quinta-feira, maio 15, 2014

O vídeo de dois valentes rapazes que resolveram passar pela experiência de dar à luz (salvo seja) e, de caminho, recordação de quando dei à luz os meus filhos


Acho que já o contei, talvez até mais do que uma vez. Tive os meus filhos pelas vias normais, sem anestesia.






Achava que, se todos os animais na natureza o conseguem, porque não haveria eu de o conseguir também e na boa? Toda a gravidez, em qualquer dos casos, foi o mais normal possível, nunca tive um enjoo, uma agonia, uma tontura, não me incharam pés nem mãos, nada, nada. Trabalhei até ao fim, com uma barriga que levava toda a gente a pensar que estava grávida de gémeos, mas ligeira como se estivesse elegante e no estado normal. Embalada por essa facilidade e por fazer ginástica de parto e ter aprendido as respirações adequadas para cada fase, fui na desportiva para o primeiro parto. A minha mãe e outras mulheres diziam que doía sempre e eu dizia que não, que eu estava preparada e que tinha aprendido parto sem dor. Sempre optimista, não me passou pela cabeça que tivesse que soltar, sequer, um ai.

Mas a criança não nascia nem por mais uma e, por isso, porque estava já para além do tempo, tiveram que me induzir o prato. Sem dores nenhumas apesar de estar a soro e com o dito medicamento desde manhã, eis que a partir da hora do almoço as contracções e as dores começaram a surgir e depois a apertar e cada vez mais e mais.

Eu tinha combinado com o médico que cesariana só em último dos últimos casos e que anestesia nem pensar, não fosse, mais tarde, vir a descobrir-se que fazia mal às crianças. Ao vivo e a cores que ia ser canja de galinha. As dores a apertarem, a apertarem e eu a fazer respirações e mais respirações e o médico já a dizer que me deixasse disso senão ainda me cansava mais. Por fim, a coisa já era insuportável mas ponham insuportável nisso. Eu suporto bem a dor mas aquilo já estava para além do suportável. Mas nada de anestesia que ainda aguento. Por fim, transpirada, encharcada, exausta, aflita de dores que já não paravam, a pensar que tinha atingido o limite, lá cheguei à fase da expulsão. Mas qual expulsão, qual carapuça...? A criança não saía. Chegou, pois, a hora dos ferros e uma vez mais, exausta, quase mais para lá do que para cá, e isto já às 6 da tarde, sem anestesia. O meu marido e a enfermeira puxavam-me para trás, pelos braços, e o médico puxava pelo bebé, com a cabeça entre as pás dos ferros. Uma coisa do além. O meu médico é um dos melhores médicos que há e os altos cargos a que chegou neste domínio comprovam-no. Mas é também um naturalista e, além disso, cumpria as minhas instruções. Se eu não estivesse no limite de tudo, teria gritado para ele ter cuidado, não fosse dar-me cabo da cabeça da criança, mas já não conseguia. Acabou por sair e, mal saiu, caí a dormir. Depois contam que eu acordava de minuto a minuto a perguntar se a menina estava bem. Mas esse estado de exaustão durou o tempo de me levarem para o quarto. Aí preocupei-me logo foi com a qualidade do quarto, não fosse ser caro demais. E já esperta como um figo, pronta para outra, feliz com a minha linda menina. Tinha eu 23 anos acabados de fazer.

Quando, passado pouco tempo (eles nem três anos têm de diferença), fui para a segunda criança, fui de novo na desportiva: o que custava era a primeira vez, que a segunda criança saíria de um tirinho. Bem que o médico me dizia que a criança estava outra vez subida e que o encaixe e tal e coisa e que era capaz de ser outro castigo mas eu na boa, que não, que o caminho estava desbravado e que ia ser piece of cake. As instruções eram, portanto, as mesmas da primeira vez.

Pois, pois.

A mesma cena. Parto induzido, a partir da hora do almoço doida de dores, cada vez mais, cada vez mais, e a criança sem descer, e o médico tentava fazê-la descer mas nada - mas anestesia não. O médico tentava: máscara...? Ao menos isso, que não aguenta mesmo, tem que tomar qualquer coisa. Que não, nem pensar.

Mas estava num estado tal que cheguei a um ponto que me lembro de ter dito que não aguentava mesmo mais. Achava que era humanamente impossível suportar mais dores. Mas anestesia não, tinham é que me tirar a criança de dentro. Felizmente, logo a seguir chegou o momento da expulsão. Mas qual quê. Sair é que não saía. Subido. E que não fizesse força para não rasgar o útero. Não sou de gritar mas aquilo foi um tormento de levar qualquer um ao tapete.

(A minha cunhada, menina das Avenidas Novas, quando teve os meus sobrinhos, gritava de tal maneira e dizia tamanhos palavrões que me lembro que as enfermeiras entravam no quarto ou na sala de partos, já não me lembro, para a mandarem estar calada. Na hora de dar à luz, algumas raízes ancestrais deviam vir ao de cima e berrava e praguejava como uma peixeira do Bulhão).

