Nem sempre possa dar largas à minha imaginação ou à minha vontade. Nem eu nem ninguém, acho eu. A vida vai criando mecanismos para nos cercear, sejam eles económicos, sociológicos, de índole interior ou outros. Acontece-me tantas vezes ter vontade de fazer coisas e ter que me auto-moderar. Contudo, verdade seja dita, sempre que posso dar largas à minha vontade, não alimento receios ou restrições.
In heaven estou, a todos os níveis, em minha casa. Esta é a minha terra, o meu pedaço de chão, o lugar do mundo onde posso ser quase tudo. Aqui inventei caminhos, escadas de pedra, plantei árvores e bancos à sua sombra (que, na altura, era apenas uma ilusão já que as árvores pouco mais tinham que um palmo), sonhei muros onde o vento se detivesse e pudesse ter espaços de conforto e puro desfrute, desenhei uma lareira que seria feita com pedra da montanha, enfiei estantes dentro das paredes e criei um risco de que hoje ainda não me restabeleci, inventei um jardin zen, criei uma capela, enchi telas de pinturas, fiz tapetes de arraiolos, decorei uma casa de banho com parede azul escura, louças pintadas à mão e espelhos dourados... e nem sei que mais. E desenhei paredes onde pudesse ter pinturas e poemas.
Já muitas vezes aqui os mostrei mas o número de leitores vai aumentando e, não me conhecendo de outros posts, acontece que alguns estranhem algumas coisas que digo. Por exemplo, no outro dia contei que um rapaz que lá tinha estado a fazer uns arranjos nos disse que tinha levado a mulher para ela ver e que ela tinha gostado muito dos poemas.
Recebi então mail de uma leitora que me perguntava se eu tinha escrito poemas nas paredes. Respondo aqui: por acaso, sim, L.. Em algumas pintei à mão poemas de Nuno Júdice, Maria Teresa Horta, Herberto Helder. Mas o tempo tem desbotado as cores e as fotografias já não os mostram bem. Um dia vou ter que repintar essas paredes e reescrever alguns poemas, provavelmente outros.
Mas a maior parte da poesia está em painéis de azulejos. Numa oficina de azulejaria mandei fazer painéis uns com poemas manuscritos e outros com reproduções de pinturas. O que mostro é uma parte. O prazer em conceber cada espaço, em escolher os poemas, em dispô-los... isso é das boas, maravilhosas memórias que vivem em mim.
E agora que o tempo já deixou impressas as suas marcas, é com deleite que ando por estes caminhos -- aspirando o perfume das árvores e dos arbustos que rebentam desta terra tão pedregosa e, afinal, tão fértil -- e vou lendo os poemas. É como se os poetas de quem eles nasceram também vivessem aqui e por aqui andem acompanhando os meus passos, guiando-me nas descobertas que sempre faço -- os pássaros, as flores, o desenho que a luz desenha, as sombras nas pedras, o musgo, a caruma, os cheiros, as nuvens, a lua branca, a dourada folhagem, um sino tocando ao longe.
E agora que o tempo já deixou impressas as suas marcas, é com deleite que ando por estes caminhos -- aspirando o perfume das árvores e dos arbustos que rebentam desta terra tão pedregosa e, afinal, tão fértil -- e vou lendo os poemas. É como se os poetas de quem eles nasceram também vivessem aqui e por aqui andem acompanhando os meus passos, guiando-me nas descobertas que sempre faço -- os pássaros, as flores, o desenho que a luz desenha, as sombras nas pedras, o musgo, a caruma, os cheiros, as nuvens, a lua branca, a dourada folhagem, um sino tocando ao longe.
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