Em dia animado, de casa quase cheia, praia com uns, tarde no jardim com todos, jantar com quase todos, brincadeiras em casa com toda a malta miúda e parte da adulta, eis que, à tarde, o meu filho e a minha nora chegam com uma coisa num saco, dizendo que era para mim. Quando vi, fiquei toda contente. Não me teria passado pela cabeça que um genuíno rum cubano, vindo directamente da Festa do Avante, viria parar-me às mãos para que eu pudesse experimentar o tal cocktail que os astros me recomendam.
Ao jantar, quando a minha filha perguntou o que é que eu bebia, logo um deles gritou: rum! Mas não. Reservo-me para uma inauguração mais a preceito. Talvez num sunset no jardim. Um dos miúdos, preocupado: e não vai ficar bêbeda? Sosseguei-o: claro que não. A maioria será sumo. Expliquei que estou habituada: por exemplo, também gosto de vodka (embora nunca o tenha bebido puro).
Havia um cocktail que o meu marido preparava com champanhe, campari e sumo de laranja que era bem bom. Não me lembro se é a este que se chama kir royale que associo a um de que gostava, não me lembro se era o mesmo.
A grande diferença é que dantes a componente alcoólica tinha que ser mínima, senão dava-me para rir perdidamente e, a seguir, para dormir. Agora é à vontade: estou um camionista. Posso beber que nada me abala. Digo isto sem nunca ter abusado pelo que, na volta, se me exceder, caio mesmo para o lado.
Camionista, sim, mas provavelmente não de barba rija.
Por exemplo, não sei se com uma caipirinha me aguentava. Nunca experimentei. Tenho ideia que aquela aguardente não apenas é agreste como muito forte. Também nunca experimentei whiskey. Não gosto do sabor. É-me desagradável. Mas gosto muito de gin. Gin, água tónica e o que calhar lá dentro (pepino, hortelã, maçã, laranja, pêssego, whatever -- mas não tudo junto, claro...). Gosto mesmo.
Quanto a vinho, já o disse: passei a grande apreciadora. Gosto mesmo.
Idem em relação a cerveja, embora não tanto como vinho.
Escrevo isto e recordo-me de uma tarde em Madrid. Tínhamos chegado, estava muito calor e era o fim de tarde. Ao pé do hotel em que costumávamos ficar, havia um daqueles lugares bons para nos refrescarmos enquanto picávamos. O meu marido pediu uma caneca que lá se chama de outra forma, não me lembro. Ocorre-me pinta mas não deve ser. E eu pedi uma simples água fresca. Se fosse em Portugal teria bebido uma água das pedras. Ali, só água lisa. E lembro-me de ele se encantar com a cerveja, dizia que nenhuma era tão gelada como ali. E dizer-me que experimentasse e eu, uma vez mais, ter tentado... e uma vez mais ter detestado. Não percebia como se podia gostar tanto de uma coisa tão mal saborosa.
E, no entanto, se agora me sabe bem. Ainda não consigo beber sem ter alguma coisa para picar ou mastigar. Cerveja, só cerveja, não aprecio. Ainda não aprecio. Mas, tendo o que acompanhar, gosto imenso. No outro dia, vi no supermercado umas cervejas alemãs artesanais, diferentes, e tive vontade de experimentar. O meu marido dizia que não valiam nada. Trouxe só porque a minha intuição puxava por elas. O meu filho, quando lhe falei, também disse que eram mais pesadas que as nossas. Afinal nada pesadas, bem boas.
E agora fico-me por aqui. Dois dos quartos do fundo do corredor estão ocupados. Os primos saíram tarde com a tia, os pais estão a festejar com amigos e eles estão cá. Hoje fizeram todos testes para poderem estar juntos cá em casa, sem máscara, à vontade. Foi uma festa. Covid free. Uma alegria. O mais velho veio dar-me um grande e sentido abraço e fez outro tanto ao avô. Daqui a nada estão a pé que são passarinhos que chilreiam pela entrada do dia.
Se calhar vou dormir na sala que fica ao lado da casa de banho que serve os quartos em que eles estão. O meu quarto fica num recanto na outra ponta do corredor, um bocado longe. Receio não ouvi-los.
Estou com tranças que a minha filha me fez. Fez-me a mim e fez à sobrinha. Vou dormir com elas a ver se amanhã estou com o cabelo ondulado.
Ah, é verdade. Quando se deitaram, quiseram que eu contasse uma história. Contei mais um episódio da Princesa Margaret e o seu irrequieto cão Kikas. O mano do meio, quando a história começou, exclamou: 'Ah, a Princesa Margaret. Um clássico das noites em que a Tá ficava connosco à noite lá em casa...'. Gostei. Há que tempos, bem antes da pandemia, e ainda se lembra. Também achei um piadão a que, quando foram lavar os dentes, o mais pequeno tenha dito: 'Há uns anos atrás, o meu mano contou-me...' (e referiu o que o mano lhe tinha contado). Eu disse: 'Há uns anos...? Tem graça essa. Há uns anos ainda tu não devias ser nascido'. Olhou para mim sem saber bem como sair daquela. O mano foi em seu socorro: 'Acho que ele quer dizer uns meses'. E ele, ouvindo, encolheu os ombros, como se fosse um preciosismo.
Umas ternuras. Todos eles, umas ternuras.
___________________________________________
E, já agora, algumas inspirações para cocktails com rum
Sem comentários:
Enviar um comentário