Voltando a mim.

Fórceps outra vez e o primeiro par não era suficientemente grande, a criança era grande e cabeçuda. Finalmente lá mo conseguiram tirar e, por inconcebível que pudesse parecer, depois daquelas horas de dor insuportável, mantive-me acordada. Saíu de dentro de mim um rapaz com 4,230 gr. Lembro-me bem de, ainda com o cordão ligado a mim, o médico mo pôr deitado no meu peito e de eu falar com ele, que me olhava acordadíssimo, atento, e eu fazia-lhe festas e ele, ainda todo coberto de sangue da placenta, a olhar como se estivesse a reconhecer a minha voz. Um dos belos momentos da minha vida.

Em qualquer dos casos, mal eles estavam cá fora, o alívio era tal que instantaneamente me passava a canseira e a impressão do sofrimento.

Por não ter apoio familiar local para me ajudar a criá-los e dada a minha vida profissional intensa, conseguir que crescessem com a minha presença atenta e carinhosa e conciliar tudo era tal ginástica que, ao contrário do que a minha natureza pedia, fiquei-me pelos dois. Senão, teria ido à meia dúzia e, provavelmente, em todos os casos, na maior das inconsciências, predispor-me-ia sempre a tê-los assim, pelas vias normais e sem anestesia.


Vem isto a propósito de uma experiência levada a cabo na Holanda: dois homens, dois jovens malucos da cabeça, aceitaram participar numa experiência - sujeitar-se-iam a receber impulsos eléctricos cujo efeito no corpo era equivalente às contracções de parto.


O que se vê aqui abaixo é como sofreram para além do que julgavam suportável. Nunca imaginaram que alguém pudesse passar por tais dores. Pode, à primeira vista, parecer hilariante mas, de facto, quem já passou por aquilo não pode deixar de recordar o bom e o bonito que é. Fogo... que até dói só de os ver a contorcerem-se: traz-me as minhas próprias dores à memória.


Claro que hoje já ninguém, em seu juízo pleno, se sujeita  a isto, desde epidural a cesariana tudo é capaz de ser preferível a um despropósito como aquele pelo qual passei. Mas, de qualquer maneira, tenho cá para mim que, se fosse hoje, se fosse ao terceiro, ainda iria na esperança que a criança saísse de rajada, sem dores que justificassem medicamentos e manobras arriscadas como anestesias ou cirurgias.

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Proefkonijnen, Dutch guys giving birth





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Como ontem vos contei, hoje foi dia grande cá em casa. Costuma ser ao fim de semana mas, por motivos diferentes (um dos quais o Benfica, claro está),  hoje foi a meio da semana. Jantaram cá as crianças e os elementos femininos do casal e agora, porque um dos elementos masculinos está fora, tenho cá uma das donzelas a dormir com as suas duas crianças. Resultado: festa rija. Felizes e radiantes como se fosse fim de semana, quem é que diz que tinham sono para irem para a cama a horas decentes...? Só devem ter adormecido às onze, já os primos se tinham ido embora, e ainda eles na maior reinação e festivalidade. E depois ainda tive que contar aquelas minhas histórias inventadas a la minute, que involuntariamente me levam por caminhos que os deixam ainda mais espevitados, a quererem quebrar o suspense, doidos por saber qual o fim da história. E eu, perdida de sono, às escuras, a bocejar e a inventar sobre grutas, lanternas sem pilhas, morcegos e pipilares de corujas, tesouros escondidos, pastores lá por cima para os ajudar, falando através de orifícios nos rochedos. Jesus!

Amanhã a alvorada é cedo que é dia de escola para eles e de trabalho para os adultos. Por isso, fico-me por aqui que estou mais cansada do que se tivesse dado à luz trigémeos. Esta quarta feira à tarde os acessos de Lisboa estavam todos engarrafados, toda a gente saíu a tempo de ir para casa ver o futebol pelo que, saindo todos ao mesmo tempo, foi mais de uma hora de caminho, o pé já dormente do pára-arranca. O que vale é que na véspera à noite já tinha deixado o jantar meio adiantado e que todos eles, pelos mesmos motivos, também se atrasaram. Mas este stress, depois a fazer o jantar, depois a tomar conta deles que estavam com as pilhas todas e um calor dos diabos, tudo junto... estou mesmo capaz de ir dormir já a esta hora (e ainda só é 1 da manhã).

E nem vou reler nada disto que escrevi de seguida e à pressa.

Quando comecei a escrever, comecei a escrever sobre o PS e sobre os partidos e sobre o sectarismo do PCP e essa coisada toda. Mas, a meio, cansada e com sono, faltou-me a pedalada para isso e fiz a agulha para isto que acabaram de ler. A ver se amanhã estou mais fresca.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela quinta feira!

E, a sério, tenho pena que o Benfica tenha perdido. 


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