domingo, junho 30, 2019

Crónica de uma noite e de um dia em grande





Passa bem da uma da manhã e só agora começo a escrever. Cheguei com uma tal camada de sono em cima de mim que nem vos digo nem vos conto.

A semana de trabalho foi o que foi e na sexta ao fim da tarde, por felizes circunstâncias, calhou que parte da família teve que ir a um sítio perto da minha casa. Portanto, naturalmente, perguntei se queriam lá ir jantar. E sim. E, assim sendo, naturalmente, perguntei à outra parte se também. E sim. O meu marido, nestas coisas, assim, em dia de semana, sem nada preparado, acha preferível irmos a um restaurante. Eu não. Um restaurante é impessoal. E depois os miúdos são ruidosos e é aborrecido não os deixarmos mexerem-se à vontade. É uma coisa limitada. Não aprecio. Prefiro em casa, para convivermos como deve ser. Encomendámos daquelas pizas gigantes em forno de lenha que têm salmão, queijo de búfala, alcachofras, nozes e outras coisinhas boas e o meu marido foi buscar frangos assados e arroz e eu fiz salada e lavei fruta e pus a mesa. E logo a seguir a casa encheu-se de conversas e crianças a correr e a rir e logo o bebé foi buscar um banco para ver as pizas e depois já um dos mais crescidinhos me avisava que o bebé estava a comer azeitonas e ele, ouvindo, riu e abriu a boca para me mostrar a boca cheia de azeitonas pretas. Como estavam descaroçadas, não me importei. E todos de prato na mão a servirem-se, um apetite de dar gosto, e todos a repetirem uma e outra vez. E conversa e animação. No fim, já sabem que há gelados mas só para quem comer fruta. E, portanto, ao contrário da sequência certa, na minha casa é primeiro a fruta e depois a sobremesa. Depois, claro, quem quiser pode voltar à fruta.

A seguir foram para a sala e, quando estão juntos, é corrida, luta -- uns andam no judo, outros no jujitzu e o mais maluco de todos, ou seja, o meu filho, em tempos andou no judo e no karaté -- e, portanto, inevitavelmente, aquilo descamba sempre em artes marciais. Apesar da barriga a deitar por fora. E isto com o bebé a circular pelo meio, mexendo em tudo. A menina, sem outras meninas para brincar, arranja outras brincadeiras como, por exemplo, com a mãe ou com a tia, a fazer aqueles jogos com um fio preso entre os dedos, muitas vezes com lenga-lenga associada. E então, para ver se acalmavam e sempre com medo que um dia ainda se magoem, pedi que os quatro se sentassem no chão e eu ia dizendo a cada um que respondesse a uma pergunta minha. Um país começado por P sem ser Portugal, um insecto começado por P, uma flor começada por D, uma capital começada por O, um frto começado por N, um rio começado por S, uma serra começada por A. Cada um vibrava a tentar recordar-se o mais depressa possível. Se não soubesse passava a outro mas, lutadores como são, não passavam e desatavam a inventar palavras. Uma risota. Mas adoraram. Não tarda, o quinto pimentinha já ali estará também a fazer o jogo das palavras.

Até que um deles, o mano do meio, resolveu vestir um blusão escuro do primo mais velho, com o capuz todo enfiado na cabeça, e depois foi buscar umas canadianas que estão lá de outros tempos e começou a circular naqueles preparos, os braços enfiados nas canadianas, por vezes empunhando-as como espadas ou lá o que era aquilo. E eu disse: 'Não gosto nada de te ver assim, credo'. Ficava com um aspecto sinistro. E ele disse 'Sou o Darth Vader'. E, de facto, dava ares. Pensei que o pai já o deve ter contagiado: gostava imenso de ver a Guerra das Estrelas e, na volta, ainda gosta.

E depois lá se foram mas já era tarde e ainda houve que dar uma arrumadela ao que ficou. E o meu marido disse: 'Isto tudo é muito bonito mas um gajo não descansa' e eu disse que dizer aquilo é até heresia face à alegria que é estarmos todos juntos. E ele não comentou o que eu disse mas, depois, começou a contar coisas deles. Por exemplo que deu com a menina a comer o gelado, na sala, sozinha. E que lhe perguntou se ela gostava de estar sozinha e que ela respondeu com aquela segurança muito dela, 'Gosto'. E eu pensei que a percebo pois, quando a barafunda é muita, às vezes também me dá vontade de ir durante dois minutos para um lugar mais sossegado. 

Este sábado de manhã resolvemos ir passear para a praia. Estava-se bem. Caminhámos à beirinha da água.

E depois fui ao supermercado e mandei escalar uns robalos e etc. E o meu marido, quando cheguei, disse: 'Fica a casa a cheirar a peixe' e eu disse que se era peixe assado não poderia cheirar a flores. Mas abri as janelas e não ficou a cheirar a nada e estava bem bom. Mas, moída e não sei se com o alentejano branco e fresquinho a cair-me na fraqueza, resolvi deitar-me no sofá a seguir.

