domingo, dezembro 10, 2017

Keeping up with Marcelo
[The Kardashian' show is coming to town...?]
Oh Oh Oh






Em Portugal, digno sucessor das Kardashians, Marcelo Rebelo de Sousa está de grande. Dado o cargo que ocupa, com a comunicação social sempre à disposição e com a imaginação titilante que se lhe conhece, ele tem guião para 24 horas por dia à frente das câmaras.



Ele alerta para ..., ele apela a ..., ele envia recados a ..., ele distribui afecto a ..., ele visita os ..., ele pendura a roupa a ..., ele vai fazer a barba ao ..., ele ensina os ..., ele teme que ..., ele chama a atenção para ..., ele ouve as ..., ele abraça os ..., ele vai engraxar os sapatos a ..., ele dá beijinhos a ..., ele tira selfies com ..., ele explica o ..., ele antevê o ..., ele ri com ..., ele faz festinhas na cabeça de ..., ele serve a comida a ..., ele arruma os caixotes de..., ele está sempre pronto para ..., ele faz adeus a ... ..., ele entra no carro, ele sai do carro ..., ele faz muitos smiles ..., ele está sempre lá, ele está sempre nas nossas casas. Ele é... the only and only Mr. President, o único, o fantástico, o sempre acordado,  o sempre disponível, o ubíquo Marcelo. 


A Presidência transformada num reality show -- 24 hours with the President -- e nós seguindo-lhe os passos vinte e quatro horas por dia. Marcelo na Quinta, Marcelo e a Secret Story, Marcelo e o Desafio Final, Keeping up with Marcelo, Marcelo em Belém.



Não que sejamos mal agradecidos. Eu, pelo menos, não sou. Não mesmo. Fez-nos esquecer o Cavaco, introduziu algum cosmopolitismo na política (que se tinha enfiado num bueiro pafiento), trouxe de volta a Belém os bons modos, limpou o mau olhado da Dona Cavaca, deu um chega para lá no Láparo, afastou-se dos cães com pulgas que antes pululavam na política nacional. E isso é bom. Devemos-lhe isso. Não é coisa pouca. Obrigada, Prof. Marcelo. A sério.



Mas o pior é o resto. O pior é a dose, é a falta de foco, é a sensação que nos fica de que o que quer é 'canal', que tudo fará para manter a atenção das câmaras para que os seus passos, as suas 'bocas', os seus sorrisos e abraços estejam sempre, sempre, sempre a ser filmados, noticiados, comentados. Cria suspense dando a entender que vem aí o bicho mau, insinua temores para poder aparecer como profeta ou como candidato a salvador da pátria, deixa uns alertas para criar caso e alimentar primeiras páginas. E, a toda a hora, nos aparece: ora porque vai ver os sem-abrigos, ora porque vai ajudar no Banco Alimentar ou a feiras de Natal ou a barbeiros no Intendente ou a Lares de terceira idade ou a escolas de meninos, ou porque vai ver apagar fogos, apadrinhar cervejas, vai ver avionetas que caíram, vai ter com advogados, juízes, recebe professores, enfermeiros, médicos, responde a funcionários do infarmed e de onde calhe, vai apanhar a vacina da gripe, vai tomar banho à praia, vai aqui, ali, acolá -- mas tudo isso em contínuo e sempre com a comunicação social a dar notícia, muitas vezes, já nem se percebendo o propósito.


É demais. Acaba por desgastar a sua imagem junto dos portugueses mais exigentes e menos carentes. E dá argumentos ao Láparo que, em tempos de má memória, lhe chamou catavento. 


Dir-se-á que o target de Marcelo são, sobretudo, os desvalidos, os desempregados, os reformados, as domésticas, as dondocas solitárias: ou seja, sobretudo, a malta que está muito tempo em casa a ver televisão e que já está por tudo -- habituados a apresentadoras aos gritos, a ex-polícias armados em investigadores com pedigree, psicólogos de meia tigela, primas que não sabem dos tios, filhos que não se dão com as madrastas, patrões que não pagam a empregados, senhoras que ligaram demais para as linhas de valor acrescentado e que se admiram com a conta de telefone, ou seja, pobres coitados que já papam de tudo o que lhes apareça na televisão. Portanto, aparecer-lhes um presidente sempre sorridente a dar beijinhos, abracinhos e a fazer selfies a torto e a direito já parece coisa mais que normal. É uma companhia. É a Cristina Ferreira e o Goucha e os seus convidados, a Júlia Pinheiro e os seus entrevistados, o João Baião e os seus amigos, a Teresa Guilherme e as caras larocas da quinta e ... o Marcelo e os seus velhinhos desdentados que o babam com beijinhos e as suas senhoras mamalhudas que lhe dão apertados abracinhos.


Contudo, tirando esse público-alvo, depois da operação de limpeza que levou a cabo em Belém e depois do efeito surpresa junto do eleitorado, o que começa a sobrevir aos olhos dos portuguesas é o cansaço por tão omnipresente figura e algum feeling de que estamos a assistir a algo que começa a roçar o ridículo.


Inteligente como é, estou certa que Marcelo há-de perceber que, se quer continuar a merecer a aceitação de grande parte da população, deverá calibrar a sua actuação. A menos que seja mais forte que ele ou a menos que o novo assessor, o datado Zeca Mendonça, não o saiba demover, nem mesmo à canelada, estou certa que Marcelo se esforçará por não nos maçar mais do que a conta.



Daí que daqui lhe deixo um pensamento que deverá ter sempre em background e que os que lhe querem bem deveriam colar-lhe nos vidros do carro, no ecrã do computador, em post-its espalhados everywhere, em bilhetinhos deixados nos bolsos das calças e dos casacos: Less is more.













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Keeping up with the Kardashians




Keeping up with Marcelo -- alguns exemplos


Marcelo na Graciosa



Marcelo na Feira da Agricultura




Marcelo ao banho no 1º dia do ano



Marcelo 112



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Less is more, Mr. President. Do not forget.

Não queira ficar para a história como o membro português do clã Kardashian.

E olhe: quem avisa seu amigo é.

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