Hoje estou incapaz de escrever. Já adormeci para cima de umas cinquenta vezes e daqui a nada tenho que estar a pé.
Há muito assunto por aí, quase a gente se distrai e dá um pontapé num, mas o sono não me permite a devida atenção: antes que me baixe para perceber se a topada foi numa pedra ou num assunto, já estou caída nos tentadores braços do Morfeu. Embora isto do Morfeu seja uma maneira de dizer que eu, quando durmo, sou mais na base da pedra do que da sonhadora. Mas, enfim, com o adiantado da hora dá-me para a metáfora. E claro que o uso aqui da palavra metáfora também não é o mais adequado mas isto é a gente a falar. Digamos assim.
Por isso, estou aqui nesta langórvia (coisa que, com vossa licença, me soa como derivada de langor), ensonada, degustando a sensação boa de estar entre cá e lá, e vendo um programa que me está a encantar. É na RTP 2, ouço o canto dos pássaros e falam de árvores, de arbustos, uma senhora mostra como faz os bonsais, estão ao ar livre, e falam de coisas que me agradam: da forma dos ramos, de seiva, de dialogar com as árvores. Fui ver ao site da rtp e o programa chama-se, justamente, Paraíso.
Já contei que acho que gostaria de ser jardineira? Já devo ter contado. Que maçada, isto, de vos maçar com repetições. Mas que hei-de eu fazer? Apagar isto que acabei de escrever? Não, vou mas é em frente e quem já sabe disto, põe as mãos nos olhos. Continuando, pois. Quando andava a escolher árvores para plantar in heaven, ia a viveiros nacionais, municipais, onde calhasse. Havia um que era para mim a arca do tesouro e eu gostava de por ali andar, à conversa com as jardineiras, elas a descreverem cada árvore, contando as suas características, e eu a absorver cada gota de informação, a passar a mão por elas, árvores de todas as espécies. Muitas vezes, antes de ir trabalhar, saía muito cedo de casa e rodas para que te quero, lá ia eu ter com elas. Elas de botas, aventais impermeáveis, luvas, e eu saída da voiture, saltos de agulha, ar de quem está mais para salões onde se bebe do fino do que de quem gosta de sentir a terra húmida, o ar denso de mil odores. Já as conhecia e elas já conheciam esta que vos escreve. Conversávamos de árvores, de filhos, do tempo, do cuidado a ter com elas, se são de ter sede, se são caprichosas. Eu queria saber se eram de crescer depressa e elas diziam que eram de levar o seu tempo. E o que eu gostava destas conversas.
Vinha de lá carregada de saquinhos pequenos com rebentos de árvores. Andava o resto da semana com o carro a cheirar a terra húmida e com mil cuidados para que tivessem ar para respirar, para que não tivessem muito calor -- e a pedir a todos os santinhos para não ter que dar boleia a ninguém lá dos tais que pisam corredores atapetados, que iam estranhar aquele cheiro e aquela falta de cheiro a carro lavado, tablier encerado, peles dos estofos odas devidamente lustrosas.
As árvores cresceram e se calhar aquele viveiro já não está lá. Não sei que será feito daquelas mulheres que eu invejava. Pareciam-me tão próximas da terra, como se as pernas rijas fossem troncos e os braços ramos e os sorrisos flores.