Mas é escusado. Logo a seguir chegou uma sms a pedir para anteciparmos o encontro para as quatro. Portanto, deu para fechar os olhos e, logo a seguir, já estava o meu marido chamar-me, que estava na hora. 

E lá fui. E lá voltámos a encontrar-nos com parte do bando.

Fomos para a Decathlon para o menino mais crescido, como teve boas notas, provar bicicletas para ver qual o tamanho e eu aproveitei para lhes escolher uns calções e uns polos e depois foram escolher uma bola para, a seguir, irem jogar à bola no parque e andaram pelos corredores a jogar à bola e é impossível tentar mantê-los sossegados porque não conseguem. Depois foram escolher caneleiras e um escolheu o tamanho M e o outro o L e eu queria que experimentassem e eles que não, que estavam boas, e eu ainda assim, perguntei a uma empregada e ela disse que, para eles seria o S ou, no máximo, o M. E o mais velho veio ter comigo e disse-me: 'Levo o L porque aquilo é tudo negócio'. E eu sem perceber: 'Negócio..?' e ele 'Sim, quer que eu leve o M para daqui por algum tempo já não me estarem boas e ter que vir comprar outras.' A vontade de rir que me deu, quase da minha altura e já a dar-me conselhos destes. Mas lá o fiz mudar de tamanho, também para M, apesar de o ter deixado contrariado por achar que eu tinha ido na conversa da empregada.

Quem conhece as grandes Decathlons sabe que tem sítio para se experimentarem bolas, com balizas e tudo, para se experimentarem bicicletas e triciclos, aparelhos de ginástica e luvas de box, etc. Passado um bocado vi-os virem perdidos de riso, sem conseguirem falar de tanto rirem, dobrados de riso. Só no carro é que consegui, e a muito custo, que explicassem. Riam e eu ouvi 'capacete' e logo os dois se partiam a rir e depois 'menina' e logo se partiam a rir. E depois 'bolada' e riam. E eu: 'Não estou a perceber. Deram uma bolada numa menina? Ou num capacete?'. Nova risota. Olhavam um para o outro e desatavam a rir à gargalhada. Finalmente, quase sem se perceber o que diziam: 'As duas coisas'. Risota. Por fim: 'Uma menina com um capacete' e risota, risota, risota redobrada. Mais: 'A menina nem percebeu o que aconteceu' e quase choravam a rir. E o meu marido 'Ah, então deve ter sido por isso que vi um gajo todo furioso. Devia ser o pai.'. Acabei também eu a rir. Fazer o quê: zangar-me a posteriori...? Já não surtiria qualquer efeito. O meu marido abana a cabeça, encolhe os ombros.

Enfim.

De lá fomos para o parque e foi mais uma futebolada. Jogam bem. 

Depois fomos comer caracóis e eles também pregos. Às oito fomos levá-los a casa. O meu marido disse: 'Os gajos não se cansam'. Depois ele ainda foi à empresa e só depois é que viemos para cá. Noite avançada. O que sei é que, depois de me instalar, adormeci. Ainda tentei que não mas não resisti.

Fiz várias fotografias, algumas delas na praia, e até estou curiosa para ver como ficaram aqueles caranguejos que estavam na areia mas, muito sinceramente, agora não tenho pingo de energia para ir buscar a máquina. Nem energia, outra vez, para responder a comentários. Pingo.

A ver se este domingo recarrego baterias. E se consigo escrever sem ser como nestes últimos dias, às milhentas da noite. 


E agora, com vossa licença, vou pregar para outra freguesia, esperando ter sonhos espirituosos, virtuosos e jubilosos. Mas, para que o vosso tempo por aqui não seja dado por completamente perdido, deixo-vos um vídeo que não tem pitada a ver com nada.

E as imagens com que tentei alindar o texto mostram pinturas de Antônio Henrique Amaral e o que é as bananas ou o que seja têm a ver com o que estive a descrever também é coisa que não estou preparada para explicar. E a música (as bem dispostas Salut Salon com "Wettstreit zu viert") também é muito bem capaz de estar aqui deslocada. Mas tudo bem alinhadinho também é coisa que, neste contexto, me pareceria abusivo. Portanto adiante e passemos ao vídeo: numa escala de 1 a 10, quão sexy você é?

[Antes de ver o vídeo responda por si. Se não souber bem, ponha-se o espelho, olhe-se de través e avalie o seu nível de quentura]

100 People Tell Us How Hot They Are



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E a todos um bom dia de domingo

6 comentários:

Abraham Chevrolet disse...

