terça-feira, outubro 12, 2021

A Beatriz Gosta foi aos Globos de Ouro.
Eu, por cá, bem obrigada, na minha vidinha.

 



Sou fã desta rapariga. Beatriz Gosta. Grande mulher, ela. Acho-a do melhor que por aí há a fazer humor. Já não acha graça ao Ricardo Araújo Pereira. Gostava dos Gato Fedorento. Depois tornaram-se autónomos, cada um para seu lado, começaram a querer facturar em cima de qualquer patacoada e perderam a graça.

Beatriz Gosta tem sentido de humor, é irreverente, descomplexada e é rápida no gatilho. Em directo, sem guião, ela atira-se para os cornos do touro. Sem saber o que vai sair do outro lado, ela arrisca. E sai-lhe sempre bem. 

Os Globos de Ouro já foram a semana passada e esta reportagem da Beatriz já passou no 5 para a Meia Noite. Tema requentado, reconheço. Mas eu praticamente não vejo televisão. Por isso, só dou pelas coisas quando me aparecem por outras vias. 

Lamento se ando assim, com um jet lag de todo o tamanho. O mundo roda e eu só dou por isso uns dias depois.

Agora, em tempo real, para além do trabalho, só as brincadeiras da minha coisa mais peluda e fofa e o voo das rolas. Aproximam-se cada vez mais, elas. Eu, sentada numa cadeira branca no relvado, o cachorro a brincar à minha volta e, por cima ou ao lado, pares de rolas brincando. O cachorro põe-se em pé, as duas patinhas peludas apoiadas em mim que estou sentada na espreguiçadeira, e mordisca, puxa, brinca, os olhinhos sempre a rir. Zango-me mas ele pensa que faz parte da brincadeira, se o afasto ele rebola, todo derretido, e volta ao mesmo. As rolas esvoaçam por ali. Não as perturbamos.

Hoje, ao fim da tarde, quando estávamos nisto, ouviu-se uma voz masculina vinda de um quintal vizinho. E, então, eis que a fera se levanta, se sacode para recuperar a compostura e se senta, virado na direcção do som, empertigado, tentando avaliar a gravidade da situação. Elogiei: menino bonito, assim é que é. Quando o meu marido chegou informei: temos cão de guarda.

Pego-o ao colo, quero aninhá-lo em mim, quero senti-lo já mais pesadinho. Mas ele, menino já a querer dar-se ares de crescido, já não quer colo, esgueira-se para ir para o chão. 

À noite deixamo-lo vir um pouco até aqui a esta sala. Faz a mesma coisa. Poe-se de pé, as patinhas apoiadas no sofá. Hoje parecia-me que vinha fazer-me um chamego, a cabeça peludinha encostada à minha perna. Qual quê? Queria era mordiscá-la. Zanguei-me. O meu marido diz que a zangar-me assim não faço nada dele, que tenho que engrossar a voz. Tentei e ele recuou. Mas a caminho de recuar, ferrou o sofá, danado de vontade de o devorar. Temo o pior. Se me distraio por um minuto fico sem sofá.

Tento arranjar sucedâneo para tudo o que ele quer roer mas a fera quando fisga uma, não vai em conversa. Deveria pô-lo a fazer coaching a um colega que é o oposto, totalmente destituído de personalidade. A esse totó podemos levá-lo a mudar de convicções dez vezes por minuto. Esta fera cabeluda que tenho aqui em casa não é nada disso: quer é repuxar-me a chinelinha que uso aqui em casa e por mais que o tente convencer com uma havaiana desirmanada de um menino ou um ténis velho que a minha filha lhe trouxe, ele faz de conta que sim mas logo volta à minha. Pelo meio mordisca-me os dedos dos pés e os tornozelos. Um desatino. Tenho que aprender a levitar, é o que é. O meu marido diz-me que faça como ele: use calças e ténis. Mas como? Gosto de andar à fresca, ora essa.

Pelo meio, tive reuniões e conversas complicadas: accionistas, protocolos, pactos, bancos, planos e cenários. Tudo envolto em sigilo. Não sei bem se o meu reservatório de conversas complicadas e de segredos é infinito. Por vezes penso que já o excedi, que mereço tréguas. Mas depois vem aquele karma do caraças, o peso da responsabilidade, o pensar que há tanta gente a depender das decisões de quem não tem o direito de se mostrar cansado ou farto. Portanto, bola para a frente.

