Quando eu era menina e moça, jovem púbere, no liceu tínhamos que usar bata. Uma bata branca de um feitio pré-definido. Uma coisa que hoje me parece estranhíssima. Mas era assim. Os rapazes não, só as raparigas. À distância, tudo naquela altura me parece aberrante. E, tirando nós mesmos, tudo era mesmo aberrante.
Por essa altura, eu andava perdida de amores por um colega que também se perdia de amores por mim. Mas, como todos os grandes amores entre gente pequena, a coisa, ao princípio, não era completamente explícita.
Eu tinha uma grande amiga que eu achava muito bonita, de quem gostava muito e de quem era inseparável. Mas, de vez em quando, tinha ciúmes dela. Parecia-e quase impossível que ele não se sentisse atrído por ela. Aparentemente não tinha mas eu, se calhava vê-los juntos, logo sentia aquela pontada (que, diga-se em abono da verdade, foi o máximo que, desde que me conheço, consegui a nível de ciúme). Uma vez zanguei-me com ele (o que acontecia frequentemente) e ele em vez de sair do liceu comigo, saíu com ela. Fiquei roída. Uma afronta sem perdão. No entanto, não deixei de gostar menos dela porque sempre achei que ela não tinha culpa de ser tão bonita. A minha fúria era com ele. No dia seguinte vinguei-me dele, fiz-lhe toda a espécie de ciúmes. Para ele não ser parvo. Mas, à tarde, já eu estava arrependida de ser eu tão parva porque na véspera a culpada tinha sido eu e nada justificava que persistisse, agora fazendo-lhe ciúmes escusados. Então, toda humilide, arranjei maneira de lhe dizer que, gira como ela era, compreendia que ele se interessasse por ela. Olhou para mim admirado como se tal coisa nunca lhe tivesse passado pela cabeça. Disse-me que a ela lhe faltava qualquer coisa, que andava com os braços colados ao corpo, que não levantava a cabeça, que parecia que lhe faltava vida. Fiquei espantada com isso. Nunca tinha reparado em tal coisa. Achava que uma cara bonita e um corpo bem feito bastavam para que um rapaz achasse piada a uma rapariga. Mas ele disse-me, com sentimento, que gostava era de mim. E eu perdoei-lhe tudo, mesmo aquilo que ele não tinha feito.
Por essa altura, o meu corpo já estava a ganhar formas. Eu não estava segura de que o meu corpo fosse bonito. Pelo contrário, achava o corpo dessa minha amiga muito mais elegante que o meu. Toda ela era mais longilínea e isso parecia-me a perfeição. Isso e o cabelo. O cabelo dela era fininho, liso, esvoaçava quando lhe dava o vendo, parecia seda. O meu era uma juba revolta. A minha mãe dizia que não fosse parva, que tomara ela ter o cabeço farto e forte que eu tinha mas isso não me convencia nem fazia diminuir a admiração que eu tinha por aquele cabelo sempre penteado, sempre com ar elegante. Mas o corpo. Os meus seios cresciam, as minhas ancas arredondavam-se. A minha bata ficava justa. Uma vez eu queixava-me, que a bata estava a ficar-me apertada, que parece que ficava melhor às outras do que a mim, que detestava ver-me de bata. E, então, ele disse uma coisa surpreendente: 'Eu gosto. És tipo viola'. Fiquei sem perceber mas não pareceu grande elogio. 'Tipo viola? O que é isso?'. E ele, jovenzinho adolescente, fez um ar meio tímido e com as mãos fez aquele movimento de um homem a contornar as curvas de uma mulher. Foi a primeira vez que vi aquele gesto. Não percebi bem a lógica e a beleza da coisa mas passei a aceitar melhor as minhas curvas e intuí que ele estava a ficar um homem.
Entretanto, comecei a prestar mais atenção à forma como o meu pai, os meus tios e amigos falavam das estrelas italianas da altura. Uma vez mais, eu olhava as fotografias delas nas revistas e não achava pingo de piada. Pareciam-me matrafonas, formas exuberantes demais, feições marcadas demais, maquilhagem a mais, tudo exagerado. Lembro-me de achar a Sofia Loren horrível, uma boca que não acabava. À Monica Vitti achava-a eu horrível, uma cara estranha. Achava a Claudia Cardinale bonitinha mas vulgar. A Gina Lollobrigida parecia-me uma mulherzinha baixinha, corpinho ridículo de tanta curva e contra-curva, com os seios estupidamente espevitados. Sobre a Alida Valli ouvia eu sempre falar com uma admiração especial, como se fosse alguém num patamar à parte. Eu olhava e não percebia qual a diferença entre ela e qualquer outra mulher bonita que se visse na rua.
Só já bem mais tarde, eu já mulher feita, vendo a Monica Belucci, comecei a perceber o conceito. Sobretudo é a sensualidade que transpira das mulheres italianas, cheias de curvas, vibrantes, de bem com o seu corpo e com Eros.
Só já bem mais tarde, eu já mulher feita, vendo a Monica Belucci, comecei a perceber o conceito. Sobretudo é a sensualidade que transpira das mulheres italianas, cheias de curvas, vibrantes, de bem com o seu corpo e com Eros.
Mas, naquela minha tenra idade, para mim beleza era a Françoise Hardy, a Brigitte Bardot, essas que, a meus olhos tinham um ar moderno, natural, descarado, pouco convencional. Nada como aquelas outras italianas, muito mulherzinhas, todas anquinhas, todas muito penteadinhas.
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Moral da história
Moral da história
O que se passa é que o que a gente vê é função dos olhos com que a gente vê. E e capacidade de visão dos nossos olhos varia com a idade, com o ambiente, com tudo. Hoje olho aquelas belas italianas e acho-as fenomenais. E custa-me até a perceber como até não há muito tempo eu não via isso. Mas é a vida. Acho que vamos percebendo melhor as coisas.
E esta conversa toda só porque estava, na preguiça, aqui a passar os olhos pela Vogue francesa e dei com um espaço dedicado às Les plus belles actrices italiennes de tous les temps. E, vendo-as, lembrei-me do que vos acabo de contar.
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E, para terminar, um striptease: aquela tal que eu achava horrível despe-se para um encabulado Mastroianni
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E, agora, para os que calhem estar interessados no meu umbigo, um convite: queiram descer um pouco mais. Fica aqui um pouco mais abaixo.
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