terça-feira, novembro 07, 2017

Em vez do sacrossanto Web Summit,
a harmonia das cores de outono in heaven

Y, sin embargo, es mucho haber amado,
haber sido feliz, haber tocado
el viviente Jardín, siquiera un día.





Por uma vez. Ou melhor, por uma primeira vez (porque não posso garantir que não volte a acontecer), vou aqui fazer uma coisa que é contra os meus princípios.


Explico-me.

Não gosto de mostrar fotografias feitas por mim que não as do próprio dia. Parece-me que só me faz sentido se for o que vi há pouco, como se, divulgando-as mais tarde, já não correspondessem à verdade e, portanto, já estivesse a vender gato por lebre. Manias minhas. Como se, a cada dia, as coisas deixassem de o ser. E, mostrando depois, estivesse a mostrar uma coisa que já o não é. 


É a mesma lógica que me leva a fotografar mil vezes a mesma coisa e achá-la sempre diferente. 

É a luz, são as sombras, a patine do tempo, a transformação das coisas, etc. -- tudo muda. Um muro com o desenho que a sombra das folhas aí imprime, a cor do musgo, as texturas dos troncos das árvores, os castelos ou os monstros feitos de nuvens, o vento das ramagens, a metamorfose desde a flor ao fruto, o reflexo do mundo numa pequena mancha de água -- tudo, a mim, me encanta como se fosse coisa nova, como se estivesse a assistir à inauguração do mundo. 

Mas hoje vou abrir uma excepção e mostrar fotografias velhas, do fim de semana.


E também me explico.

A questão é que passei o fim de semana in heaven. Fiz umas fotografias, claro. Mas fiz também algumas limpezas e tive lá parte da turminha e, já se sabe, com programas assim, o tempo que sobra é pouco ou nenhum.


As crianças adoram lá estar e não param nem dão descanso. Entre comerem, brincarem, correrem lá para fora, correrem lá para dentro, por vezes cada um para seu lado mais, volta e meia sem casaco e já está a escurecer e um gelo que arrepia, e, entretanto, o bebé que come, dorme e, no intervalo, só quer brincar ou andar no laré ao colo, não me foi possível ver as fotografias que tinha feito, passá-las para o computador, arranjar tempo para fazer um post com fotos escolhidas. 

Impossível. 

Portanto, tive que optar: ou era um capítulo do folhetim ou as fotos do outono in heaven. E estava mais in the mood para o folhetim.


Contudo, fiquei com pena. Se um dia me der para ser saudosista e me encher de paciência para ver o correr do tempo aqui, no Um Jeito Manso, parece que poderia haver um hiato se aqui não pusesse algumas destas fotografias. Também mania minha, claro. O mundo acontece mesmo sem o registo dele. Mas parece que ficaria a memória incompleta sem estas fotografias que testemunham as minhas caminhadas ao som dos pássaros, envolta em doçura e perfumes familiares e bons.

Claro que muitas mil vezes mais gostaria de vos mostrar o sol a brilhar no cabelo da minha menina mais linda, a agilidade futebolística de um dos meninos, os meninos a subirem pela escada para irem tirar folhas das telhas, o sorriso encantador do bebé... e etc e tal. Mas como tenho isto de aqui não mostrar os meus amorzinhos, fico-me pela paisagem.

Portanto, explicações dadas e desculpas apresentadas, permitam que aqui coloque fotografias de sábado ou domingo.


Como dará para perceber, ao fim da tarde pôs-se mesmo frio. Tenho andado sempre sem meias, ou melhor, só com aqueles pezinhos de algodão que apenas cobrem a sola do pé, os dedos e o calcanhar, ou seja, que não são visíveis com sapatos calçados (e penso que não fui a única já que o tempo esteve de verão até há pouco e andar sem meias tem sido a regra) mas, naquele momento, arrefeceu de tal forma que tive que calçar umas meias que lá tinha e pôr um poncho de lã sobre a blusinha. E tão habituada estava à roupa fresca de verão que achei tão inédita ou inusitada esta vestimenta outonal que resolvi registar o momento e fazer a selfie acima.


E, uma vez mais, vestígios de chuva e, uma vez mais, umas cores maravilhosas, quase como uma pintura amorosamente feita.

Houve um Jardim ou tal Jardim foi sonho?
(...)
E, no entanto, é muito ter amado,
Haver sido feliz e ter tocado
o vivente Jardim, mesmo um só dia.

in

Adam Cast Forth - Jorge Luis Borges



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PS:

Assumo: o Web Summit a mim não me diz nada. Não digo que não seja coisa boa, cheia de coisas úteis. O que digo é que a mim não me diz nada. O futuro, cá para mim, não passa (so) por aqui. O futuro, cá para mim, há-de ser outra coisa. Mas isto sou eu -- e eu é como se nem fosse de cá.


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Até já.

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