O Povo é quem mais ordena - cantemos também
[Grândola Vila Morena, cantada por manifestantes neste quente mês de Setembro]
Este ano está a ser, para mim, o ano de todas as iniciações. A primeira anestesia, a primeira cirurgia, etc, etc, a primeira manifestação, e, hoje, a primeira manifestação da CGTP.
Muitas vezes, ao longo da minha vida, fui muito contrária às posições da CGTP. Parece-me, quase sempre, um sindicalismo retrógrado, totalmente alinhado com o PCP. Mas, tal como no dia 15 de Setembro não fui para gritar contra a troika (porque, de momento, ainda não podemos viver sem apoio externo, o que temos é que fazer, e já!, é negociar, bater o pé) mas sim para dizer não a estas políticas e a estes políticos, fui especialmente para mostrar que estou contra os incompetentes e ignorantes que nos governam, também neste 29 de Setembro fui para a rua porque é na rua, todos juntos, mostrando o vigor e a energia de um povo unido, que podemos conseguir mudar o rumo dos acontecimentos.
Lá fui portanto.
Enquanto nos aproximávamos todas as ruas iam dar ao Terreiro do Paço. Casais com filhos, idosos, grandes grupos oriundos de vários pontos do País, gente com bandeiras, cartazes feitos em casa, muitos jovens.
Uma vez mais o povo saíu à rua |
Ao chegar junto ao Cais das Colunas algo me chamou a atenção: algo avançava nas águas. Fiz zoom e captei a imagem.
Cão nadando a grande velocidade no Tejo, com uma gaivota seguindo os seus movimentos |
Um grande cão. Maravilhosa imagem: o Tejo azul, o céu azul, o Terreiro do Paço transbordante de gente, e, enquanto isso, aquele cão ali andava a banhos. Que engraçado.
Mas impressionante foi, de novo, o imenso mar de gente. E depois as pessoas, milhares, muitos, muitos milhares de pessoas cantaram o Grândola Vila Morena. É muito emocionante ouvir em uníssono uma canção como esta. Há momentos especiais que todas as pessoas devem poder viver.
Poderia aqui mostrar-vos muitas das fotografias que fiz nas quais se vê a multidão. Mas já sabem que eu prefiro mostrar os pequenos apontamentos, os cartazes interessantes, as pessoas. Penso que, para quem não esteve lá, mostrando estes aspectos particulares, conseguirei transmitir melhor o ambiente.
Uma vez mais digo que, se algum dos retratados não permitir que a sua imagem aqui apareça, bastará que mo diga que logo a retirarei.
O que mais desperta a minha atenção e emoção são as pessoas de idade e as crianças. Estar nestes grandes ajuntamentos, em que é preciso andar bastante, pode não ser fácil para quem tem mais idade e, em especial, para quem venha de longe.
Um futuro difícil mas, enquanto existirem flores, haverá esperança |
O calor apertava e nem a proximidade da água refrescava, em particular aqueles que percorreram longos caminhos para cá chegar.
Desencanto, preocupação mas, apesar das dificuldades, sentido de cidadania |
Um dos aspectos mais gritantes quer nesta manifestação quer na de 15 de Setembro é o desprezo que todos os muitos milhares de portugueses mostram por Passos Coelho e pelos ministros do seu Governo.
É impossível a alguém governar um país que lhe perdeu o respeito, que goza com ele, que o trata por burro, por incompetente, por gatuno. É isto que está a acontecer a Passos Coelho. É humilhante para ele.
Coelho vai p'ra toca |
A imaginação e o sentido de humor sai àrua nestes dias. As pessoas dão-se ao trabalho de escrever, desenhar, de montar, de transportar, de exibir os mais diversos gritos de revolta,
Contra o bullying política |
E, no dia em que o vendilhão de Portugal, o avençado António Borges, chamou completamente ignorantes a todos os empresários portugueses, dizendo que não passariam no primeiro ano do seu curso (isto depois de na antevéspera Passos Coelho lhes ter chamado cobardolas e queixinhas), cá temos um cartaz em que o dito vendilhão é uma das figuras de proa.