As pessoas têm coração...e ficam muito mais bonitas quando conseguimos vê-lo,brilhante,por trás das cortinas e disfarces supostos necessários. Sem amor,sem paixão, que raio de vida teríamos?
E as crianças,Senhor,as crianças? Não se resiste a dar-lhes o que nos faltou,melhor,o que supomos nos faltou...a questão não é justiça ou injustiça mas de ponto de vista,e insistimos em que tenham tudo o que temos por precioso. E o tesouro é sermos nós e elas e estarmos ali juntos e isso ser bom e ficarmos com essa bagagem para o resto da vida.
Ainda bem que não estamos sós.

Isabel disse...

Quando na escola digo que os miúdos não sabem cumprir regras...sei que os pais facilitam, pelo cansaço. É uma coisa que levo muito a sério e é o que mais desgasta numa escola: tentar que os alunos cumpram as regras. Também por uma questão de respeito pelos outros.

Surpreende-me que a UJM tenha levado o acontecimento com a bola, de forma tão ligeira. Atribuo-o ao cansaço e os miúdos vencem-nos pelo cansaço. Eu não deixaria andar a jogar à bola num centro comercial. Nunca! E o facto de magoarem uma criança e levarem a coisa na risota, parece-me uma falta de respeito para com os outros. Eu não ficaria por isso mesmo, tenho a certeza que ralharia. Não adiantava de nada? Não, mas é por isso que as crianças continuam a fazer o que querem. Uma coisa é brincar e outra o desrespeito pelos outros. Se a UJM se puser no lugar daquele pai e se fosse um dos seus netos a ser magoado, a UJM não levaria a coisa tão na risota.

Desculpe o desabafo, mas na escola é isto o que se sente: os miúdos são educados, têm pais impecáveis, mas 90% do tempo só vêem o lado deles.

Bem, mas eu não quero ser rude, só que na escola sinto muito o peso e o desgaste destas situações.

Mas gostei muito de ler. Não tenho andado pela internet, porque tem sido um período complicado, mas venho espreitar...

De 0 a 10, Zero, completamente! De sexy não tenho nem nunca tive nada. Mas sinto-me bem e hoje em dia sou uma pessoa segura de mim, coisa que levou muitos anos a construir.

Beijinhos e não me leve a mal������

Um Jeito Manso disse...

Olá Isabel

Não foi num centro comercial. Credo. Claro que num centro comercial não poderiam jogar à bola. Foi na Decathlon e até acrescentei uma frase ao texto. Na Decathlon há mesmo espaços para se experimentar o que se quer comprar. Por isso, eles andavam a jogar à bola tal como a menina estava a andar de bicicleta. Foi, pois, um acidente inconsequente entre crianças que experimentavam brinquedos num sítio em que tal é permitido e, até, estimulado.

Além disso, nem eu nem o meu marido vimos o que se passou, só já no carro percebemos o que tinha acontecido. E há situações em que ou se actua no momento ou é escusado. Neste caso, como não houve maldade nem nada de especial aconteceu, não tive muito o que dizer.

Mas comprendo a dificuldade de ter uma sala cheia de crianças cheia de energia e querer que se calem e parem sossegadas. Tem que haver pulso firme e saber cativar-lhes a atenção. Engenho e arte.

Um bom domingo! Beijinhos.

Isabel disse...

Interpretei mal...peço desculpa:))

Beijinhos:))

Um Jeito Manso disse...

Olá Isabel,

Nada a desculpar, ora essa. Se estivessem a jogar à bola num centro comercial seria chocante, sim, e teria razões para ficar a pensar que por isso é que, nas aulas, não sabem comportar-se.

Não sei se todas as Decathlons são gigantes ou se só algumas. Esta é enorme. Volta e meia até me desoriento, sem perceber onde está o que procuro. É daquelas coisas que me deixam espantada. Antes não havia nada assim e aparentemente não sabíamos que fazia falta. Afinal, apesar de gigantes, estas grandes lojas estão sempre cheias e uma pessoa, quando quer comprar algum artigo de desporto, parece que nem saberia onde ir se estas agora fechassem.

Quanto a não ter pitadinha de sexy, não acredito, não pode ser. Mas, se é assim que se sente, então está a hora de dar um jeito em si. Eu começo sempre por cortar o cabelo. Mas pode também mudar-lhe a cor. E arranjar uma blusa colorida e sexy e pode ser umas calças brancas ou, então, pretas. E uma pulseira gira, uns brincos grandes. Com essa segurança em si, a seguir é só fazer um catwalk... :)

Uma bela semana, sexy Lady.

Beijinhos.

Um Jeito Manso disse...

Olá Abraham,

Palavras boas, de afecto, de proximidade. A vida é boa se for vivida em paz e com laços entre quem se quer bem.

Gostei de ler o que escreveu, sabe?

Abraço.

E dias felizes!