Volto ao tema do Parque Escolar depois de ler o comentário que a Leitora Cristina Honório Silva escreveu sobre o meu post anterior. Fui e sou defensora deste programa de reabilitação escolar e sempre me custou ver a reacção negativa por parte daqueles que, em minha opinião, deveriam ser os seus principais apoiantes.
Diz a Professora Cristina Honório Novo que alguns dos utilizados materiais são dispendiosos mas não funcionais, que noutros casos a obra ficou a meio, que se arrancaram as árvores, etc, etc. E, diz ela e eu percebo-a, que mais valia que se gastasse melhor o dinheiro.
Talvez as coisas não tenham corrido bem na sua escola ou talvez, porque a coisa não foi terminada como devia, o que era para ser bom, ficando pelo caminho, se tornou mau.
Escola Emídio Navarro em Almada |
Do que conheço e que, até, já foi comentado aqui por quem participou no processo, os projectos obrigavam ao cumprimento de regulamentos, regulamentos esses elaborados pelos alemães (sempre os alemães quando lhes cheira a venderem os seus produtos...) e que obrigavam, para serem aprovados, que se cumprissem um conjunto de requisitos, nomeadamente os que tinham que ver com climatização. Não conheço o assunto mas admito que aí alguém deveria ter batido o pé em vez de aceitar cumprir regulamentos que, pelo clima português, não seriam os mais adequados. Mas considero que isso são pormenores face ao conjunto dos propósitos.
No entanto, a questão principal não é essa. O propósito do programa Parque Escolar era, sem dúvida, reabilitar e reequipar edifícios que careciam de modernização, dignificar o ensino e os locais onde ele se pratica, tentar fixar uma população escolar, etc, etc. Mas era também outro, não menos importante: animar a economia local.
Escola de Benavente |
Quando se pretende estimular a economia um pouco por todo o país, uma das coisas em que se pensa logo é em criar actividades que estimulem um conjunto agregado de iniciativas e que sejam de utilidade local.
Uma das formas mais básicas e menos úteis é fazer rotundas. Podem fazer-se muitas, um pouco por todo o país e isso estimula a economia local. Mas é uma forma estúpida pois pouco mais consome do que mão de obra pouco qualificada e a actividade extingue-se mal a obra é inaugurada. Ou seja, não há reprodutibilidade da actividade económica.
Uma forma ideal seria arranjar indústrias um pouco por todo o país. Mas isso é difícil: o Estado não tem capacidade directa para fazer fábricas.
Escola da Pontinha |
Uma alternativa razoável é arranjar projectos que requeiram mão de obra especializada, mão de obra intermédia, e que, pela sua natureza estimulem uma série de actividades subsidiárias: arquitectos, engenheiros civis, electrotécnicos, construção civil (que, por sua vez, dinamizam a indústria cimenteira), fábricas de materiais de construção, mobiliário escolar, vidros, alumínios, etc. Posteriormente haverá manutenção de equipamentos, o que significará também empregos locais. Idealmente haverá também arranjos de jardinagem (quem sabe se no caso que conhece, se pensava substituir árvores que causavam alergias ou que estavam com algum problema por outras mais adequadas ou por arranjos paisagísticos, que, geralmente, estão agregados a este tipo de projecto?). Etc.
Enquanto duram todas essas obras, o comércio local animar-se-á, aparecerão novas necessidades, desenvolver-se-ão competências que podem ser reaproveitadas, etc. E quando acabasse o projecto numa escola, haveria outra escola. E quando as escolas estivessem reabilitadas, talvez se pensasse em fazer creches ou em arranjar centros de dia. O propósito é sempre duplo: servir melhor a população directamente abrangida e estimular a economia.
Isto porque é essencial que a economia funcione. Não havendo programas deste género, num país desindustrializado, pouca actividade económica há.
Escola Dona Inês de Castro em Alcobaça |
Como um Leitor comentou um dia destes aqui, um dos gabinetes de arquitectura mais prestigiado e premiado no âmbito do Parque Escolar, está agora a funcionar com o arquitecto e em riscos de fechar. Os arquitectos estão quase todos sem trabalho. As empresas de construção civil não têm parado de despedir e fechar. As pequenas fábricas e oficinas fecharam. Os pequenos restaurantes fecharam um pouco por toda a parte. E, quando isto acontece, é em cadeia. Daí o desemprego crescente.
