Aconteceu-me, quando trabalhava, fazer visitas a instalações que iriam ser inauguradas em breve com honras de visitas de ministros e até de presidente da república, a campanha de marketing e de comunicação toda gizada, ensaiada e pronta para ir para o ar, tudo em festa, tudo aos parabéns uns aos outros, e eu chegar lá, olhar para aquilo e dizer que nem daí por um ano, senão dois ou mais, ou se é que alguma vez, aquilo estaria pronto para funcionar como era suposto. Claro que era liminarmente aconselhada a calar-me pois era a única a suspeitar do sucesso que estava à vista. Anos decorridos, em minha defesa, posso dizer que estava certa.
Aconteceu-me também, naquelas manobras de gestão de portfolio, os accionistas decidirem comprar empresas, fundir empresas, arrancar com empresas adquiridas, cá ou no exterior, e ser-me comunicado que tudo teria que estar operacional num par de meses, e eu, olhando para o que estava em cima da mesa, dizer que não havia condições mínimas para funcionar num curto prazo pois estavam omissas todas as bases e pressupostos sobre os quais as empresas funcionam. As minhas observações eram recebidas com incómodo: então tinham tratado de tudo tão bem tratadinho, notícias e entrevistas na comunicação social e agora eu vinha dizer que no way, que era preciso equacionar mil coisas antes de se poder fazer qualquer plano?
Um colega que me compreendia e que muitas vezes alinhou comigo dizia que nós dois éramos a turma do baldinho, ou seja, quando tudo estava ao rubro de alegria, aparecíamos nós a despejar água fria na cabeça dos outros.
Agora estou mais aquietada, já admito que as coisas não têm que correr bem, já aceito que se a malta gosta de se iludir e festejar grandes vitórias pois que o faça. A memória é curta e quando correr mal ninguém se vai lembrar que pouco tempo antes ninguém reparou nas imperfeições ou omissões.
Vem isto a propósito do acordo do Trump para o cessar fogo, para a troca de reféns e prisioneiros e para o recomeço da ajuda humanitária. Tudo coisas boas, meritórias, inquestionavelmente de louvar. Vários chefes de Estado a dar o seu ámen, aplauso geral. No entanto, quando dizem a Trump que há, entre os presentes, quem não concorde com os dois Estados, Trump diz que o acordo não tem nada a ver com isso, que isso nem foi tema, que o acordo é sobre a reconstrução de Gaza.
E, de facto, o acordo foi gizado por investidores, por malta das cripto, por gente do imobiliário, por gente do petróleo, por gente que nada em dinheiro. E todo o processo vai ser gerido como uma empresa, Trump, o grande rei do real state, como chairman.
Claro que Gaza tem que ser reconstruída. É um terreno e pêras, à beira de água. E, depois, parte do trabalho de demolição já foi efectuado. Falta o resto antes de começarem a nascer a Gaza Trump Tower, os Casinos, os resorts de 6 e 7 estrelas, os campos de golf. Claro que com tanta frente de obra há que ter muita mão de obra, é bom que não haja cá a baderna do costume, o cessar fogo tem que estar garantido. E é preciso que estejam alimentados. Não conseguirão trabalhar a bom ritmo se continuarem a ser uns mortos de fome.
Mas, pergunto eu: todas essas construções ocorrem em solo de que nacionalidade? Quem aprova os projectos, quem define as prioridades e as condicionantes, quem negoceia com quem, por exemplo a nível das infraestruturas necessárias? É cada investidor por si, à tripa forra, sem baias de qualquer espécie? Os contratos ou questões que surjam dirimem-se segundo que lei? A que tribunais se reportam? E as escolas que porventura lá se construam seguem que programa, reportam a que 'ministério'? Havendo problemas, que agentes de segurança estão no terreno e perante quem respondem? Ou vão contratar os mesmos do Hamas que lá andam agora (agora, depois do grande e dourado trump-acordo) para assegurarem a segurança das obras, com ordem para darem um tiro na cabeça de qualquer operário palestino que levante cabelo?
Tudo isto faz-me muita confusão. Tenho para mim que as coisas não existem de forma estável sobre terra de ninguém.
Ou estarão a pensar que é sustentável uma solução em que prevalecerá a lei do farwest, a lei da bala, em que os conflitos serão resolvidos a tiro? Ou ninguém quer saber disso pois o que importa é que, para já, se criem condições para transformar Gaza na Riviera trumpista -- e essa cena desagradável dos dois Estados e etc. que se lixe?
Gostava de não ser tão céptica pois desejo muito sinceramente não vir a ter razão. Desejo muito sinceramente que a paz e a concórdia se instalem naquele território e que o lei e o mel se derramem sobre o solo de Gaza, que jamais se misturem com sangue.
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Apenas um pequeno excerto do nível
Trump on Jared & Ivanka: “She Converted for Israel, It’s Incredible” | Abraham Accords Insight | APT
In a candid moment during his speech, US President Donald Trump reveals that his daughter Ivanka converted, sharing a personal insight while discussing the Abraham Accords and his efforts in fostering peace in the Middle East. Trump praises Ivanka and Jared Kushner’s contributions, highlighting the unique family connection to the historic peace process.
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