Ao fim do dia, quando fui para o jardim com a fera, ainda pensei levar um livro. Mas começava a escurecer e, de resto, ele não dá tréguas. Pensei que deveria deixá-lo à solta e ir lá para cima, sentar-me no cadeirão à beira da janela, e pôr-me a ler. Mas como ficar descansada longe dele no jardim se ele tenta comer tudo, seja o que for, que encontra? 

A minha mãe repreende-me: Ó mulher, mas tu também não tens emenda, mal sais de uma, metes-te noutra. Que necessidade tinhas tu de arranjar já um cão?

Pois é, reconheço. Mas, ao mesmo tempo, é tão bom ter um amiguinho maluco.

Passamos a vida a referir-nos a ele como 'ela' e, volta e meia, tratamo-lo pelo nome da nossa boxer. Com tanta confusão de género, a minha filha já disse que o pobre ainda vai sofrer uma crise de identidade. E também já dissemos que o pobre cão ainda vai sair bicha, tanto o tratamos por menina.

Bom, adiante que se faz tarde.

A verdade é que sinto falta de ir para o campo. O campo em Outubro-rubro é daquelas maravilhas de que ninguém deve privar-se. Mas como a pequena excelência ainda não vacinada e com aquilo lá impossível de vedar completamente e onde bicheza de toda a espécie é o que não falta (cães, gatos, javalis, coelhos, cobras, etc), é um risco que, agora, não podemos correr. Espero que dentro de semanas, sim, possamos ir. Sinto mesmo falta.

Também sinto saudade de ir ao restaurante nepalês onde íamos tantas vezes. Que saudades. Só de pensar, salivo mentalmente. 

Pequenos prazeres. Cada vez mais sou sensível aos pequenos prazeres. 

Também íamos beber uns drinks e umas tostas muito boas numa esplanada na praia. Ao cair do dia, o sol deitando-se sobre as águas e nós ali. Em tempos também fumávamos. Lembro-me que gostava de ali estar, a olhar o mar, a beber uma bebida bem frequinha, a fumar.  Tenho saudades também disso embora sem a parte do tabaco. Essa parte agora parece-me pré-histórica, absurda, coisa de mau gosto, poluição exterior e interior. Mas do resto tenho saudades. Tenho que voltar. 

E não vejo a hora de levar a fera cabeluda, formatada para conduzir rebanhos nos montes, à beira do mar. Se for como a nossa cãzinha de boa memória, há-de correr de alegria. Prazer para ela e para nós, vendo-a feliz assim. Rebolava-se na rebentação, sacudia a água, feliz da vida, corria, corria, corria, depois vinha na nossa direcção, louca de contentamento. Não sei como vai ser com este cabeludo mas gostava que viesse a ser também um amante de praia, um companheiro.

E, pronto, calo-me já. 

Ah, sim, é verdade. Só mais uma coisa. O meu menino mais velho acha que o nome que demos à fera é um nome maricas, de menina. Preferia que fosse Tobias. O meu menino mais novo ao princípio queria que fosse Manny. Ontem disse que, afinal, queria que fosse Kukas. A minha filha, por seu lado, inglesou o nome. Portanto, a questão da identidade do jovem continua em todas as vertentes, até no nome. Mas eu mantenho-me na minha. Ele é o cão que eu inventei. E tenho dito.

E é isto que aqui vêem. O meu tema agora não passa disto: eu e o meu little baby dog. 

Vou pregar para outra freguesia para não vos maçar mais.


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Como é bom de ver, as flores são presente de Henri Matisse ao som de Will the circle be unbroken pelos Pentangle.

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E, com esta conversa toda, até me ia esquecendo do vídeo da Beatriz Gosta

Beatriz Gosta nos Globos de Ouro 2021 | 5 Para a Meia-Noite | RTP

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Desejo-vos um dia muito bom

Saúde. Alegria. Força aí.

1 comentário:

Lucília Costa disse...

Fantástica, a Beatriz.

Gostos dos seus artigos de uma forma geral.

Uma mulher culta, inteligente e atenta.