terça-feira, setembro 10, 2019

As lágrimas amargas de John Bercow



Foi com pena mas, na realidade, sem grande surpresa que soube que Bercow anunciou a sua retirada para breve. Personagem muito cá de casa, não podia hoje deixar de aqui o ter. 

No meio da barafunda que os conservadores e populistas lançaram sobre o Reino Unido, era em Bercow que eu via coerência e sentido de Estado, mantendo uma linha de rumo sempre alinhada com o respeito que, na opinião dele, é devido ao Parlamento e, antes do Parlamento, aos representados pelos Deputados, ou seja, ao Povo.

Acresce que tem verbo fácil, raciocínio escorreito, tem bases culturais e elegância na fraseologia, tem agilidade mental, coragem e independência e transmite, a quem assiste de fora, um sentido de liderança, de mestre de cena sábio e experiente. Com um Parlamento desorientado, era Bercow que repunha a linha que não devia ser pisada em alturas em que, por vezes, parecia que já não existia linha nenhuma. Acresce ainda que tem sentido de humor, esse plus com que as pessoas verdadeiramente inteligentes costumam brindar as pessoas com quem lidam. E eu gosto muito de pessoas com sentido de humor, que -- ao contrário de gente ensimesmada e auto-convencida -- são geralmente boa gente.

Não é à toa que Bercow escolheu as datas, não é à toa que disse o que disse nas vésperas da suspensão do Parlamento. Num Reino onde a Majestade a sério manda tanto como a rainha de cera, num Parlamento em que à frente dos Conservadores está um pseudo-avatar do Trump e à frente dos Trabalhistas está um auto-atado e em que os demais partidos não riscam, o processo em que os britânicos se enfiaram, um verdadeiro beco do qual não se vê qual a saída, o futuro é cada vez mais nebuloso e a saída de Bercow uma notícia triste.

Uma palavra ainda para a emoção que revelou ao fazer o anúncio. Mostrou que respeita o lugar onde trabalha, que tem um vínculo relevante com os que lá trabalham e que ama a sua família. E mostrou outra coisa: mostrou que não apenas age racionalmente como é, também, uma pessoa que saudavelmente dá larga às suas emoções.

John Bercow: o anúncio da despedida para breve -- e as lágrimas



Os louvores a Bercow por parte das bancadas



Alguns momentos memoráveis de Bercow



Order!



E a suspensão do Parlamento entre 'Shame! Shame!'


Não é em lágrimas que acabo este post mas acredito que haja muitas lágrimas na despedida de Bercow

2 comentários:

Belinha Fernandes disse...

A saída dele é tão, tão lamentável. É o final de uma era! Parece um exager, mas é!

Um Jeito Manso disse...

Olá Belinha,

É um atentado ao que tínhamos por adquirido, é uma tristeza, é desconcertante. É preocupante.