Foi com um aperto no coração que soube que o Livreiro Velho se tinha ido embora. Ainda não há muito ele estava a assustar os amigos e logo depois, ao ver o susto, veio brincando explicar a brincadeira. Menino maroto, todo ele cultura e graça.
Ainda não há muito tempo, eu deixava uma palavra de afecto para que o tempo, enquanto não passava, se quedasse com afectos.
Podia falar do espaço de luz e partilha que é a Culsete em Setúbal, a casa matriz, o ninho, a criação maior do Livreiro Velho. Aqui no Um Jeito Manso entrava-se lá dizendo O livreiro e os seus livros. Mas não me sinto a pessoa mais habilitada para o fazer. Entrando lá podem ler-se os testemunhos dos que enternecidamente falam de Manuel Medeiros (também chamado Resendes Ventura, poeta).
Homem de escrita e de muitas leituras, que acarinhava escritores e as suas palavras, o Livreiro Velho deixa em mim uma marca muito forte.
Neste vasto espaço que é internet, tocam-se, por vezes, sem que se perceba como, almas a quem a estima parece unir desde logo.
Desde que ando aqui pela blogosfera tenho conhecido muita gente, geralmente gente interessante.
É certo que muitas vezes aparecem uns papagaios (ouvem aqui, escrevem por outras palavras acolá, e não se lhes vê uma voz própria, um pensamento inequívoco), outras vezes aparece gente zangada com a vida (que se consome no seu próprio azedume e que, com ele, incomoda os outros derramando crispação por este espaço que se quereria limpo), ou, tantas vezes, aparece gente que disfarça com uma linguagem encriptada a sua triste vacuidade. Mas depois há aqueles que vêm de mansinho, com bondade, estendo a sua mão na nossa direcção.
Assim veio o Livreiro Velho. Aqui no Um Jeito Manso a chave para entrar na sua casa era A generosidade dos gestos e das palavras. As suas palavras não eram palavras comuns. A simplicidade é uma coisa rara e eu, às citações, às figuras de estilo, prefiro mil vezes as palavras que são como sorrisos brandos, como gestos sensatos e muito verdadeiros.
Partiu e a notícia da sua partida deixa-me triste. Mas aqui no Um Jeito Manso continuarão abertas as janelas para as casas que as suas palavras manterão iluminadas.
Adeus.
1 comentário:
Estive lá.
Muitas vezes, a maior parte delas com uma missão. Ler poemas. Aconteceu com Matilde Rosa Araújo, com Manuel Alegre, com o insuspeito poeta Seromenho Marques e outros.Também a prosa de Baptista Bastos e de João de Melo(Quem não leu "Gente Feliz com Lágrimas" não sabe o que perdeu)
As paredes forradas de livros e gente. Ao som da guitarra de Albano, ali estava eu, desbravando o livro novo que nesse dia se lançava na Culsete.
Eram tardes especiais.
Hoje, de vez em quando, oiço a voz angelical da sua filha, uma mulher com ar de menina e um sorriso único que canta na minha missa de Domingo...
Pudera, cresceu entre livros e autores...
Enviar um comentário