Ao virmos no carro, ouvimos aquele senhor a quem chamam dinossauro e que se entrega à defesa dos interesses dos Bombeiros (e digo-o agora em sentido literal e não pejorativo), Marta Soares de seu nome, a ameaçar fazer guerra ao Governo.
Parece que ficou arreliado com as recomendações da Comissão Técnica que estudou os últimos incêndios e mais ainda por António Costa querer mexer no sector, querer dar formação certificada aos Bombeiros, querer pôr a mão num feudo de que há tempos se fala (e nem vou agora alongar-me até porque, pelo meio, há algumas acusações graves e eu não gosto de me fazer eco daquilo que não está provado). E então, vá lá saber porquê, em plena cerimónia, partiu logo para o desconchavo e desatou a ameaçar o Governo -- mas a ameaçar de um forma feia.
Quem ouvisse Marta Soares diria que estava a falar na qualidade de dirigente desportivo, invectivando o clube adversário e esculhambando, sem decoro, as iniciativas do Governo. O meu marido, sportinguista indefectível, disse: 'É apoiante do Bruno de Carvalho. Está tudo dito'.
´Depois acrescentou: 'E é do PSD. Daqueles ditos autarcas dinossauros'. Lembrei-me, então. Na altura, quem lhe sucedeu acusou-o do estado de endivadamento limite em que tinha deixado a Câmara. E lembrei-me também de o saber ligado às Comissões Políticas concelhias e distritais e Conselho Nacional do PSD. Portanto, se calhar aqueles inusitados chaimites na voz do chefe dos soldados da paz estão mesmo explicados.
Mas fiquei a pensar: tomara que esta gente não se sinta estimulada com o gás que Marcelo anda a dar nem se sabe bem a quê e que pode ser facilmente aproveitado por quem quem queira entrar numa de bota abaixo.
É fácil a Marcelo falar como se tivesse sido ungido pelos santinhos para pairar sobre a terra queimada, lares de terceira idade, ruas e ruelas, salões de cabeleireira, e, numa de porta-voz dos descamisados, andar a dirigir bocas a incertos, quase parecendo que os incertos não são senão os membros do Governo. A malta gosta de ter um inimigo e Marcelo, com o que anda a fazer, talvez até apenas porque lhe está na massa do sangue, anda a forjar um, quase como se o Governo tivesse sido o culpado dos incêndios e como se agora, num estalar de dedos, fosse possível reerguer casas, empresas, florestas, e devolver a vida ao que ardeu -- e, não o fazendo de súbito, por artes mágicas, mais inimigo ainda se torne.
Diz Marcelo que vai fazer e acontecer, exigir sem parar e, aparentemente, dirigir. Esquece-se que os portugueses, em maioria, reconhecem que prevenir e reconstruir coisas dessa natureza é competência do Governo. Deste Governo. E que a maioria acredita que Costa vai consegui-lo.
Os portugueses gostam, quando a emoção aperta, de ter o seu momento mariquinhas mas, uma vez recompostos, apreciam aqueles que arregaçam as mangas e deitam mãos à obra, não os que aparentemente mais não fazem do que bater perna, mandar bocas e fazer selfies transbordantes de smiles.
Não é com beijinhos a velhinhas e abraços a torto e a direito, quase feito Evita Péron, que as zonas queimadas se vão reerguer, nem a desertificação do interior ou o abandono da floresta se vão resolver, nem os incendiários postos a descoberto e tratados, nem... nem...
Naquele seu insano frenesim, se Marcelo não cai na real e não perceber que vai estatelar-se caso continue por este caminho, ainda se torna num factor de instabilidade em vez de ser aquilo que se espera dele. Veremos os Marta Soares desta vida a surfar a onda da demagogia -- e isso é a última coisa que o País precisa numa altura destas.
Portanto, Caríssimo Senhor Presidente, durma um pouco mais, pare para pensar, modere a franga que existe dentro de si e que está sempre pronta a soltar-se, deixe o Governo trabalhar, transmita aos Portugueses que, nesta árdua tarefa, estamos do mesmo lado. Apreciaremos isso, pode crer.
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Para os que se queixam que ando a falar muito de política e a entregar-me pouco à rêverie, sugiro que deslizem por aí abaixo e vão de visita aos poetas que habitam o meu heaven.
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