domingo, agosto 10, 2025

A vida dos muito ricos

 

Não sou mas conheço alguns. Nunca aparecem nas revistas. Nunca aparecem na televisão. Raramente vão aos restaurantes da moda. Raramente vão às praias da moda.

Geralmente estão nas suas casas. Um deles tem uma casa de férias, dizem que 'normal', ou seja, nada daquelas villas que ostentam fortuna por todos os poros e janelas, numa aldeia perto da costa vicentina. Dizem que vai, de calções e chinelos, ao minimercado mais perto, geralmente comprar peixe para assar. Digo 'dizem' pois nunca ninguém viu, foi um irmão que uma vez comentou isso e, quando contra-comentaram que ninguém lá deve desconfiar quem ele é, respondeu que claro que não, ninguém sonha. Esse que comentou, outro igualmente rico, também é especialista em churrascos. Gosta de assar peixe e carne não apenas para a família como para os amigos. Se lhe perguntarem se conhece algum daqueles restaurantes super estrelados dirá que isso não é para ele. Quando se vai ao restaurante com ele, não apenas escolhe restaurantes 'normais' como, no fim, se é ele que paga, no fim põe os óculos e está meia hora a olhar para a conta e a conferir se não puseram uma água ou um queijinho a mais.

Um desses muito ricos, quando em ambiente informal, em casa, mesmo que com convidados, no inverno usa geralmente um pullover de lã que é mais comprido de um lado do que outro, de tricot, já todo 'pendão' e com um ou outro buraco, de tipo malha caída. Todos os anos usa o mesmo pullover, gosta dele e acha que está bom, que não faz sentido deitar fora. 

É gente que parece ser despojada. Parece, mas não é. Pelo contrário são até forretas, 'poupadinhos'.

Uma vez vim ao lado de um deles numa viagem de avião. Tinha comprado uns charutos na freeshop. Vínhamos na conversa e, às tantas, quis ver o que eu tinha comprado. Quando viu a caixa de charutos, perguntou quanto tinham custado, e, pela entoação, foi quase como se achasse se eu tinha gastado dinheiro uma inutilidade, ainda por cima dispendiosa. 

As televisões e as redes sociais mostram-nos grandes hotéis, resorts de luxo, e, invariavelmente, estão sempre cheios. Mas não destes muito ricos, pelo menos dos old school. Aliás, do que conheço, penso que sentem um certo desprezo por esse jetset endinheirado que por aí anda gastando balúrdios e exibindo as suas férias, as suas toilettes, os seus luxos. 

Por exemplo conheço um que é rico, diria que bastante rico. Mas não é tão rico como os anteriores. Vai de férias todos os anos, duas semanas, para a Quinta do Lago, milhares como podem imaginar, e conhece todos os Belcantos desta vida, todos os vinhos renomados e envelhecidos, e frequenta torneios de golfe um pouco por todo o mundo e faz questão de ter sempre carros ultra topo de gama. Os primeiros, os muito ricos, de certa forma troçam, ainda que discretamente, com os luxos deste último, quase como se achassem que é coisa de gente deslumbrada. 

É grande a diferença entre o old money e o restante. 

Claro que há ainda as pessoas que conservam todos os hábitos do old money, porque em tempo o tiveram, apesar de já não serem tão ricos assim. Esses ignoram os novos-ricos embora, no íntimo, penso que invejem um pouco o seu sucesso e a sua ascensão, quase como se pensassem que são alpinistas socias que vêm ocupar, usurpar, o seu lugar na sociedade.

Pelos vistos os muito ricos do Brasil não são como os muito ricos em Portugal. Pelo que vejo no vídeo abaixo, não só gostam de ostentar a riqueza como acham que é pouca, que ricos são os outros. É uma questão cultural.

De qualquer forma, embora espelhando uma realidade diferente (pelo que ouço, os muito ricos do Brasil seriam considerados em Portugal novos-ricos), partilho o vídeo em que o Bial fala com um antropólogo que tem investigado a vida dos ricos.

Por que os RICOS OSTENTAM? Michel Alcoforado TE CONTA | Conversa com Bial | GNT

O antropólogo @‌michelalcoforado experienciou o mundo dos muito ricos através da chamada “observação participativa”, para entender como pensam, o que consomem e por que ostentam tanto.

No #ConversaComBial, ele explica como a riqueza no Brasil não diz apenas sobre dinheiro, mas também sobre poder, acesso e pertencimento. 

Desejo-vos um feliz dia de domingo

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