Estamos tão formatados para ter coisas para fazer e para dar no duro que parece que não sabemos fazer outra coisa. Este domingo estivemos sozinhos in heaven. Dir-se-ia que seria normal que aproveitássemos para estar de perna estendida. Mas qual quê?
Esta casa, já o contei, sendo grande, tem, contudo, falta de espaço para arrumação. Arquitectonicamente é interessante mas com poucas paredes onde se encostem móveis. Para arrumações temos uma casinha, lá fora, onde se guardam máquinas (a roçadora, a serra eléctrica, etc) e tintas e tabuleiros e trinchas e rolos, escadote, etc. Na casa há o que seria uma despensa mas que, na prática, funciona como arrecadação. Como a cozinha é ampla, é nos seus armários que guardo os produtos de alimentação. Só tem móveis baixos mas neles cabe o que é preciso. Portanto, na suposta despensa, numa parede tenho o tal móvel gigante, um multi-usos que os anteriores proprietários tinham na sala, e, na parede em frente, há uma estante de arrumação embutida. Nesta estão as caixas de ferramentas, produtos de limpeza, caixas com cenas, etc. Na parte de baixo, estão os sapatos e num outro separador também em baixo, vários garrafões de água para um just in case.
No móvel havia de tudo: brinquedos, coisas da escola, sacos com indefinidos, vinhos, livros, roupas, bibelots, candeeiros, whatever.
A divisão é estreita. Ao fundo, na parede onde está a janela (que raramente abrimos), está o aspirador, a tábua de passar a ferro e o ferro de engomar, algumas cadeiras de tipo realizador e outras de exterior e almofadas das espreguiçadeiras. Na parede oposta, a da porta, está um cabide de parede onde estão impermeáveis, sacos, chapéus de chuva. E, num canto, estão as vassouras, os baldes e as esfregonas. A babel da bagunça. Tão cheia estava que já tínhamos perdido o fio à meada.
Então, hoje o meu marido tirou praticamente tudo cá para fora. Apenas a zona das ferramentas lhe escapou. Diz que está bem assim, que encontra sempre o que quer. Eu acho que está a maior confusão. Nunca consigo encontrar o que quer que seja. Penso que deveria ter umas caixas grandes com compartimentos para poder ter as coisas organizadas por tipo e não, como está, tudo ao molho e fé em deus. Mas ele diz que não me meta no assunto e que não chateie.
Mas, então, foi tirando coisas de todos aqueles compartimentos do móvel grande e de cima (porque estava até ao tecto). E eu, cá fora, ia triando. A quantidade e diversidade de coisas que saiu à cena é indescritível. Coisas que há muito julgava que se tinham perdido para sempre ali estavam. As coisas mais inenarráveis. Até um par de barbatanas e uma prancha de skimming. Não percebo. Vai-se encafuando e perde-se o rumo às coisas.
Apareceram mais uma porção de livros infantis e juvenis que eu não sabia onde andavam. Até livros meus, incluindo os da Berthe Bernage de que tanto gostei quando era miúda.
Os brinquedos e jogos estão agora todos na salinha de baixo da zona antiga da casa. Assim, é possível ver tudo e escolher o que se quer.
Temos ao fundo do corredor uma estante estreita de tamanho intermédio. Supostamente todos os livros infanto-juvenois estavam lá embora eu desde sempre me intrigasse por achar que deveriam faltar outros tantos. Mas como nunca os tinha contado e não fazia ideia de onde estavam os que achava que faltavam acabei por desistir de alimentar a dúvida. Apareceram. Como sobrava espaço nessa estante, tinha-se completado com livros de viagem e alguns de arquitectura que já não cabiam na zona deles. Agora estamos a pensar reorganizar algumas estantes, deixando esta apenas para livros para a maltinha jovem. Teremos é que arranjar sítio para os que de lá se tirarem.
E separámos alguns testes escolares ou trabalhos dos meus filhos que me pareceram com potencial interesse estimativo para que eles vejam se querem aproveitar alguma coisa. E brinquedos da minha filha para que ela decida se ficam, se vão fora.