Há hoje, apesar do brutal aumento individual de impostos, uma preocupante quebra de receitas fiscais. Por isso, porque a actividade económica está a colapsar, os ordenados dos funcionários públicos levaram cortes, e agora muitos serão despedidos. E não há dinheiro que chegue para as reformas. E isso acontece porque, aniquilando a actividade económica (que é o que este governo tem feito), acabam as receitas fiscais e, acabando as receitas fiscais, o Estado Social fica em risco.
Escola José Saramago |
Por isso, é errado olhar para o Parque Escolar como um dinheiro mal gasto. Não é. Não apenas o investimento foi subsidiado por fundos europeus, como era dinheiro que, entre outros objectivos ligados ao ensino, se destinava, sobretudo, a fazer mexer a economia.
Já aqui contei uma vez uma história.
Uma vez, um cliente de um hotel, ao pagar a sua conta, deixou uma nota de vinte euros no balcão. O empregado, ao ver a nota, pensou que era uma gorjeta. Mal o movimento no hotel abrandou, pegou na nota e foi a correr pagar ao sapateiro a quem tinha ficado a dever arranjos nos sapatos. O sapateiro, quando recebeu o dinheiro foi, num instante, pagar contas atrasadas num restaurante. O dono do restaurante, pegou no dinheiro e foi a correr pagar ao talho a quem tinha ficado a dever. O homem do talho pegou na nota e foi a uma loja de roupas pagar uma dívida. O homem da loja de roupas foi a correr pagar uma conta que tinha ficado pendurada no hotel. Passado um bocado apareceu o cliente à procura da nota, tinha-se esquecido dela sobre o balcão. E levou-a.
Contudo, num curto espaço de tempo a mesma nota correu por uma série de sítios e satisfez inúmeras necessidades. Assim é a economia. Claro que, por facilidade, aqui admiti que ninguém passava factura pelo que o estado não ganhou nada porque, se quiséssemos complicar o exemplo, ainda haveria IVA e, portanto, apenas porque se tinha injectado um pouco de liquidez no mercado, a economia pôs-se a funcionar e o Estado teria lucrado.
Escola de Valadares |
Estes programas, Parque Escolar, Pólis, Reabilitação de Casas de Idosos, etc, são todos do mesmo tipo: estimulam a economia de proximidade, isto é, melhoram a vida da população abrangida e fazem sobreviver a economia.
Ou seja: não é por haver coisas deste tipo que não se investe mais em formação dos docentes ou numa melhor organização escolar. O dinheiro usado nestes projectos não é dinheiro que saia do orçamento de funcionamento da escola. Pelo contrário: sem o trabalho gerado por estes projectos, a par do colapso geral da economia, é que não há dinheiro para nada (nem para pagar os ordenados na íntegra).
Claro que é indispensável que se pense o ensino de forma integrada, com respeito por quem nele está envolvido. Claro que um bom ensino é muito mais do que escolas arranjadas de novo. Isso é indiscutível. Mas é indispensável que a economia funcione e que seja posta a funcionar da forma mais útil possível. Em vez de rotundas inúteis, que se arranjem as escolas.
Depois há um outro aspecto: é bom que os alunos se habituem a conviver com a qualidade, com a modernidade, com a excelência, que tenham orgulho no local em que estudam, que gostem de dizer que estão numa escola intervencionada por um bom arquitecto, numa escola onde há materiais nobres, modernos, é bom que a comunidade local tenha orgulho na sua escola. Certamente será melhor para todos do que se forem pavilhões, edifícios degradados. Cativará todos muito mais se sentirem que a escola é um lugar de prestígio.
E, se as obras estão a meio, é bom que os professores, em vez de dizerem mal da obra, lutem pela sua conclusão, lutem pela sua melhoria. E que queiram sempre mais e melhor. Ao fazê-lo estarão a lutar pela qualidade do ensino e, indirectamente, a gerar novas receitas fiscais - e isso é indispensável para o o ensino em particular mas também para o País, em geral.
E, se as obras estão a meio, é bom que os professores, em vez de dizerem mal da obra, lutem pela sua conclusão, lutem pela sua melhoria. E que queiram sempre mais e melhor. Ao fazê-lo estarão a lutar pela qualidade do ensino e, indirectamente, a gerar novas receitas fiscais - e isso é indispensável para o o ensino em particular mas também para o País, em geral.
(Professora Cristina Honório Silva... só me resta pedir-lhe desculpa pelo tamanho do texto. Entusiasmo-me a escrever e depois dá nisto...)
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Em princípio, ainda cá volto.
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