Vieram peritos em habilidades... (o António Borges, o Gaspar-não-acerta-uma, o etíope do FMI e o Senhor.Professor.Doutor.vai.estudar.ó.Relvas) |
Mas o Gaspar aparece em vários cartazes. O maior nabo, o aprendiz não sei de quê, o que espantilha todas as contas públicas, o fulano que até hoje ainda não conseguiu acertar uma e que, mais grave ainda, ainda nunca percebeu nada do que se está a passar, é um dos mais gozados. Foi outro que virou cartoon, anedota.
Não se vê aqui o cartaz inteiro mas eu conto-vos: Estou... a... foder... vos... deva... garinho |
Mas há um que é a gargalhada geral. O grande estadista Miguel Relvas, aquele que anda escondido, aquele que é amigo de espiões, que ameaça jornalistas, que quer despachar a RTP para os amigos e que tem uma carreira académica de mão cheia, e que, por mais inacreditável que possa ser, ainda é ministro, virou cartaz cómico.
Miguel Relvas: Doutor Horroris Caca |
E depois, claro, sempre, nas mais variadas formas, temos o ex-doce, o maior responsável pelo desgraçado estado da nação, o Passos de Massamá, o marido da D. Laura, o Pedro do facebook.
Um polvo chamado Nini - duração de vida: e meses |
E o sentido de humor, sempre o sentido de humor. O Coelho a violentar (digamos assim) um cidadão deu-me vontade de rir apenas pela ideia e pelo grafismo. Mas se nos lembrarmos que é isso que ele anda a fazer a milhões de portugueses, a coisa perde a graça.
Já chega! PORRA - diz o Zé povinho ao Primeiro-Ministro |
À hora a que vos escrevo estou a ver na televisão a violência da polícia carregando sobre os manifestantes em Madrid. Em Portugal não há nada disso. As pessoas manifestam-se a sorrir, a cantar e os polícias manifestam-se juntamente com o resto da população.
Ouviu-se um grande aplauso quando chegou a coluna da PSP e GNR. As bandeiras ondulavam, hasteando os valores da fraternidade.
A PSP e a GNR ao lado do povo, contra este Governo e contra as suas políticas |
E depois há o sentimento geral de que os políticos que agora estão no poder são mercenários, gatunos. São palavras que se multiplicavam pelos cartazes. Nas mãos de um belo sorriso juvenil, estes cartazes têm ainda mais impacto.
Mercenários (Cavaco à frente do grupo composto pelo Governo) e Falas de barriga cheia - devolve as regalias e vai mas é trabalhar malandro! |
E, claro, há a revolta, os lamentos, o sentimento de injustiça.
Os reformados não são lixo! Não ao confisco dos subsídios. É imoral! É ilegal! |
Muito engraçada também a declaração desta jovem ex-simpatizante do PSD. O cabelo ocultava a parte de cima, mas o que se via era elucidativo.
Sou leal à Social Democracia mas não ao 1º Ministro Pedro Passos Coelho traíu e trais os princípios e valores do PSD |
E depois houve de novo a força imensa da juventude, da beleza, da irreverência. Quando os jovens acorrem em força, da forma como eu tenho visto, temos que ter esperança. Talvez esta seja a hora em que os jovens vão perceber que têm que se interessar pela política, que têm que lutar pelo seu futuro.
Sorrisos, flores, cor, alegria, graça - e a vida pela frente |
E os chapéus? Fantásticos. Adorei este aqui abaixo. Adorei.
Um guerreiro no Terreiro do Paço |
E, no fim, já quase no rescaldo, o calor...? E a sede...? E o convívio...? E a joie de vivre...?
