Passei de carro numa rua perto da Baixa e, para meu espanto, vi duas mulheres estranhamente vestidas, penteadas, pintadas, calçadas. Vestidas exactamente de igual. Apressadas como se nem se dessem conta que estavam completamente descontextualizadas, no meio de gente que saía dos trabalhos e de turistas em veraneio. Assim de repente, pareceram-me duas gémeas bizarras. Aperaltadas que só visto. Cabelo apanhado, com o que me pareceu ser uma flor no puxo, saia com um farto rodado em godé, num tecido estampado, espampantemente florido, pareceu-me que de tamancas altas. Pensei: Mas onde é que aquelas duas vão naqueles preparo, ó senhores?
Só depois de ter passado por elas me ocorreu: Ehh...! Vão para as marchas, só pode... vão representar algum bairro.
E tive pena de já terem ficado para trás, de não poder observá-las com o devido cuidado e admiração.
Só depois de ter passado por elas me ocorreu: Ehh...! Vão para as marchas, só pode... vão representar algum bairro.
E tive pena de já terem ficado para trás, de não poder observá-las com o devido cuidado e admiração.
E, naquela de ir distraída no meio do trânsito e de ter sido surpreendida por aquele curioso par de gotas de água colorida, pensei: que estupidez, amanhã é feriado e nem me ocorria que é feriado não por um qualquer motivo abstracto ou facto histórico mas por ser dia do santo da cidade. Estamos nos Santos, caraças. E, por uma breve fracção de segundo, vacilei: Qual é mesmo o santo? O santo de Lisboa...? Vicente? Vicente e os corvos? Mas os santos são João, Pedro e... António. António e não Vicente. E senti como que um buraco negro na cabeça onde as ideias se baralharam, uma espécie de vertigem. Como é possível ter tido uma espécie de branca sobre o santo de Lisboa...? Mas logo recuperei o tino e, convictamente, acertei o passo comigo mesmo: É dia de Sto António e não se fala mais nisto. Mas, logo que pude, no primeiro semáforo encarnado que apanhei, tentei perceber qual a raiz da dúvida: Sto António é o Santo Padroeiro de Lisboa? E percebi a razão da minha perplexidade. Ser o Vicente até é, embora quase ninguém se lembre de tal coisa, mas o carequinha casamenteiro destronou-o no coração dos alfacinhas que são mais dados a casórios do que a corvos esvoaçantes.
E adiante.
Hoje não é véspera de fim de semana mas é como se fosse e, por isso, fomos passear à beira do rio e ver a noite a tombar sobre os veleiros, ver a escuridão a misturar-se com tudo, as luzinhas cintilando. Não fomos dançar, comer sardinhas sobre o pão ou festejar os santos: pelo contrário, andámos ao vento, sentindo o ar frio, conversando.
Hoje não é véspera de fim de semana mas é como se fosse e, por isso, fomos passear à beira do rio e ver a noite a tombar sobre os veleiros, ver a escuridão a misturar-se com tudo, as luzinhas cintilando. Não fomos dançar, comer sardinhas sobre o pão ou festejar os santos: pelo contrário, andámos ao vento, sentindo o ar frio, conversando.
E se durante o dia algumas arrelias vieram ter comigo e se a impaciência por vezes parece querer toldar a minha consciência, a verdade é que basta um cheirinho de maresia, o olhar deslizando sobre as águas, para logo os incómodos voarem para longe e a serenidade vir pousar docemente sobre a minha pele. Isto de uma pessoa ser completamente primária não é mau de todo.
Enquanto aqui escrevo preguiçosamente vou espreitando a televisão, vou espreitando os livros que, aqui ao meu lado, preguiçam também e hesito em mostrar um vídeo fantástico que me deram a conhecer ou deixá-lo para mais tarde. Se calhar fica para depois, que eu gosto de guardar distâncias e também não quero explicar porquê. Sou de alguns mistérios e tenho as minhas razões para isso.
Mas se o vídeo que gostaria de aqui partilhar a mim me diz muito -- para além de que tem a ver com um tema muito actual, e ponham actual nisso -- para não defraudar a minha vontade de vos mostrar um vídeo com uma mensagem (e agora apetece-me encafuar a mensagem também entre aspas porque acho que isto de as coisas terem mensagem é daquelas coisas cafonas para as quais não tenho o mínimo de pachorra), deixem que partilhe outros dois vídeos, um que mostra como até os animais não aguentam a injustiça de retribuições díspares para trabalhos iguais e outro que mostra o mesmo mas entre sexos.
As escolas deveriam passar a ter aulas de cidadania, ensinando as crianças a lutarem pela justiça a todos os níveis. Isso é que deveria mesmo ser.
E, a todos, um bom Dia de Santo António!
[E um bom Dia Feriado aos sortudos que, tal como eu, têm uma semana santa]
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