O que me assusta nisto do Facebook, Instagram e WhatsApp é que, apesar dos riscos brutais, as pessoas não o percebem e continuam a usar alegremente, sem preocupações, estas redes sociais. Sucedem-se os casos de violações de privacidade e de manipulação psicológica dos utilizadores, sucedem-se os alertas sobre os riscos -- e ninguém quer saber, toda a gente continua a usar na maior descontração.
Pela 'natureza' tecnológica das próprias plataformas e pela natureza dos objectivos de Zuckerberg -- que nisto está por conta própria, um verdadeiro um deus ex machina, um deus inesperadamente surgido de um algoritmo, alguém com um poder fora de controlo --, a menos que apareça um travão efectivo a nível judicial, o Facebook, o Instagram e o WhatsApp não pararão de se expandir e de se tornarem cada vez mais perigosos.
Apelos ao suicídio, ao terrorismo, ao exibicionismo mais primário ou a práticas sexuais, ao consumismo, chantagem, manipulação eleitoral, censura moral e artística, ou, sem que a própria vítima se aperceba, condicionamento social -- há de tudo no Face, no Insta, no Whatsapp.
São fábricas de notícias falsas, albergues galácticos para oportunistas, tarados, assassinos, criminosos de toda a espécie, populistas, racistas, xenófobos, gente pouco recomendável. E tudo disfarçado de ligeireza, de brincadeirinha. E há, de facto, ligeireza e brincadeirinha, recordação de juventude, amigos de longa data, foto de família, bolo de anos, paisagem magnífica, gatinho fofinho, criança inocente, vestido lindo, unha artística, olhar de amor.
Ao pormenor, com a inteligência artificial ao serviço da machine learning, as potentes máquinas e as suas brutais bases de dados conhecem ao pormenor de que é que cada um gosta, não gosta, qual a fase da vida em que está, de que precisa.
E, então, como por magia, é dado a conhecer â pessoa o que o algoritmo acha conveniente: a sugestão de umas férias, uma notícia anti-sistema, um pedido de amizade. É que nada, mas mesmo nada, ali acontece por acaso: tudo é fruto do dito algoritmo que tem por objectivo aumentar os clicks, as mensagens trocadas, os vídeos vistos, ou seja, tudo tem por objectivo fazer subir o volume de negócios e, claro, valor das acções do Facebook.
Mas não estamos a falar apenas de um poderosíssimo monopólio económico -- estamos, também a falar de uma muito perigosa arma para cujo uso não existe regulamentação.
Embora moda recente (há quantos anos o Facebook se tornou o alfa e o ómega da ligação das pessoas ao mundo? Uns dez anos?), a verdade é que a própria maneira de ser e estar das pessoas se modificou. O vício das selfies, o egocentrismo, a futilização, a leviandade na tomada de posições, o contágio emocional e irracional -- são comportamentos que associo ao advento do uso generalizado de redes sociais.
Ao lidar com as emoções primárias das pessoas, ao criar-lhes dependências, e ao deter toda a sua informação, por tudo o que acima referi e por muitas outras razões, o poder do Facebook (que detêm o Instagram e o WhatsApp) é incomensurável e os riscos que isso comporta igualmente imensos e muito perigosos.
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É por isso que é com gosto que recebo notícias de que há vozes importantes que se levantam para lançar alertas.
Neste caso estou a falar de Chris Hughes, cofundador do Facebook, que pede que o governo dos EUA desmantele a empresa que controla a rede social mais famosa do mundo.
O Expresso deste sábado traz como artigo de fundo um longo texto de Chris Huges mas como a maior parte das pessoas não conseguirá lê-lo, deixo aqui um vídeo (muito bem feito) no qual ele diz ao que vem. E espero que quem de direito o ouça e o leve muito a sério.
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E até para que a União Europeia regulamente sobre o uso desta arma e sobre outros aspectos que tanto condicionam a nossa vida e para que possamos viver num espaço livre, democrático, inclusivo, moderno e seguro este domingo bora votar em força.
E está bom tempo, não há desculpa para ficar em casa. Mesmo com dores nos calos ou vontade de mandar grande parte dos candidatos darem banho ao cão, mesmo assim é de ir votar -- a bem deste nosso tão bom espaço comum.
Um bom domingo de eleições.
2 comentários:
Lembro-me bem quando os telejornais não se calavam com peças que metiam o Facebook e o Twitter, como se fosse uma invenção genial e uma novidade absoluta, uma redescoberta da roda. Achei sempre muito estranha esta "hype" com as ditas redes sociais, pois ao estilo Facebook já existiam redes desde 2003, o que quer dizer que o Facebook não introduziu nada de novo enquanto conceito.
Em Portugal, a rede mais popular era o Hi5, nos EUA o MySpace, no Brasil o Orkut (Google).
Por cá, o Hi5 era predominantemente uma coisa de adolescentes e jovens adultos, o Facebook começa a ganhar popularidade por 2009, mas nos primeiros meses era uma coisa de jornalistas e gente benzoca de faixas etárias mais altas. Com tanto burburinho, a populaça adere em massa ao Facebook, que no espaço de um ou dois anos eclipsa as redes sociais dominantes na década anterior.
Ao que vamos sabendo só me surge dizer "Quod erat demonstrandum".
Bem vinda ao Admirável Mundo Novo
o fb é só uma porca da engrenagem
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