E lavei alguns cortinados ou peças de vestuário que cheiravam a coisa guardada. E um vestido estampado de verão de que gostava muito e que acho que talvez sirva e fique bem à minha filha. É certo que o vestido era o 36 e que ela varia entre o 38 e o 40 mas pode ser que o 36 de antes seja o 38 de agora. Ela fica sempre surpreendida ao ver como eu cabia em roupinhas tão delgadinhas. Mas a vida é assim mesmo: as mulheres são como as árvores, o seu tronco vai ganhando espessura.
Quanto ao resto -> lixo.
Sacos e sacos. Roupa para dar. Sacos com livros e cadernos para reciclar. E coisas para o lixo-lixo. O meu marido viu-se aflito para conseguir enfiar tudo no carro. E nunca mais aparecia de volta. Diz que esteve o tempo todo a separar os sacos pelos respectivos contentores.
Almoçámos às quatro da tarde.
Depois ainda pus uma cortina de casa de banho em lixívia, lavei uns tapetes, sei lá. E ele andou a desbastar a figueira e outros arbustos aqui em frente da janela da cozinha para que, ao estarmos aqui, tenhamos a sensação de que estamos em plena natureza.
A janela é muito grande. Antes tinha umas cortinas de renda a meia altura. Agora achamos que preferimos a nudez do vidro que nos traz a visão integral do exterior.
Sentámo-nos, entretanto, no sofá a descansar. Ele adormeceu logo. Eu não. Depois vimos dois episódios da Grace & Frankie.
Para o almoço limitámo-nos a restos (do peixe de ontem e de carne que trouxemos). Para o jantar, fiz ovos de tomatada que comi com pão pelo meio e que ele acompanhou com arroz.
E, com esta tomatada, acabei com os belos tomates do vizinho. Era bom que ele se lembrasse de cá voltar a pô-los à disposição. Mas, na volta, viu-me tão reticente em agarrá-los que agora se inibe. E isso será uma pena. Pode trazê-los à vontade que eu rapidamente lhes chamarei um figo.
Agora estive a fazer uma encomenda à ikea e, a seguir, adormeci.
O meu marido há bocado perguntava: agora já está tudo ou ainda falta alguma coisa? Falta. Falta arrumar a parte de cima da escrivaninha. Está uma confusão desgraçada. Anos de crianças a mexerem e nós a fazer com que o tampo feche. Para encontrar alguma coisa é preciso muita destreza e equilibrismo. Uma coisa tipo mikado.
Se calhar, quando tivermos arrumado tudo, e ele desbastado mato e eu varrido tudo à volta da casa, vamos sentir-nos fatigados por já não termos nada que fazer. Mas, por enquanto, não descansamos enquanto não nos esfalfarmos a trabalhar.
Há explicação para isto? Estamos a ficar uns workaólicos da ménage? Ou what?
Será que não vou conseguir passar um dia de perna estendida...? Pergunto-me.
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Martha Argerich e o neto, David Chen, interpretam Laideronnette de Ravel. As maçãs são aqui mostradas por William Mullan
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Desejo-vos uma boa semana a começar já por esta segunda-feira.
Saúde. Alegria. E força nisso.
2 comentários:
E agora já sou eu que lhe desejo um dia de perna estendida. Merece, e digo mais: merecem. Caramba, que ménage à couple.
Olá, Atalhos,
Ontem ensaiámos ter um dia mais tranquilo. A excepção foi irmos ao supermercado à vila mais próxima, cozinhar, ele desbastar algumas árvores. Mas parece que nos faltava alguma actividade. Li, apanhei sol, mas ao fim de algum tempo já sentia falta das cenas do costume. Hoje, quando me levantei, ele disse que estava a pensar que se deveria colocar umas prateleiras adicionais na despensa. E eu pensei que deveria ter, na porta, um daqueles cabides múltiplos que se põem a passar por cima das portas. E aproveitei para ter uma régua de cabides para ter os panos do pó mais à larga e uma outra para os bonés. Portanto, já fomos ao leroy à cidade mais perto e ele já anda a pôr prateleiras, eu já ando a reorganizar mais umas tretas.
Mas agora vim para o meu sofá relax e estou de perna estendida, sim senhora. E vou ler e, se tudo correr bem, estou capaz de até tirar um cochilo.
E obrigada pelo comentário divertido.
Um dia feliz.
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