quinta-feira, outubro 12, 2017

O tempo das gaivotas




A água quente, a temperatura do ar -- seja de manhã, seja de tarde ou à noite -- sempre agradável. Os restaurantes cheios, os hotéis lotados. Mas tudo tranquilo. É gente que madruga, que janta cedo. À hora a que nós chegamos, estão eles a sair. Alemães, sobretudo. Mas também ingleses, italianos. E franceses. E alguns árabes, alguns espanhóis. É Outubro e está-se melhor que no Verão.

De noite deixamos aberta a porta que dá para a varanda. Então, estamos na cama a ouvir o mar. Consigo perceber o som das águas quando se recolhem e, logo a seguir, o som quando se desdobram e vêm espraiar-se na areia. A minha respiração quase se sincroniza com o movimento das ondas.

Por vezes, a aragem agita-se e ouve-se também o som das ramagens oscilando na noite. É um som leve, quase discreto.


Enquanto escrevo, quase às escuras, penso que é bom adormecer ouvindo o mar assim, uma massa imensa plena de vida, com uma vontade muito própria. Não é o som tranquilo da água nas fontes ou nos rios: é um som que transporta uma plenitude que está muito para além do deleite humano, uma energia indomável que apenas podemos contemplar ou ouvir conscientes da nossa humilde condição.

O tempo de desfrute é curto, muito curto, mas não faz mal. É bom na mesma.

Melhor seria se não houvesse mails, telefonemas, mensagens, stresses remotos, pedidos de apoio a que não se pode negar uma palavra. A tecnologia avança e vamos ficando escravos. Supostamente a qualidade de vida deveria melhorar e não o contrário mas, enfim, como diria aquele a quem dantes aqui chamava ex-bebé e que agora é um menino grande, já no 1º ano: 'Isso é outra história'.


O que sei é que o nosso país é uma maravilha, o tempo quente é uma seca mas proporciona uma rica vida a quem se esqueça de coisas sérias e se limite a usufruir o bom tempo à beira-mar.

E eu sinto-me nas sete quintas, entre gaivotas. Fotografo-as, caminho no meio delas, deixo-me ficar por ali, olhando uma, outra, vendo o seu reflexo no espelho de água que se forma quando a maré recua, vendo como abrem as enormes asas, ouvindo os seus gritos.

As escassas horas voam, tenho que andar, não posso ficar no meio das gaivotas. Também não posso ficar acordada a ouvir o mar. Nem posso suspender o tempo.


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