Na minha vida sempre houve tigres. Tão entrelaçada está a leitura com os outros hábitos dos meus dias que não sei verdadeiramente se o meu primeiro tigre foi o de uma gravura ou esse, já morto, cujo obstinado ir e vir pela jaula eu seguia, enfeitiçado, do outro lado das barras de ferro. Ao meu pai agradavam as enciclopédias; eu apreciava-as, tenho a certeza, pelas imagens de tigres que me ofereciam. Recordo agora os de Montaner e Simón (um branco tigre-da-sibéria e um tigre-de-bengala) e outro cuidadosamente desenhado, que saltava e no qual havia algo de rio. A esses tigres visuais acrescentaram-se os tigres feitos de palavras; a famosa fogueira de Blake ("tyger, tyger, burning bright") e a definição de Chesterton: "É um emblema de terrível elegância".
Nenhuma outra cidade, que eu saiba, confina com um secreto arquipélago de verdes ilhas que se afastam e perdem nas duvidosas águas de um rio tão lento que a literatura pôde chamar-lhe imóvel. Numa delas, que nunca vi, matou-se Leopoldo Lugones, que terá sentido, talvez pela primeira vez na vida, que estava livre, enfim, do misterioso dever de procurar metáforas, adjectivos e verbos para todas as coisas do mundo.
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Na companhia de Pedro Abrunhosa a interpretar Quem me leva os meus fantasmas, excertos de 'O meu último tigre' e 'As ilhas do Tigre' in Atlas de Jorge Luis Borges numa tradução de Fernando Pinto do Amaral
No final Tom O'Bedlam diz "The Tyger" de William Blake. Obtive as fotografias de tigres no The Guardian.
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