segunda-feira, outubro 04, 2021

O que são os Pandora Papers?

 

Devo dizer que acredito que Nuno Morais Sarmento, Vitalino Canas e Manuel Pinho não serão os únicos portugueses envolvidos. Estão a ser divulgados, creio, porque, sendo políticos, foram 'apanhados' no primeiro filtro da selecção. 

Acredito que, tal como de outros países., é provável que empresários portugueses e talvez gente do mundo do espectáculo e/ou futebol -- alguns se calhar de forma ocultada através de mulheres, filhos ou pessoas de confiança -- também de lá constem.

Como se refere nos vídeos abaixo, nem toda a gente que se movimenta nestes meios é criminosa ou a caminho de o ser. Haverá razões 'legais' que possam proteger alguns. E, note-se, que há muito boa gente do beau monde que não dá passo sem aconselhamento em optimização fiscal recorrendo aos melhores especialistas, frequentemente também muito bem integrados no beau monde (sejam de escritórios de advocacia sejam das melhores empresas de consultoria).

Relembro que quando se fala em paraísos fiscais não estamos forçosamente apenas a falar de destinos recônditos ou mediáticos. Também por cá (a nível insular) temos regimes fiscais de excepção e que são entidades que agem às claras que tratam da componente administrativa para que tudo esteja 'legal'. 

E, contudo, analisando a forma como aquilo funciona, espantamo-nos com o desplante de se ter uma tamanha fuga ao fisco de forma pretensamente legal. Quem defende aquilo, alega que, se não for ali, é noutro sítio qualquer. Tretas. Poderia não ser em lugar nenhum. E poderiam os gananciosos que querem pagar menos impostos, resignar-se a pagar pela mesma bitola que o comum dos mortais. Mas, enfim, se calhar isso seria num outro mundo, não neste.

E o que penso é que vai sendo tempo de os Estados se entenderem para acabar com esta descarada pouca vergonha. De facto, enquanto houver um, haverá hipótese de por lá passar o dinheiro.

Ocultar capitais ou usufruir de um regime fiscal especial ou seja o que for não me parece coisa compatível com a exigência democrática a que todos deveríamos estar obrigados. E já não falo em lavagem de dinheiro ou encobrimento de toda a espécie de ilicitudes. Acho tudo isso uma pouca vergonha, mesmo que apenas se trate de pagar menos impostos..

Mas se, em meu entender, as offshores e os paraísos fiscais deveriam pura e simplesmente ser banidos, que não se conclua que os três portugueses já identificados, lá por constarem dos ficheiros, praticaram actos ilícitos. Já se sabe que a comunicação social vai agora correr como um cão atrás de um osso em vez de ir ao fundo da questão.

E há um aspecto que eu gostaria de ver sociologicamente explicado: no caso mais benigno, o de apenas querer pagar menos impostos, o que leva alguém a correr riscos (legais ou reputacionais) para aforrar uns trocos como se fosse viver infinitamente? Não pensam, essas pessoas, que não faz sentido arriscar a prisão ou arrastar a sua honra pela lama, apenas para disporem de mais dinheiro para além do mais que muito de que já dispõem, como se fossem viver esta vida e mais dez a seguir? Acham que vale a pena o risco? Ou acham que nunca ninguém vai saber?

Há coisas que poderão fazer sentido nos regimes ditatoriais, oligárquicos, atrasados e fechados. Agora em países ditos civilizados, que sentido fazem estas práticas...? Ao pensar nisso, só penso que aquela gente o que é é uma cambada de burros.

Mas, enfim, a palavra à Guardian investigations team:

Pandora papers: biggest ever leak of offshore data exposes financial secrets of rich and powerful

(...) More than 100 billionaires feature in the leaked data, as well as celebrities, rock stars and business leaders. Many use shell companies to hold luxury items such as property and yachts, as well as incognito bank accounts. There is even art ranging from looted Cambodian antiquities to paintings by Picasso and murals by Banksy.

The Pandora papers reveal the inner workings of what is a shadow financial world, providing a rare window into the hidden operations of a global offshore economy that enables some of the world’s richest people to hide their wealth and in some cases pay little or no tax. 
There are emails, memos, incorporation records, share certificates, compliance reports and complex diagrams showing labyrinthine corporate structures. Often, they allow the true owners of opaque shell companies to be identified for the first time.

The files were leaked to the International Consortium of Investigative Journalists (ICIJ) in Washington. It shared access to the leaked data with select media partners including the Guardian, BBC Panorama, Le Monde and the Washington Post. More than 600 journalists have sifted through the files as part of a massive global investigation.(...) 

What are the Pandora papers? - segundo o The Guardian



What are the Pandora Papers? - segundo o Washington Post



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Até já

1 comentário:

Paulo B disse...

Olá UJM,

A questão é mesmo essa: a esmagadora maioria dos casos são legais (ou são pelo menos dúbios). Mas é o grande problema! É que se fosse uma questão de ilegalidade... Talvez a solução fosse mais "fácil". O chocante são estas tramóias, ao alcance só daqueles que mais têm - e muitos, lá está, com dedo na criação das próprias normas legais. É ainda mais chocante quando a circulação de pessoas é alvo de tanto entrave, de situações eticamente criminosas, mas quando se trata de capital (e dos seus detentores) estes podem.circular livremente. Em muitas situações nem sequer precisam de mostrar a sua entidade. Imagine ir para um país sem uma qualquer identificação: seria tratada como gado. Mas se for virtualmente, com o seu dinheiro - se este for uma boa quantia - até lhe estendem a passadeira vermelha! :)

Abraço,