Mas isto até nem vinha a propósito. Isto é do sono. Se calhar estou a precisar de férias. Cai-me o trabalho em cima de uma forma um bocado disparatada. Chega o verão, apetece-me entrar num período de abrandamento e é o contrário: parece que tudo o que estava no limbo, se apressa a desabrochar, rebentando-me nas mãos. Penso tantas vezes: por esta altura da minha vida eu pensava, há uns anos lá bem para trás, que estaria a ser presidente de uma câmara. Achava que me realizaria transformando uma cidade, modernizando-a, tornando-a bela, elegante, próxima e amiga dos cidadãos. Mas bastou que o presidente de um partido dissesse ao meu marido, num dia em que ele lhe contou desta minha ideia: ela que venha falar comigo. Só isto. Pensei: o tanas. Jamais sacrificaria a minha independência para atingir um objectivo. Pus a ideia de lado. Mas isto para dizer que antevia que, chegada ali a meio da vida profissional, me fartaria de trabalhar em empresas e passaria a conduzir eu a minha vida e a gestão de uma grande cidade. Afinal ainda por aqui ando, entre empresas, num ritmo que não abranda, que me absorve para além daquilo que eu antevia. Em vez de ter jardineiras com quem conviver, só vejo homens atarefados à minha volta. E homens atarefados, cheios de projectos, são uma canseira. Para já, de forma geral, falta-lhes sentido prático e capacidade para dar um passo atrás, admitir que erraram, que o caminho não era bem aquele. Não, isso não fazem. Para a frente e não se fala mais no assunto. Se as empresas tivessem jardineiras em cargos de gestão talvez este mundo fosse um lugar mais aprazível.
Mas, enfim, é o que é. As mulheres são incómodas, colocam questões, não se importam de pôr tudo em causa. São bravas. Por isso, os homens fazem de tudo para lhes vedar a passagem para as augustas salas onde tudo se decide.
Mas adiante que esse não é o tema que aqui me traz. (E dizendo isto até parece que sei o que é que aqui me traz. Só visto.)
Agora na RTP 2 ouço falar de Andy Warhol. O tema parece ser a Pop Art. Mas se me ponho só a ver, conforme agora me apetece, então, é que não saio disto. E eu tenho que ir ver se durmo antes que o despertador toque e eu ainda aqui a jogar conversa fora.
Bem. Rematando à baliza (e a ver se tenho mais sorte que aqueles três pobres coitados que falharam os três penalties lá no jogo que acabou por ser o passe para o Ronaldo ir ver os bebés encomendados que a D. Dolores foi buscar aos States): vi há bocado, enquanto estava a dormir, o vídeo que abaixo partilho convosco com duas mulheres que love, love, love ver a representar: Meryl Streep e Diane Keaton. No vídeo, a primeira louva a segunda, que está a ser homenageada e eu, vendo-as, acho-as tão bonitas. Filmes memoráveis que aquelas duas ali já nos deram a ver. Não fora o estado de sonolência absoluta em que me encontro e incluía aqui um best of. Mas já não dá, fica para outro dia.
Meryl celebra Diane: uma graça estas duas mulheres.
Abençoadas.
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As fotografias celebram o Dia do Flamingo Cor-de-Rosa que é bicho que se calhar até vem a condizer com a minha prosa, quiçá loura e vestida de pink. Já não digo nada.
Lá em cima, Rosemary Joshua interpreta Verdi piante, erbette liete de Handel (e eu sinto que é sacrilégio desperdiçar tamanha beleza no meio de um post tão fajuta mas, fazer o quê?, a cabeça pode não dar para mais mas os ouvidos são ambiciosos e eu gosto de estar em boa companhia musical enquanto para aqui estou nesta conversa mole).
E já sabem: por favor relevem as gralhas que temo que tenham vindo em bando aqui pousar. É que não consigo rever o que escrevi e, durante o dia, também não conseguirei fazê-lo. Espero é que não sejam daquelas de arrepiar porque, se forem, só lá para a noite é que consigo aparar-lhes o cabelo (ia dizer torcer-lhes o pescoço mas esse espírito bélico não está com nada nem se coaduna com o espírito peace and love que caracteriza este meu ninho).
E já sabem: por favor relevem as gralhas que temo que tenham vindo em bando aqui pousar. É que não consigo rever o que escrevi e, durante o dia, também não conseguirei fazê-lo. Espero é que não sejam daquelas de arrepiar porque, se forem, só lá para a noite é que consigo aparar-lhes o cabelo (ia dizer torcer-lhes o pescoço mas esse espírito bélico não está com nada nem se coaduna com o espírito peace and love que caracteriza este meu ninho).
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Um dia feliz a todos.
Saúde e alegria, minha gente.
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