quinta-feira, maio 21, 2020

A inteligência de Jacinda







Dia de sol, a primavera a arrebitar. Dia também de muitas aventuras. A minha filha disse que a fauna resolveu aproximar-se de nós. E, com essa aproximação, vieram arrepios, sustos, gritos.

Mas hoje não vou falar nisso pois a reportagem fotográfica com que complementaria o post comportaria imagens de alguma violência e o tema de hoje pede mais o flower power do que perseguições, violências e desfechos fatais.

Hoje participei numa reunião que, no contexto que foi e para o fim em vista, foi muito importante. Era uma reunião formal. E, como reunião formal que era, uma daquelas reuniões que é o exemplo acabado do que é o mundo dos homens, se um resolve mostrar que está presente no escritório, todos os outros receiam ficar atrás e apresentam-se todos no escritório. Embora cada um estivesse em seu sítio já que a reunião foi uma videoconferência, os homens estavam de fato e gravata a condizer com o local de trabalho e com a formalidade da reunião.

Também escolhi o meu poiso com cuidado bem como foi com cuidado que escolhi o meu outfit. Uma blusinha sem mangas, decotada, às flores, uma alegres flores amarelas e brancas sobre fundo preto. E o local em que me instalei foi também a condizer. Não me pus com estantes atrás, com pinturas a óleo ou com pesados candeeiros a mostrar que sou pessoa responsável. Não, fui para a rua. Sentei-me num banco de pedra, debaixo de uma azinheira na qual os pássaros cantavam desvairadamente. Como estava uma gostosa aragem, a sombra e o sol passeavam na minha cara. Estive para começar a reunião dizendo que esperava que o canto da passarada não os incomodasse mas não sei porquê esqueci-me de tal mas penso que ficou claro que o local em que se está não condiciona, por si só, a produtividade. Há quem pense que teletrabalho é igual a férias e esteja deserto para retomar a 'normalidade', não percebendo que, se com equilíbrio e uma correcta adequação, o teletrabalho pode ser uma opção bastante inteligente. Claro que nem todos os trabalhos o permitem mas, permitindo, o teletrabalho deve ser equacionado com abertura e inteligência.

Foi, pois, com contentamento que vi que, uma vez mais, Jacinda Ardern mostrou que é uma líder para os novos tempos. Toda a gente reconhece como esta mulher descomplexada, sem preconceitos e com a ousadia que caracteriza aqueles a quem a inteligência não atrapalha, é estimada pelo seu povo e anda sempre uns passos à frente dos líderes de outros países.

Uma vez mais, Jacinda inova e arrisca ao avançar com a sugestão de que, para equilibrar trabalho e tempo pessoal e para ajudar a relançar a economia e o turismo local, os empregadores pensem na semana de trabalho de quatro dias.

Fosse por cá e o meu apoio estava tomaticamente dado.

Tenho centenas de anos de vida profissional e uma coisa posso eu testemunhar: se o trabalho estiver eficientemente organizado, se apenas se fizesse o que é relevante, se se pusesse de parte tudo o que é absurdo e burocrático, se as pessoas se focarem no que têm que fazer em vez de se entreterem com frioleiras e desnecessidades, ou o horário de trabalho poderia passar para cinco horas por dia ou a semana de trabalho para quatro dias. E isto posso eu garantir.

E mais: entusiasticamente estou com a Jacinda. Com mais tempo de lazer ou de descanso, não apenas toda a gente poderia ser mais feliz como o mundo seria outro. Consumir-se-ia mais cultura, mais turismo interno, ser-se-ia mais tranquilo e feliz, haveria menos stress, deixaríamos de passar pela vida feitos estúpidos.

Transcrevo do DN -- e só espero que António Costa, um dos melhores líderes europeus, também perfilhe a ideia e desafie os empresários e gestores portugueses a avançarem por aí:
Numa conversa em vídeo ao vivo no Facebook, Ardern explicou que numa altura em que as fronteiras do país continuam fechadas e o desconfinamento já começou, até porque a Nova Zelândia tem sido dos países mais eficazes a lidar com a pandemia de covid-19 e em reduzir a curva de infetados e mortes, o turismo doméstico ganha importância.
Nesse contexto, a primeira-ministra diz: "Tenho ouvido muitas pessoas a sugerir que deveríamos ter uma semana de trabalho de quatro dias. Em última análise, isso é algo entre empregadores e funcionários. Mas, como já disse, temos aprendido muito com a covid-19 e temos visto uma produtividade e flexibilidade das pessoas que trabalham em casa que é prometedora".
Sendo assim, Ardern conclui que a semana de 4 dias "iria claramente ajudar o turismo no país", daí deixe a sugestão: "incentivo todas as pessoas a pensarem nisso, nomeadamente se é um empregador e está numa posição em que isso pode funcionar na sua empresa".
Nem mais. Só espero que os políticos do meu país abram a cabeça e ponham os olhos na Jacinda. A bem do país e dos portugueses, sigam o seu exemplo e incentivem o mundo empresarial. E comecem por dar o exemplo na administração pública.

O mesmo tema pode também ser lido, com maior desenvolvimento no Guardian: Jacinda Ardern flags four-day working week as way to rebuild New Zealand after Covid-19.



This is an opportunity for a massive reset

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As flores vêm pela mão de Brandy Kraft e são para quem tão generosamente me lê, estando aí desse lado a fazer-me companhia.
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Um bom dia com alegria. 
E com saúde e motivação.

1 comentário:

Anónimo disse...

... a mais-valia da Jacinda Ardern também se prende com o facto de ela ser mulher e agir como mulher. Isso ficou bem evidenciado aquando do atentado terrorista. Parecia que este tinha sido perpetrado contra um seu filho.
Como somos antípodas, desejo ardentemente que ela faça um buraco do caraças e venha ter a este lado, precisamente à Assembleia da República, onde as nossas mulheres gostam muito de dar uma de homens. E já agora que que puxe as orelhas a quem se põe em cima da burra a dar uma de grilinha falante. Já não há pachorra!