terça-feira, março 12, 2019

Canto ostinato





É que se calhar nem é do que faço em cada dia mas do acumulado de anos. Porque hoje o dia nem foi dos piores e, no entanto, parece que só me apetece dormir. Mas, antes de me ir, vou contar uma coisa.

À hora do almoço voltei a pecar. Como sempre, não ia tocar, muito menos cheirar ou inalar. Curada do vício. Mas nem foi preciso: bastou ver. Um porque tem a ver com a maneira de pensar dos artistas e eu disso não passo sem, gosto de saber como pensam os artistas. Outro porque achei que era a cara do meu marido e só o facto de eu assim me expressar já diz muito da minha motivação. Cabin Porn. Quando à noite lhe dei e disse isso, que era a cara dele, olhou desconfiado e disse: 'Não me lembro de ter pedido nada'. Conhecendo-me como me conhece viu logo que ali havia coisa. Expliquei-lhe que é para ter em que se inspirar quando resolver dedicar-se à coisa. Continuou desconfiado. Tive que desvendar que era para ter ideias quando tiver vontade de construir, com as suas próprias mãos, um refúgio no bosque. Arranjou logo um contra-argumento: 'É para depois cair em cima da cabeça de alguém'. Desculpas. Mas agora fui à procura e não encontrei o livro. Cá para mim esteve a ver antes de dormir e escondeu-o para não dar o braço a torcer. 


Tirando isso, é de referir que esta segunda-feira usei uns sapatos que a minha filha me deu. No outro dia, disse que não gostava do formato, que não usava, perguntou se eu queria. Achei bonitos, de uma boa cor, indefinida. O meu marido viu-me a vir com um par de sapatos, ficou admirado: 'Mas que sapatos são esses?'. Contei-lhe. Achou uma parvoíce: 'tem algum jeito? E tens alguma falta?'. Até parece que não me conhece. É que sou disto, de aproveitar tudo. Até nos pratos. Se algum dos meus deixar uma espinha mal limpa ou um osso mal roído, só se fizer muita cerimónia é que não rapino do prato alheio para dar largas aos meus instintos de animal dos antigos. O meu marido passa-se. Não quero saber. Portanto, hoje já me empoleirei em cima de uns sapatinhos usados, para mim novos, que, apesar de altos, são bem confortáveis. Ainda senti algum aperto no peito mas isso é que ainda não estão feitos ao feitio do pé.

Bem. Como até cheguei mais cedo e estando o jantar já despachado, pus-me a descansar no sofá e a descobrir coisas de outro mundo. E descobri no alto de uma escarpa: mel. Abaixo mostro os caçadores de mel, uma coisa extraordinária.


E depois o YouTube que já percebeu que ando nesta onda bem comportada, alérgica a partidarices bacocas e a políticos mal arraçados, resolveu presentear-me com um vídeo bem engraçado. E engraçado é uma forma de expressão. Ou melhor, é falta de vocabulário. Porque o que eu queria dizer é que embirro com filmes moralistas porque lições de moral eu só consigo receber de gente que não se rala muito com a moral mas, desta vez, abro uma leve excepção porque aquilo de que aqui se trata é o pão nosso de cada dia. Toda a gente a dar palpites e a fazer juízos de valor sem saber nada de nada sobre os assuntos. Pre-conceitos é o que, por aí, mais abunda -- e eu própria, que gosto de me imaginar desempoeirada, luto frequentemente contra a minha cabeça para me libertar deles.

Before You Judge Someone - WATCH THIS




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E pode parecer que é mais uma que não tem nada a ver -- e se parece é porque é -- mas gostava muito que vissem este bailado. Infelizmente são apenas escassos segundos. Mas quanta coisa neles cabem. Maravilhosos. Tal como lindas as pinturas de Suk Chul-Joo.

Canto Ostinato -- uma coreografia de Lucinda Childs




Dias felizes para todos.

4 comentários:

CCF disse...

Só faltou uma imagem dos sapatos:)
E um bailado com eles...
~CC~

Isabel disse...

Também sou de aproveitar coisas das minhas irmãs e/ou sobrinhas. Quando estava magra dava para ficar com mais coisas giras, agora estou gorda, já não dá:(

Quanto ao rapinar dos pratos...já sou mais esquisita, muito esquisita (não sei se a UJM estava a falar a sério ou a brincar).

Conhecia um video parecido, com o das bolachas, mas a situação passava-se numa sala de espera de um aeroporto. Bem, eu não sei se teria paciência para deixar tirar as "minhas" bolachas. Acho que me exaltava logo. Claro que depois teria de pedir desculpa, quando me fizessem ver que aquelas não eram as minhas!...Mas o filme é interessante e mostra-nos que nem tudo o que parece é!

Beijinhos e continuação de boa semana:))

(Então mais uma recaída no vício? Eu também comprei um policial, da nova Colecção Vampiro)

Um Jeito Manso disse...

Olá ~CC~,

São mesmo de cor indefinida, entre o cinzento escuro e o verde escuro profundo, altos, confortáveis. Só que dançar com eles só mesmo quando estiverem feitos ao pé...

E olhe, já é o dia seguinte mas, ainda assim, muitos parabéns pela sua menina. Que ela tenha uma vida longa e feliz. E parabéns também à mãe da menina.

Saúde e alegria, ~CC~

Um Jeito Manso disse...

Olá Isabel,

Eu também sou uma recicladora: aproveito o que me dão. Mas o que a mim me deixa de servir também dou.

E isso dos pratos é verdade, sim. Mas, claro, só o que não passou pela boca de ninguém, coisa posta de lado. Gosto de roer ossos, gosto de aproveitar tudo o que há para comer nas cabeças dos peixes, por exemplo. Há cá em casa quem prefira o peito, a carne seca, a posta do meio. E eu fico com os ossos, a cabeça, as espinhas. Tenho alma de bicho vadio, rafeiro.

E é verdade, Isabel, recaí. Mas foi coisa pouca, livrinho pequenino. Não conta...

Beijinhos, Isabel, e dias felizes.