A beleza da juventude... e que haja cervejas para todos |
Claro que esta manifestação foi diferente da de 15 de Setembro. A de 15 de Setembro em Lisboa congregou essencialmente pessoas de um meio mais urbano, e era notória a predominância das classes média e média alta. A deste sábado era uma manifestação convocado pelos sindicatos de todo o país e, portanto, via-se gente vinda da província, de meios rurais, talvez ainda do que sobra de meios fabris. E achei tocante ver toda aquela gente, muitos com aspecto muito humilde, outros com ar de quem vinha a Lisboa, todos mobilizados e festivos. Havia bandeiras da CGTP, havia palavras de ordem, havia organização e isso é um aspecto relevante e que merece ser saudado. É importante que os trabalhadores estejam organizados e que tudo se processe de forma tão ordeira. Mas, depois, havia também todas as outras pessoas de Lisboa e arredores que se lhes juntaram, gente, tal como eu, que não se identifica com muita da praxis sindicalista nem com os mandamentos dos partidos ditos comunistas e que estava ali apenas para se insurgir contra a destruição que está a ser levada a cabo no país. E via-se de novo muita gente 'muito bem' (desculpem-me a expressão), ou seja, via-se, de novo, gente muito heterogénea. E esta mescla é dos aspectos mais marcantes numa concentração desta dimensão.
Pessoalmente, reconheci-me mais na de 15 de Setembro, muito espontânea, muito mais alegre e emotiva. E de 29 de Setembro teve, em meu entender - e estou à vontade para falar porque sou estreante nestas lides - algumas características que tendem mais a desmobilizar do que a congregar: os discursos intercalados por palavras de ordem, o discurso longuíssimo de Arménio Carlos, já não são forma de cativar e motivar as pessoas.
Já na de 15 de Setembro me pareceu que faltou qualquer coisa que 'prendesse' um pouco as pessoas quando chegaram à Praça de Espanha. Chegaram ali e acabou.
Ou seja, parece-me que seria uma forma bastante interessante de prender e mobilizar as pessoas se o palco e as instalações sonoras fossem aproveitadas para que se ouvisse poesia declamada, canções projectadas nos ares, e, talvez, pelo meio, pequenas intervenções de opinião e mobilização.
O que aconteceu com o discurso de Arménio Carlos e o que aconteceu também na ausência de qualquer coisa na Praça de Espanha foi o mesmo: um imenso mar de gente com disponibilidade para se manter por mais tempo unido e atento e empolgado e que acaba por dispersar sem que tenha havido, digamos assim, um momento de clímax.
Seja como for, foi bom, e só o facto de vermos a população a sair à rua, a percorrer as ruas com vontade de dizer BASTA e de o dizer de peito feito e cara destapada, já é uma vitória.
E, portanto, depois foi tempo de regresso. As camionetas que vieram de longe, abrigavam geleiras, cestas, cabazes e, na hora de voltar à terra, fizeram-se pic-nics mesmo ali e as caixas com entrecosto frito, com pastéis de bacalhau, passavam de mão em mão, e toda a gente comia e bebia, feliz, animada.
Estas são as formigas trabalhadoras que ao longo dos tempos alimentam as inúteis cigarras como António Borges, Passos Coelho, Miguel Macedo, Vítor Gaspar, Miguel Relvas, Paulo Portas e outros |
Este é o povo que começa a levantar-se e a cantar Acordai!, este é o povo que percorre os difíceis caminhos da democracia e da liberdade. Este é o povo que recomeça a sentir que são nossos todos os caminhos.
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Uma vez mais, saíu-me longo este post. Cheguei a casa muito tarde. Depois estive a passar as fotos para o computador, a escolher algumas de entre as muitas que fiz. E só agora, e já passa um bocado das 2 da manhã, estou a acabar isto. Por isso, peço desculpa aos meus queridos Leitores que comentaram o post anterior (quer do Um Jeito Manso quer do Ginjal e Lisboa) por hoje não responder mas estou mesmo cansada. Amanhã também vou ter um dia cheiinho que nem um ovo mas arranjarei tempo para responder, está bem?
Também não consigo manter os olhos abertos por mais tempo pelo que não vou nem espreitar o que acabei de escrever. Por isso, se descobrirem letras trocadas, vírgulas a mais, a menos ou fora do sítio ou gralhas de qualquer tipo, relevem, sim?
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Desejo-vos um belo domingo. Despedimo-nos de Setembro, o mês da doçura, que foi tão quente. Esperemos que Outubro não seja ainda mais quente mas, se for, que o seja por uma boa causa.