cima, como fiz reply all e ele tinha posto o administrador, chefe dele, em conhecimento, o outro testemunhou a tareia que o parvalhão levou. Há coisas que nem a brisa do mar faz com que eu as suporte.
E é isto. E, portanto, assim sendo, termino com duas frases que li na excelente entrevista feita à Lourdes Castro, para o Expresso, pelo João Pacheco (que também a fotografou no seu pedaço de terra, entre árvores e pedras, na Madeira) e que são o seu lema de vida:
Olhei-as tentando perceber o que faz com que umas pessoas tenham em si, sempre activo, o motor das viagens enquanto outras têm, sempre presentes, os laços da família. À vista desarmada não vi nelas nada de substancialmente diferente de mim. Deve ser uma coisa genética, oculta.
Nós, quando os nossos filhos viviam connosco e os meus pais eram independentes e saudáveis, viajávamos bastante. Como já disse muitas vezes, depois, em especial com o AVC do meu pai e o estado sempre periclitante dele, com a idade de ambos que me faz recear afastar-me, e com a vontade de estar sempre disponível para o que os meus filhos precisarem, já não me sinto bem a planear afastar-me muito de casa. Sei que é absurdo -- até porque o meu pai já teve o AVC já nem sei há quanto tempo, talvez há uma dúzia de anos, e os meus filhos têm mais quem os possa apoiar em caso de necessidade -- mas, nada a fazer, é mais forte que eu. Agora já é o mais crescido a desafiar-me a ir passear com ele para fora e isso, tenho que confessar, anda a puxar pelas fibras adormecidas do meu motor de viajeira. Anda, anda.
Tirando isso, nada. Não tenho planos para esta segunda-feira. O plano é não ter planos. Talvez leve um livro para a praia na parte da tarde. Na parte da manhã não consigo, o sol é forte, não dá.
Vou vendo os mails do trabalho já que me põem em conhecimento de quase tudo mas fico na minha, caladinha, como se aquilo se passasse noutro planeta. Claro que já fiz uns telefonemas para alguns dos que trabalham directamente comigo mas coisa ligeira, tudo na boazinha, apoiozinho remoto na base do levezinho. A outros, que me convocam para isto, aquilo e o outro, limito-me a responder que estou de férias. Pimbas. E com que prazer sinto que me estou a livrar de belas estopadas. Apenas a um, em que o estupor escrevia uma coisa que me fez chegar a mostrada ao nariz, atirei um petardo. Estúpido como é, em vez de ficar caladinho a esfregar o lugar onde apanhou com ele, resolveu ripostar. E eu nem pestanejei: atirei-lhe um outro, fulminante, que o deve ter deixado de cabeça às voltas. Ainda por cima, como fiz reply all e ele tinha posto o administrador, chefe dele, em conhecimento, o outro testemunhou a tareia que o parvalhão levou. Há coisas que nem a brisa do mar faz com que eu as suporte.
E é isto. E, portanto, assim sendo, termino com duas frases que li na excelente entrevista feita à Lourdes Castro, para o Expresso, pelo João Pacheco (que também a fotografou no seu pedaço de terra, entre árvores e pedras, na Madeira) e que são o seu lema de vida:
Grava para sempre a alegria na fachada da tua casa [do original, em francês: 'Cloue à jamais la joie au front de ta demeure']e
Caminha como o teu coração te levaBem poderiam ser também o meu lema de vida. E nestes dias de sol, mar, azul, luz e sereno vagar não me ocorre nada melhor para vos desejar também: que a alegria habite a vossa casa e que o coração guie os vossos passos.
4 comentários:
Parabéns! Finalmente de férias!
Por momentos ocorreu-e que também esteja em Lagos, mas seja onde for que sejam dias cheios de tudo de bom, novidades ou certezas de que o Mundo está a mudar muito rápido.
Eu vou tentando acompanhá-lo mas não me é facil. São tantos os casais gay com que todos os dias nos cruzamos que o meu marido brinca e diz-me que em breve vai ser obrigatorio.
Por coincidencia, ou de propósito alguem se esqueceu do livro de Vargas Lloza, Cinco Esquinas, onde estamos. Versa o tema do erotismo entre amigas, estou com curiosidade.
Boas Férias que o Sol promete.
Um beijinho
Também me perguntei se seria Lagos. Também tenho interesse em observar pessoas. Gosto de imaginar as suas histórias. E gosto que, mesmo em férias, tenha mandado dois petardos a quem achou que os mereceu. Gosto sobretudo das duas frases que cita no fim.
Olá Pôr-de-Sol
Sim, férias! O que eu estava a ansiar por elas. E tem razão: Lagos, a bela cidade banhada por mar por todos os lados.
E está um tempo tão bom e a água está tão boa. E as noites...? Tropicais.
Não conheço esse livro. Espero que seja bom pois um livro bom é das melhores companhias que há.
Saúde e dias felizes para si, Sol Nascente!
Olá AV,
Como acima referi: sim, Lagos, a bela. É uma cidade tão boa para se estar. Todas as suas praias são lindas, a terra é bonita, é bom passear à beira mar, o peixe é óptimo, os bolinhos algarvios do melhor que há.
Estar sem nada que fazer a não ser curtir os momentos dão-me largueza de espírito para olhar (de longe, discretamente, as pessoas). Consigo, então, também... E esceve ou fotografa o que observa ou fica tudo dentro de si?
E dias felizes para si, AV.
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