No domingo fui dormir tarde demais. Vi o episódio do Bodyguard até ao finzinho, agarrada, desejando que o seguinte fosse tão bom como aquele. Lindo, espadaúdo, valente, inteligente, sensível, o sargento David Budd tinha tudo para me ter presa a ele noite após noite. Afinal foi o último episódio. Fiquei desiludida. Não se faz.
Fui para a cama por volta das duas e meia e custei a adormecer. Quando estou muito cansada acontece-me isto. Sempre que estava a adormecer, vinha a mim com as ideias que estavam a martelar-me o juízo: onde é que se põe isto? agora o que é que se faz àquilo?
Não sei a que horas consegui descansar mas já a madrugada ia avançada.
Passado um bocado, o alarme. Acordei sobressaltada. Uma vez mais o meu marido deixou o alarme parcial quando saiu para o seu passeio madrugador e, estando de volta, foi à zona abrangida fazendo-o disparar. Fiquei passada, precisava tanto de dormir. Diz-me ele: 'Desculpa lá, foi sem querer. Vai dormir'. Como se fosse possível.
Ainda por cima, no meio do trabalho, tinha uma máquina de roupa para fazer. E, máquina feita, resolvi também lavar dois tapetes, mas lavados à moda antiga: estendidos no chão com mangueira, detergente, vassoura de arame, bem esfregados. Pensei: mal acabe de almoçar, sento-me a descansar. Está bem, está. Reunião, marcada de supetão, logo a seguir ao almoço. Tive foi que almoçar a correr. E prolongou-se tarde fora.
Quando saí do meu estaminé, o meu marido contou que o senhor da oficina dos alumínios finalmente lhe tinha ligado.
Encomendámos as janelas e as portas para a casa in heaven em Abril e, por falta de materiais ou sei lá o quê, estávamos a ver que nada. Aliás, o senhor até já nos tinha dito que, se quiséssemos, nos devolvia o dinheiro já pago. Acreditámos na sua seriedade e esperámos. Mas já desesperávamos. Além do mais, a nossa ideia original era que tudo isto, janelas, portas e pinturas, tivesse ficado pronto antes do verão para que, quando lá quiséssemos ficar, estivesse tudo despachado. Mas estas coisas não são como a gente as quer mas quando podem ser.
Mas, então, o senhor tinha ligado: o material já tinha chegado e estava a apontar para ir montar tudo lá mais para o fim da próxima semana mas tinha uma dúvida nas portas e precisava que nós disséssemos como queríamos. Era coisa difícil de explicar, só vendo no local.
O meu marido olhou para mim e eu para ele: por umas e outras razões poderia ser-nos difícil lá ir durante a semana pelo que, se não fossemos, lá o trabalho se iria atrasar ainda mais. Então pensámos: vamos lá hoje? Ligou ao senhor e ficou combinado. No entanto, não deixou de se lastimar: um gajo não descansa...
Mal as coisas se acalmaram nos nossos trabalhos, no final da hora de expediente, lá fomos nós. Eu ia perdida de sono mas, como ele também ia na mesma, consegui manter-me acordada para o ir vigiando, não fosse a coisa dar para o torto.
Pelo caminho, para minha surpresa, disse: se chegarmos antes dele, se calhar ainda tentávamos pôr os cortinados. Achei bem e fiquei satisfeita com a sua proactividade. Se tivesse sido eu a propor-lhe, teria ficado furioso. Assim, sendo a ideia dele, fiquei feliz da vida. Mas não me manifestei não fosse a sua boa vontade retroceder. Nunca se sabe. E, portanto, assim foi. De estendidos no chão da sala, os reposteirozões passaram a pendurados -- depois de aspirados e de muita luta e de muito palavrão pelo meio.
No fim, ele perguntou: mas agora que o gajo vai pôr as janelas é que fomos pendurar os cortinados? A pergunta era obviamente retórica. Até por isso nem respondi mas, sobretudo, não respondi para ele não se sentir derrotado. De facto, quando, no fim de semana, tínhamos resolvido pôr os cortinados, pensávamos que as janelas, na volta, só lá mais para o fim do ano. Afinal, galo, pelos vistos é para já. Mas, paciência, já estão postos. Logo se vê. Um tamanhão e um peso daqueles não tinham outro lugar para estar senão pendurados.
Enquanto o senhor não chegou, aproveitei para ir lavar as bancadas debaixo do telheiro e dar um jeito naquilo. Era onde a rapaziada das pinturas almoçava e para onde carregavam todas as traquitanas e baldes de tinta e alguidares. Estava mesmo tudo a precisar de limpeza. Ao lavar a bancada de tijoleira pensei que deveria raspá-la e encerá-la. Mas não posso querer fazer tudo ao mesmo tempo senão fico estourada. O que vale é que, até ver, o coração se tem portado bem (pelo menos que eu dê por isso).
Vi que me partiram um espanta-espíritos que tinha pendurado nas traves do telheiro, um de vidro e conchas, muito bonito, que tinha trazido de Lagos. Fiquei mesmo com pena. Estes pintores saíram-me cá uns desarrumados, desorientados, desplaneados... Deram cabo de algumas coisas e não foram capazes de informar. Acidentes acontecem... (embora a eles tenham acontecido vários)... mas, bolas, assumem-se. Estes não: tenho vindo a dar por a asa de um jarro de louça partida, o espanta-espíritos partido, o canto de outra coisa esfacelado... já nem sei....
Já não viemos cedo, como é bom de ver. Não sei como não caí a dormir durante a viagem, tão cheia de sono estava.
A minha sorte é que tinha ovas de bacalhau cozidas no frigorífico. Para acompanhamento, ainda descasquei feijão verde, cenouras, batata normal e batata doce, juntei ervilhas congeladas e ovos, pus ao lume e, portanto, fiz uma salada russa. Mas, claro, não foi imediato pois há o tempo de preparação e cozedura.
Resumindo: cheguei aqui à sala perto das onze, senão depois. E aqui tenho estado a debater-me para não adormecer.
Esta terça-feira tenho que me levantar cedo pelo que não poderei atrasar-me muito aqui nas escrituras. De resto, pouco mais tenho a dizer.
Mas queria apenas acrescentar que, ao abrir a porta e entrar lá, pela primeira vez desde que as sacrossantas e intermináveis pinturas começaram (já não me lembro se em Abril, se em Maio), senti que estava a voltar a entrar em minha casa. As coisas já a começarem a estar no seu sítio, a lei e a ordem repostas, tudo limpo, tudo bonito -- um gostinho bom, bom, bom. E nem que fosse apenas por isso já a viagem teria valido a pena.
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