segunda-feira, setembro 07, 2020

Rui Pinto: um vulgar assaltante ou um arauto da liberdade?


(Daqui)
Já em tempos aqui falei e, se não me engano, mais do que uma vez, sobre Rui Pinto. E a minha opinião é a mesma desde que tive conhecimento das actividades do gaiato.
Faz-me muita impressão que pessoas que deveriam ser sensatas tentem passar a imagem de que Rui Pinto não se trata de um vulgar assaltante mas de um salvador da moral e dos bons costumes. Nunca votaria em Ana Gomes para Presidente da República. Teria eu que estar com uma grande bebedeira coisa que, até hoje, nunca aconteceu. Mas, se me tivesse dado alguma travadinha e admitisse a hipótese de querer vê-la em Belém, bastaria esta macacada de ela andar com o Rui Pinto nas palminhas para lhe sugerir que esqueça a Presidência e vá, antes, dar banho ao cão.
Rui Pinto é um hacker confesso. Acredito que, como tantas vezes acontece com os hackers, a principal motivação dele fosse a de ver se conseguia entrar onde não devia. Os hackers apuram técnicas, trocam informações com outros que, igualmente, se escondem no anonimato, fazem tentativas... até que entram. E, tendo arrombado as seguranças das redes (ou entrando como cão por vinha vindimada quando a segurança é quase nula), começam a copiar tudo o que encontram.

(Daqui)
Quando é gente dada ao gamanço mais profissionalizado, fazem gracinha maior: copiam tudo o que podem, encriptam tudo o que podem e pedem dinheiro para desencriptar. Parece que a indústria dos resgates é uma das que está a dar. Aparentemente não foi isto que Rui Pinto fez. Aparentemente limitou-se a varrer tudo o que apanhou e, tendo em sua posse documentos de sociedades desportivas, sociedades de advogados e etc, começou a ver o que podia fazer daquilo. Do que se sabe, assaltou inicialmente apenas numa de curiosidade, há quem diga que fez mais que isso, que roubou mesmo dinheiro, há até quem diga que também chantageou, pedindo dinheiro -- mas disso eu não sei, só sei do que é público e inequívoco --, e, quando se apercebeu que, no arrastão, tinha apanhado caça grossa, começou a perceber que estava a tornar-se poderoso. Divulgou, causou bru-a-á, tornou-se um alvo a apanhar. Mas um poder destes é uma fonte de grande risco, risco para os que foram devassados, risco para ele. Ao ser apanhado, começou a divulgar algumas das 'cenas' que tinha apanhado e a estratégia de defesa passou por desviar o foco da questão (de assalto e roubo de informação a coisa derivou para denunciante). Isabel dos Santos foi apenas mais uma que, aparentemente, caíu nas suas malhas.

Ou seja, como seria relativamente expectável, tendo andado a jardinar em sociedades desportivas, sociedades financeiras e sociedades de advogados, o fruto do seu roubo veio a revelar-se assaz diversificado e interessante, permitindo denunciar o que parece ser a prática de vários crimes.

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Mas isso em nada muda o que é relevante à luz do Estado de Direito em que vivemos, ou seja, o facto de Rui Pinto, ao violar redes e sistemas informáticos, ser um assaltante, um hacker

Não vivemos no Far West, não vivemos num regime de milícias populares ou do vale tudo e salve-se quem puder. 

Se Rui Pinto em vez de roubar informação de computadores, roubasse casas também poderia descobrir armas não autorizadas numa casa, doses de cocaína para venda noutra ou barras de ouro ou coisa do género num insuspeito colchão. Mas isso não faria deles menos ladrão de casas do que qualquer outro.

Que eu saiba vivemos num Estado de Direito e não pode ser qualquer um que ande por aí a piratear e a roubar a informação de pessoas e empresas. E tudo o que mais possa ser dito em relação a isto com o intuito de defender Rui Pinto é treta.

E uma coisa não percebo: Marcelo que comenta tudo e todos, que telefona a este e àquele, que dá palpites sobre o cão, o gato, o periquito e a festa disto, daquilo e do outro, não arranja maneira de falar sobre isto? É que há uma diferença grande, profunda entre, por um lado, a liberdade legítima e a democracia e, por outro, o populismo. Há linhas vermelhas que não podem ser ultrapassadas e não vale a pena colar na testa do ladrão o rótulo de whistleblower ou enroupar a coisa para a engalanar e disfarçar o que são e sempre serão actos ilegítimos. 


4 comentários:

Anónimo disse...

Vivemos de facto num estado de direito (isto não é para imitar o Valtinho, é só que este estado não merece maiúsculas)? Ora quando é o director do DCIAP e o director da Judiciária que elogiam o Rui Pinto, e gabam a sua colaboração nas investigações, está tudo dito. Ou seja, o MP não consegue investigar sozinho outros casos mediáticos, e vai daí faz um pacto com o diabo e promove um hacker a herói nacional, com a inestimável ajuda da sra dra. Ana Gomes, que desde que perdeu a cadeira no PE não sabe o que há de fazer para que reparem nela (pessoalmente não gosto de peixeiradas nem de santos de pau oco, pelo que "zapo" rapidamente quando tenho o azar de dar com a senhora a falar nalgum canal).
E o conceito de prova proibida que se lixe, que isso é coisa do passado e de mentes retrógadas.
Escancarou-se uma porta que, ou me engano muito, ou ainda vai dar alguns amargos de boca.
MPDAguiar

Anónimo disse...

Sou um leitor assíduo do ujm e O Jumento. É imperdìvel estas tribunas da democracia, assinadas por gente de Bem.

Anónimo disse...

Apoiado, UJM, perfeitamente de acordo! Os princípios fundamentais do Direito e da Democracia estão a ser criminosamente subvertidos. Onde chegaremos?
Um abraço

Filo

A.R. disse...

De acordo.